No Fórum TSF vários especialistas explicaram que as declarações de Passos Coelho sobre imigração e insegurança "não correspondem à verdade".
A associação entre imigração e insegurança tornou-se assunto nesta campanha eleitoral depois de uma intervenção do ex-primeiro-ministro Pedro Passos Coelho e André Costa Jorge, do Serviço Jesuíta aos Refugiados, alerta para o risco de o discurso político levar a uma perceção que não se baseia na realidade. No Fórum TSF, o especialista lembrou que as estatísticas mostram que os imigrantes não são uma ameaça para o país. Pelo contrário.
"Quando se liga insegurança ou criminalidade às migrações temos que fundamentar essas afirmações com base estatística e a verdade é que quando vamos à questão de fundo temos que dizer que não é verdade que os imigrantes sejam uma ameaça à segurança nacional. Não há qualquer base factual estatística nesse sentido e, portanto, essas afirmações podem ter uma dimensão política - e têm, com certeza -, mas não correspondem à verdade. O que os cidadãos têm que fazer é formar a sua opinião com base em informação verdadeira, com base em informação credível", esclareceu na TSF André Costa Jorge.
O responsável do Serviço Jesuíta aos Refugiados destaca a contribuição dos imigrantes para a Segurança Social.
"Os imigrantes não são, por exemplo, um peso para a Segurança Social em Portugal. Por cada um euro que recebem apoios está provado que os imigrantes pagam sete euros em contribuições. Também não é verdade, por exemplo, que os estejamos a ser invadidos pelos imigrantes. A população imigrante corresponde a 7,5% do total da população portuguesa. Estamos longe de qualquer tipo de invasão e, portanto, é importante que as pessoas percebam que os imigrantes não vêm roubar emprego aos portugueses. A maioria vem até colmatar necessidades e a escassez de mão-de-obra em setores chave", explicou.
Também no Fórum TSF, Felipe Pathé Duarte, professor da Universidade Nova e investigador em questões de segurança e criminalidade, vai mais longe e garante que não há, na Europa, qualquer relação entre imigração e insegurança.
"Factualmente não há nenhuma demonstração empírica em que há um nexo de causalidade entre o aumento da imigração e o aumento da insegurança na Europa. Não há, pura e simplesmente não há. Seja, por exemplo, no âmbito da criminalidade geral, porque é muito difícil estabelecer uma relação entre o aumento da emigração e o aumento da criminalidade, seja essencialmente numa área que me toca mais, que tem a ver com o extremismo violento e com o terrorismo. Não há um nexo causal entre o aumento da emigração e estes dois fenómenos: criminalidade em geral e o caso específico do extremismo violento", acrescentou Felipe Pathé Duarte.
Já o diretor executivo da Amnistia Internacional, Pedro Neto, afirmou, sem qualquer dúvida, que em Portugal a criminalidade não está relacionada com nacionalidade e considerou que Passos Coelho não foi claro nesse sentido, não ajudando o PSD.
"As declarações de Passos Coelho foram dúbias, foram breves, foram pouco explicadas e por isso também deram azo e estão a dar azo a muitas e diferentes interpretações. Como político experiente que ele é, ele devia ter também tido esta consciência e, como tal, parece-me que terá prestado um mau serviço à democracia e nomeadamente a social-democracia, de modo particular e ao seu partido. Quando nós damos nomes e rostos concretos à imigração que conhecemos, nós não temos medo e percebemos a importância da diversidade, do acolhimento, da força de trabalho que os emigrantes nos trazem e que nós portugueses também fomos e o somos lá fora. Aliás, Passos Coelho foi célebre enquanto primeiro-ministro quando apelou aos portugueses para emigrar dadas as dificuldades económicas que o nosso país passava na altura", recordou Pedro Neto.
O diretor executivo da Amnistia Internacional defende que a insegurança aumentou, mas não foi para os portugueses.
"Houve um aumento de insegurança nestes últimos anos, mas foi para os próprios imigrantes, os que são alvo de tráfico de seres humanos. Foi um fenómeno que cresceu nestes últimos anos e que se aproveita da vulnerabilidade das pessoas, também os que não conseguem regularizar a sua situação para se integrarem plenamente na sociedade em Portugal. Foram anos de muitas mudanças nas questões das imigrações, naquilo que foram as medidas do Estado. Por um lado, a extinção do SEF, a disseminação do seu trabalho para vários outros organismos que nós até temos dificuldades ainda de identificar e de procurar informação, quanto mais pessoas que vêm de fora e que não estão familiarizadas com o nosso país. Portanto, isto vai deixando estas pessoas, os imigrantes, também em situações de maior vulnerabilidade", afirmou o responsável da Amnistia Internacional.
Pedro Neto sublinha que o que existe é o aumento da perceção de insegurança e isso tem a ver com o discurso de ódio.
"A explicação vem daqui de uma análise à única variável que tem ido no sentido contrário, que é o aumento do discurso de ódio, que é o aumento do discurso contra bodes expiatórios que tendencialmente não têm voz forte e pública para se poderem vir defender e dar um sinal de contraditório. De facto, os discursos de extremismo que começaram a crescer na Europa e que se vão imitando nestes partidos políticos mais extremados vão fazendo diversos ensaios nesse discurso. O partido Chega, nomeadamente, já tentou imitar outros países de extrema europeus", disse.
À semelhança de Felipe Pathé Duarte, também Pedro Góis, professor na Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra e investigador do Centro de Estudos Sociais na Área das Migrações, acredita que o que existe é um problema de perceção de insegurança e adianta uma explicação para isso.
"O exemplo referido do Martim Moniz, algumas freguesias do sudoeste alentejano, alguns locais no Algarve onde há de facto uma guetização, pode ajudar a explicar nesses locais uma perceção de que eles são muitos, eles são demais. Olhando para o país no seu todo, não é assim. Os números da imigração em Portugal são ainda relativamente baixos quando comparados com outros países europeus e a grande maioria dos imigrantes que está em Portugal está a trabalhar, faz os descontos para a Segurança Social, paga os seus impostos e, portanto, está-se a integrar pouco a pouco na sociedade portuguesa", ressalvou Pedro Góis.
O professor sublinha ainda um facto: a imigração aumentou em Portugal, mas o país precisa destas pessoas.
"Nos últimos anos Portugal tem sido um dos países que mais imigrantes tem acolhido. De facto, quer em percentagem quer em número real no conjunto dos Estados europeus, se excetuarmos os grandes países como como a Alemanha ou ou a França, a questão aqui é que eles têm vindo para Portugal porque nós temos necessidades do mercado de trabalho que estão a ser preenchidas por essa mão-de-obra imigrante. Eles não vêm na aventura de procurar subsídios ou de explorar o Estado português, vêm porque há trabalho e esse trabalho é a grande carta de chamada para que tantos migrantes tenham vindo para o país", acrescentou o investigador do Centro de Estudos Sociais na Área das Migrações.