Sociedade

Uma orquestra contra o extremismo

© Ahmad Masood / Reuters

Em Kabul, uma orquestra feminina vai desbravando o caminho contra o extremismo e a discriminação. Mesmo que isso signifique ir contra um dos fundamentos de ser afegão: a família.

Tocar um instrumento musical, qualquer instrumento musical, era atividade proibida durante o reinado dos talibãs no Afeganistão. Uma herança que ainda hoje faz sentir a sua força no país, com muitos muçulmanos a desconfiarem da maioria das diferentes formas de música.

Negin Ikhpolwak, uma jovem afegã de 19 anos, começou a aprender a tocar piano em segredo e só passado algum tempo revelou a verdade ao pai. Ele encorajou-a. Mas a reação da família, conservadora de etnia pashtun, foi de grande hostilidade.

Muitos questionaram o facto de uma rapariga pashtun tocar um instrumento musical, mais ainda quando nem os homens da tribo têm autorização para tal.

Atualmente a viver num orfanato, em Kabul, Negin dirige a orquestra Zohra, um grupo de 35 mulheres ligadas ao Instituto Nacional para a Música afegão que toca instrumentos ocidentais e afegãos. Numa visita recente a casa dos pais, os irmãos e tios ameaçaram bater-lhe por ter atuado na televisão. Teve de regressar no dia seguinte.

"A formação desta orquestra é um feito por si só", lembra Ahmad Naser Sarmast, um músico afegão que regressou ao país após a queda do regime talibã, para ajudar a fundar o instituto em 2010.

Entrevistado pela agência Reuters, ele ressalva a coragem destas raparigas num país conhecido pela dureza das restrições que aplica às mulheres. Apesar de muitas terem o apoio dos seus pais, acabam por ter de enfrentar a desconfiança e pressão da família e das autoridades religiosas.

Depois, há também a contestação vinda de fora e que pode tomar proporções violentas. Como foi o caso de um bombista suicida que, em 2014, se fez explodir durante um concerto da orquestra numa escola dirigida por franceses em Cabul.

Mas estas situações não desencorajam nem Sarmast, nem a jovem Negin, nem as raparigas da orquestra. A formação desta orquestra de mulheres foi a melhor resposta contra o extremismo, diz Sarmast.

Já Negin, que conta com o apoio da escola para continuar a estudar e a tocar, diz estar determinada em continuar no caminho que escolheu e que lhe deu um novo sentido para a vida, mesmo que isso implique deixar a família, elemento crucial para os afegãos na forma como se posicionam no mundo.