Justiça

Sindicato diz que envolvidos na Operação Marquês sentem-se «desconfortáveis»

Lusa/André Kosters

O Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos Sindicato diz que, no limite, a investigação pode ser contestada porque os inspetores das finanças não têm o chamado vínculo de nomeação ao Estado. Detenção de Sócrates foi a primeira feita pela Autoridade Tributária sem a presença da PJ.

O Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos diz que os inspetores das finanças envolvidos no caso Sócrates, também conhecido como Operação Marquês, estão desconfortáveis pelo papel fundamental e decisivo que tiveram em toda a investigação.

Em causa está a falta do chamado vínculo de nomeação ao Estado, uma reivindicação antiga que segundo o sindicato fragiliza a acção de quem trabalha nas finanças e não lhes dá as mesmas garantias de quem trabalha nas polícias, apesar de, neste caso, terem actuado como um órgão de polícia criminal.

O presidente do sindicato diz que este caso foi inédito. Para além de terem feito as escutas, como já tinha acontecido noutros processos, pela primeira vez, os inspectores da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) detiveram alguém (José Sócrates) sem a presença da Polícia Judiciária.

Paula Ralha explica que isso é algo que nunca tinha acontecido: em vez da PJ a quem cabe, por norma, investigar os casos de corrupção, estavam presentes a PSP e os inspectores da AT.

Segundo o sindicato, estes últimos tiveram um papel fundamental em toda a investigação, devido aos «conhecimentos técnicos que permitiram fazer a peritagem dos dados e provas que se foram acumulando», enviando essas análises, depois, para o Ministério Público.

O problema, continua o sindicalista, é que quem trabalha nas finanças não tem o chamado vínculo de nomeação ao Estado, típico das policias. Paulo Ralha explica que os trabalhadores da AT são, na prática, individualmente responsáveis pelos actos que praticam, ao contrário de quem trabalha na PJ, PSP, ASAE ou SEF que actuam como se fossem «o próprio Estado».

Uma questão jurídica mas com consequências no dia-a-dia de quem trabalha nas finanças, pelo que a falta deste vínculo ao Estado tem deixado «desconfortáveis» os inspectores da AT que investigaram o antigo primeiro-ministro. Paulo Ralha defende que são pessoas «com grande coragem» e sublinha que estamos a falar de investigações feitas com «grande falta de meios», pelo que era «fundamental dar este vínculo de nomeação para defender a acção quotidiana dos trabalhadores da AT».

Na Operação Marquês, os inspetores das finanças agiram com o mandato do Ministério Público, algo que por norma contorna a falta do vínculo ao Estado típico das policias. Mesmo assim, o sindicato admite que este pode ser um argumento a ser levantado, como já aconteceu noutros casos, para a defesa tentar anular aquilo que foi investigado pelos inspectores das finanças.

Escutado pela TSF, o advogado Paulo Saragoça da Matta, especialista em Direito Penal, diz que não é por não terem vínculo que estes inspetores perdem a legitimidade para atuar.

«É órgão de polícia criminal qualquer força policial credenciada para o efeito. A lógica era que houvesse funcionários com vínculo de nomeação definitiva, mas isso é uma questão laboral. Uma coisa é saber o que são atos de processo penal, e se são validamente praticados ou não. Outra coisa é haver um vínculo de nomeação definitiva ou um vínculo precário de órgãos de polícia criminal. Mas uma coisa não tem nada que ver com a outra. Não vejo qualquer possibilidade de haver invalidação de qualquer ato com base nisso».