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COP29. “UE não pode carregar sozinha o fardo do clima”

A eurodeputada Lídia Pereira Gonçalo Villaverde/Global Imagens (arquivo)

O Parlamento Europeu vai defender o reforço “do financiamento climático e o investimento em novas tecnologias limpas” na COP29

A eurodeputada Lídia Pereira (PSD) apela ao envolvimento de mais países no “financiamento climático”, dando a China como exemplo de um país que deve contribuir mais. A eurodeputada portuguesa, que vai liderar a delegação do Parlamento Europeu na Cimeira do Clima, em Baku, no Azerbaijão, considera que a União Europeia continua a ser “pioneira”, mas não pode continuar “sozinha”.

“A União Europeia não pode sozinha carregar, diria, o fardo do combate às alterações climáticas, e aquilo que a União Europeia tem vindo a dizer é que precisamos de mais países empenhados no financiamento climático, e em particular a China”, defendeu a deputada, sublinhando que “essa é uma das grandes reivindicações” que a delegação do Parlamento Europeu fará em Baku.

“Gostávamos que houvesse passos significativos, porque a própria China considera que há necessidade de mais financiamento, de mais dinheiro para fazer os investimentos necessários na área das alterações climáticas, mas não está para avançar com essa responsabilidade”, afirmou.

Por outro lado, Lídia Pereira afirma que também irá defender “o investimento em novas tecnologias limpas, que achamos que pode ser também uma grande forma de ajudar muitas regiões do mundo a desenvolver-se também economicamente”.

Questionada sobre se a União Europeia, como pioneira nos compromissos climáticos, ainda tem capacidade para influenciar os outros parceiros mundiais em torno dos objetivos ambientais, a eurodeputada considera que há casos práticos que o confirmam.

“O grande instrumento que a União Europeia tem para o resto do mundo é mostrar que é possível descarbonizar e crescer, e é isso que tem acontecido”, afirmou, detalhando que “se olharmos para as normas nos últimos 20 anos, a União Europeia cresceu 27%, criou 26 milhões de postos de trabalho e, ao mesmo tempo, foi possível reduzir as emissões de CO₂ entre 25% e 30%”.

“Além disso, os últimos cinco anos têm sido particularmente frutíferos no que diz respeito ao caminho que a União Europeia pretende continuar a fazer, na mitigação das alterações climáticas, mas também na adaptação”, destacou Lídia Pereira, enfatizando “a questão da adaptação, porque é um assunto sensível”.

“Recentemente, vimos a tragédia de Valência; a severidade das catástrofes naturais é cada vez maior e também são mais frequentes, ou seja, as comunidades têm que estar preparadas para lidar com os efeitos das alterações climáticas que já são irreversíveis”, salientou, defendendo que é necessário “adaptar e capacitar as comunidades para estes fenómenos extremos, que infelizmente têm ceifado muitas vidas e deixado rasto de destruição”. Nesse sentido, a eurodeputada considera que a União Europeia deve manter-se como “pioneira” nas políticas ambientais. 

Bruxelas, Washington, Trump e Elon Musk

Quanto à influência da futura administração norte-americana nas políticas ambientais, a deputada considera que é preciso “esperar para ver”. No entanto, adverte que, em torno de Donald Trump, há quem defenda as tecnologias limpas, dando o exemplo de Elon Musk. Também por essa razão, considera que Washington não será uma referência negativa para a União Europeia, até porque seria “um erro” caso Bruxelas baixasse os objetivos que já definiu, de reduzir as emissões em 55% até ao final da década, com vista à neutralidade carbónica em 2050.

“Seria um erro para a União Europeia, que ao longo de anos tem sido a líder nas matérias ambientais e tem sido pioneira no desenvolvimento de tecnologia para dar resposta a esta necessidade que nós temos do ponto de vista ambiental e do combate às alterações climáticas”, frisou, em entrevista à TSF, para o programa Fontes Europeias.

“De resto, parece-me prematuro estarmos a fazer considerações sobre aquilo que vai ser a administração de Trump. Estamos num contexto totalmente diferente. 2016 não é 2024, muitas coisas se passaram: há uma equipa à volta de Donald Trump, também diferente daquela que conhecíamos em 2016”, afirmou, destacando que “curiosamente, no círculo próximo de Donald Trump, há uma pessoa que não é negacionista nas questões de alterações climáticas. Essa pessoa é Elon Musk e tem sido um dos grandes empreendedores no desenvolvimento de veículos elétricos”.

“Portanto, eu creio que o desafio para a União Europeia é não deixarmos cair nas mãos de outros países a tecnologia que foi possível desenvolvermos aqui. Eu acredito que possa haver essa realidade de os Estados Unidos tornarem-se aqui uma força indiscutível em escalar as tecnologias limpas e tecnologia em geral que vai ao encontro da necessidade que temos em reduzir as emissões de CO₂.”

Hidrocarbonetos e direitos humanos

A eurodeputada admite o desconforto pela participação numa Cimeira do Clima que decorre em Baku, capital de um país cuja economia é fortemente dependente dos hidrocarbonetos. Além disso, o Azerbaijão é amplamente criticado pelas violações dos direitos humanos. Mas Lídia Pereira considera que o combate às alterações climáticas justifica a presença da delegação do Parlamento Europeu.

“Nós não podemos escolher os países com quem queremos fazer o combate às alterações climáticas, porque isso seria de grande cinismo. Se tenho preocupações por fazermos conferências desta natureza em países sobre os quais paira uma grande dúvida acerca do respeito dos direitos humanos, de facto, não me sinto muito confortável, mas do ponto de vista do ambiente, eu creio que não podemos fazer essa seleção”, afirmou, lembrando que “no ano passado tivemos uma COP no Dubai, que também sabemos que os Emirados são produtores de combustíveis fósseis”.

“Apesar disso, foi possível haver compromisso para que haja phase out dos combustíveis fósseis sob a liderança da União Europeia. Temos que estar empenhados neste desígnio com o mesmo esforço e com a mesma abertura”, afirmou, considerando que “se eventualmente a conferência fosse na China, provavelmente íamos ter a mesma pergunta ou íamos ter a mesma discussão”.

“Nós não podemos escolher os parceiros com quem queremos lidar com ameaças que são globais e que põem em risco a vida de todos nós, independentemente da latitude”, referiu.

As declarações de Lídia Pereira fazem parte de uma entrevista à TSF, que pode ouvir na íntegra depois das 09h40, no programa Fontes Europeias.

João Francisco Guerreiro