À TSF, o antigo secretário de Estado da Saúde lembra a única mulher a liderar um governo em Portugal como alguém que "abdicou" de tudo "para se entregar aos outros"
A 10 de julho de 2004 morria a única mulher a liderar um governo em Portugal. Maria de Lourdes Pintasilgo foi primeira-ministra entre 1 de gosto de 1979 e 3 de janeiro de 1980, nomeada pelo então Presidente da República, Ramalho Eanes, e 20 anos depois de morrer continua a ser lembrada como "uma personalidade de eleição".
"Era uma pessoa absolutamente excecional, uma pessoa com uma espiritualidade acima do comum, com uma generosidade e um sentido do social absolutamente fantástico. Uma pessoa que dedicou praticamente a sua vida, abdicou do casamento, abdicou de uma carreira científica - ela foi documentalista da então CUF -, portanto, era uma pessoa que tinha as maiores perspetivas, com a sua inteligência, sua capacidade, profissionais. Abdicou de tudo isso para se dedicar, para se entregar, aos outros. Um apostolado de valorização da mulher no contexto de uma igreja que ainda considerava a mulher como, digamos assim, a companheira do homem", lembra à TSF Correia de Campos, secretário de Estado da Saúde nesse governo.
Maria de Lourdes Pintasilgo assumiu a condução do país numa altura conturbada da então jovem democracia portuguesa. Depois de vários cargos governativos, a ex-primeira-ministra liderou um executivo independente de gestão, após a demissão de Carlos Mota Pinto, mostrando ser uma personalidade de consensos.
"Era um personagem multifacetado e, ao mesmo tempo, de uma enorme tolerância. Uma capacidade de aceitar o plural, de aceitar as opiniões dos outros e sempre com um entusiasmo transbordante. Eu nunca a vi pessimista. Era uma pessoa sempre sorridente. Parecia que excecionalmente dotada para conduzir pessoas, com um sorriso sempre", conta o ex-secretário de Estado.
Maria de Lourdes Pintasilgo nasceu em 1930, na cidade de Abrantes, e formou-se em engenharia químico-industrial, no Instituto Superior Técnico, sendo uma das poucas mulheres na ciência naquela época.
Talvez por isso se destacasse na forma como via o país: "Era uma visão progressista. Não era uma visão sectária. Era tudo menos sectária. Era uma visão de uma pessoa que pretendia o melhor para o país, mas o melhor para o para todos os cidadãos, sem discriminação. Muito consciente também da parte económica. Não era só preocupação social ou cultural que nela dominavam. Era a preocupação económica também. Ela era uma pessoa que vinha das empresas e que tinha uma noção muito concreta sobre o mundo empresarial e sobre a forma de contribuir para o progresso e o desenvolvimento económico do país."