Carlos Costa quer evitar que os bancos tenham de passar por um profundo processo de reestruturação, embora considere que o processo de saneamento da banca ainda vai a "meio do caminho".
O Governador do Banco de Portugal quer que seja aberta uma exceção face às regras europeias para que possa ser criado em Portugal um mecanismo que permita 'limpar' o crédito malparado sem que os bancos tenham de passar por um profundo processo de reestruturação.
"É necessário não só encontrar um mecanismo que permita a titularização destes ativos [crédito malparado e imóveis] (...) e que haja um 'waver', uma isenção europeia, que permita intervir neste campo sem encostar os bancos a um mecanismo perigosos que é a diretiva de resolução", disse esta terça-feira Carlos Costa na conferência 'O presente e futuro do setor bancário', em Lisboa, organizada em conjunto pela Associação Portuguesa de Bancos (APB) e pela TVI24.
A intervenção do governador foi feita perante vários responsáveis europeus do setor bancário, nomeadamente Elke Koning, presidente do Conselho Único de Resolução, o mecanismo europeu criado para executar os resgates a bancos que estejam em situação grave.
De acordo com o Governador do Banco de Portugal, além dos problemas específicos que cada banco tem de resolver, há um "problema sistémico" na banca portuguesa: os "ativos que não geram rendimento, sejam créditos vencidos ou ativos imobiliários", que os bancos receberam por clientes não terem cumprido o pagamento dos empréstimos concedidos.
"É fundamental que os bancos consigam libertar-se destes ativos", considerou Carlos Costa, afirmando que tal implica a criação de um mecanismo idêntico ao que foi criado noutros países, como Itália, "baseado num jogo de garantias e contragarantias que minimize o impacto para os bancos" da participação nesse mecanismo.
O responsável pelo regulador e supervisor bancário lamentou que Portugal não tivesse tido a capacidade de criar um 'banco mau' em 2011 para acomodar os ativos problemáticos da banca, a exemplo do que aconteceu na Irlanda e em Espanha, referindo que então esse veículo teria tido um forte impacto na dívida pública que não era então possível acomodar.
No entanto, depois de seis anos em que os bancos fizeram uma "resolução dos problemas de forma gradual", o governador considera que é necessário agora um mecanismo transversal a todo o sistema para o qual os bancos possam transferir os ativos problemáticos, permitindo a libertação de capital, o aumento do financiamento da economia e, por fim, o regresso dos bancos à rentabilidade.
Para isso, Carlos Costa defende que "haja um 'waver', uma isenção, da União Europeia que permita intervir neste campo sem encostar os bancos a um mecanismo perigosos que é a diretiva de resolução".
Ou seja, o governador quer evitar que os bancos, por recorrerem a esse mecanismo, sejam obrigados a um processo de reestruturação, pedindo assim uma "isenção das regras", atualmente, em vigor a nível europeu.
"Se não, não se consegue executar este processo de saneamento dos bancos", afirmou.
O governador do Banco de Portugal disse ainda que a participação dos bancos naquilo que se chama vulgarmente de 'banco mau' terá de ser voluntária, isto é, os bancos só participam se assim decidirem.
Carlos Costa diz que saneamento da banca ainda vai a "meio do caminho"
O governador do Banco de Portugal considera que o processo de reestruturação da banca ainda "está a meio do caminho", mas realçou o "grande esforço" feito nos últimos anos pelas instituições financeiras portuguesas. "O presente é muito diferente do que tínhamos em 2010, embora ainda não estejamos no fim do caminho. Estamos a meio do caminho".
Carlos Costa vincou que o processo de saneamento da banca em Portugal foi feito de uma forma "gradual", lamentando que o país não tivesse tido a capacidade de criar um 'banco mau' para acomodar os ativos problemáticos da banca há seis anos, a exemplo do que aconteceu na Irlanda e em Espanha.
"Tivéssemos nós margem de acomodação em termos de dívida pública para fazer uma transferência de ativos para um veículo", sublinhou, apontando para os exemplos irlandês e espanhol, em que a criação de esse 'banco mau' permitiu resolver de uma assentada a maior parte dos problemas das instituições, mas com forte impacto na dívida pública.
"Na Irlanda e em Espanha houve um significativo aumento da dívida pública. No nosso caso, não havia capacidade para fazê-lo", assinalou.
"Como era incompatível com a trajetória da dívida pública portuguesa, a via seguida foi a resolução de problemas de forma gradual", frisou o governador.
E destacou: "Os bancos portugueses tiveram um caminho das pedras e o Banco de Portugal também".
De qualquer forma, segundo o líder do Banco de Portugal, graças ao "grande esforço" feito nos últimos seis anos, "o sistema bancário está mais bem capitalizado".
Carlos Costa apontou para a redução dos custos, para o reforço do provisionamento e para a evolução positiva do rácio de créditos sobre depósitos para ilustrar a melhoria da solidez dos bancos portugueses.
"Mas há muito trabalho pela frente", salientou, dizendo que o principal desafio para o setor é recuperar a rentabilidade.
"A rentabilidade que tem que gerar capital e atrair capital para resolver problemas pendentes", sublinhou, considerando necessário proceder à "alienação de ativos que penalizam a rentabilidade dos bancos" e ter "capacidade de resposta aos desafios do novo quadro europeu".