Economia

Governador do Banco de Portugal foi o principal alvo de Ricardo Salgado

Diana Quintela / Global Imagens

Numa longa audição na comissão parlamentar de inquérito ao caso BES/GES, Ricardo Salgado elegeu como principal alvo das críticas o governador do Banco de Portugal e acusou a instituição de ser a culpada pela queda do banco.

O antigo presidente executivo do Banco Espírito Santo (BES) Ricardo Salgado negou hoje que tivesse havido um «braço-de-ferro» com o governador do Banco de Portugal (BdP) sobre a sua saída do banco.

«Bastaria [o governador Carlos Costa] fazer um sinal para que me tivesse retirado», assinalou Ricardo Salgado perante os deputados da comissão de inquérito à gestão do BES e do GES.

«Ouvi surpreendido as declarações do senhor governador do BdP [na comissão de inquérito] dizendo que tinha tido um braço-de-ferro comigo. Nunca o senhor governador me disse que me retirava a idoneidade», acrescentou ainda o antigo banqueiro.

O governador, disse Salgado, nunca lhe disse «taxativamente» que devia sair da administração do BES, o que disse é que «a família deveria sair da administração do BES, a família toda».

Classificar garantia soberana de Angola como produto tóxico é «enorme ofensa diplomática»

Na audiência, Ricardo Salgado considerou ainda uma «ofensa diplomática» a decisão do Banco de Portugal de, no momento da sua intervenção na instituição, ter colocado a garantia estatal angolana ao crédito ao BES Angola no banco mau.

«Há três bancos em Portugal que têm participações de bancos angolanos (BPI, BCP e BIC) e colocar a garantia do senhor presidente da República de Angola no banco mau, como produto tóxico, é no mínimo uma enorme ofensa diplomática», afirmou o responsável durante a sua audição na comissão de inquérito parlamentar ao caso BES.

Segundo Salgado, a sua gestão procurava «informar o Banco de Portugal [BdP] sempre na medida do possível. Mas foi a primeira instituição que recebeu a garantia» assinada pelo Presidente da República de Angola, José Eduardo dos Santos.

«Fui pessoalmente entregar a garantia. O governador do BdP chegou ao ponto de não aceitar a garantia para efeitos de capital. Acho lamentável que isso tenha acontecido», acrescentou.

Salgado diz que a culpa pela queda do BES é do Banco de Portugal

O antigo presidente do Banco Espírito Santo considerou no parlamento que o colapso do banco se deveu às exigências excessivas do Banco de Portugal (BdP) em termos de constituição de provisões, num curto espaço de tempo.

«Salvo erro no dia 23 de julho [de 2014], o BdP enviou uma carta ao Dr. Joaquim Goes dizendo que quer que o banco constitua uma provisão no mínimo de dois mil milhões de euros. Foi um exagero. Foi imposta e isso está registado em ata», afirmou Salgado.

O antigo banqueiro tinha sido questionado acerca das razões que estavam na base das elevadas imparidades do BES, tendo realçado que, durante o seu mandato, sempre foram constituídas as imparidades à medida que iam surgindo.

Salientando que saiu da liderança do BES no dia 13 de julho, e realçando a oposição do Crédit Agricole, um dos acionistas de referência do banco, às exigências do BdP, Salgado disse aguarda as conclusões da auditoria forense.

«Nunca violámos esse aspeto. Sempre que era preciso reforçar os capitais fizemo-lo», sublinhou, apontando para os dez aumentos de capital para assegurar o rácio 'core tier 1' feitos durante a sua gestão.

«Não consideramos ter violado as disposições do BdP. Tivemos sempre, pelo menos, até à minha permanência no banco, os rácios adequados», afirmou o responsável

E realçou: «Fizemos um aumento de capital de mil milhões de euros, quando o BdP em março tinha pedido 700 milhões de euros e a venda da BES Vida».

A operação foi «amplamente acima do que o BdP exigia» e, nessa altura, a gestão colocou «o nível de capitalização do banco dentro dos patamares exigidos por Basileia III», frisou, considerando que «o banco ia resistir aos testes de 'stress'».

Daí, Salgado concluiu que «o grupo entrou em colapso por não haver tempo».

Envolvimento nos submarinos foi «erro de julgamento»

Ricardo Salgado reconheceu hoje que o envolvimento da ESCOM, pertencente ao Grupo Espírito Santo, na compra de submarinos foi um «erro de julgamento».

«Evidentemente, hoje, visto à luz do que aconteceu, foi um erro de julgamento o GES ter entrado nessa operação para a qual eu também contribuí com a decisão de participação nessa operação», declarou.

O antigo banqueiro falava na comissão parlamentar de inquérito à gestão do BES e do GES, e foi questionado sobre o envolvimento da ESCOM nos submarinos pela deputada do Bloco de Esquerda (BE) Mariana Mortágua.

«Foi uma operação pontual e única. Imediatamente a seguir decidimos não fazer mais nenhuma operação dessa natureza», concretizou o antigo presidente do BES.

Salgado sublinhou ainda que teve a garantia da administração da ESCOM, onde não estavam membros do GES, de que «não foram pagas comissões a quem quer que seja ao nível político».