A "Guerra na Síria será o primeiro teste a Guterres como secretário-geral da ONU", pensa o embaixador de Angola junto da ONU. Angola ocupa um dos dez lugares não permanentes do Conselho de Segurança.
Para o embaixador de Angola junto das Nações Unidas, Ismael Martins, "é preciso que aproveite bem esta onda de unidade dos membros do Conselho de Segurança para trazer soluções a este problema. Precisa trazer à mesa de negociações todos os atores e estabelecer como única condição trazer a paz para aquela religião".
Angola termina no final do ano um mandato de dois anos no Conselho de Segurança e durante esse período, o angolano viu entre os seus colegas o desejo de ter um secretário-geral mais ativo.
"Queremos um secretário-geral forte. Forte no sentido de trazer vontade para ter os problemas resolvidos, forte no sentido de ter relações com todos os Estados e procurar soluções, soluções para os pobres, para os ricos, para os grandes e para os pequenos, que não são necessariamente as mesmas", acrescentou.
O embaixador de Angola junto da ONU foi o único falante de português nas seis rondas de votações e nas dezenas de encontros que envolveram a escolha do próximo secretário-geral da ONU.
O diplomata disse que "é raro surgir unanimidade do Conselho de Segurança" e que a escolha por aclamação de António Guterres para próximo secretário-geral "é um mandato forte para agir como um líder à altura dos desafios que terá pela frente."
"O engenheiro Guterres está perfeitamente posicionado e isso será visto, uma vez mais, na Assembleia Geral, onde estão todos os Estados. Esta confiança é um fator decisivo para que tenha um mandato orientado para resultados e que reforce a relevância das Nações Unidas", explicou Ismael Martins.
O representante africano diz que, durante os últimos meses, os seus 14 colegas do Conselho de Segurança o procuraram para conhecer melhor o candidato português.
"Sabiam que António Guterres foi primeiro-ministro de Portugal numa fase decisiva das nossas relações, que houve bastante contato entre Guterres, Angola e os angolanos. As pessoas confundiam-no como sendo também o candidato de Angola. E ele era, de facto, também o nosso candidato", disse.
Ismael Martins lembrou que "um dos primeiros países que Guterres visitou assim que anunciou a sua candidatura foi Angola" e que lá "recebeu o apoio do Presidente José Eduardo dos Santos, pessoalmente e ao mais alto nível."
"Era um candidato que tínhamos de apoiar. Tínhamos de ajudar a esclarecer junto dos nossos colegas o que se devia pensar sobre este homem", salientou.
Sobre as negociações que se passaram nos últimos meses, Ismael Martins garante que "não houve qualquer negociação" sobre altos cargos nas conversas com representantes angolanos.
"Mas nas outras conversas, de certeza, que foi passada a mensagem de recrutamento de mais mulheres e de uma maior representatividade. É preciso dar à ONU uma face de maior representatividade, uma face do mundo. Gostava de ver angolanos, africanos, asiáticos, pessoas com valor, que melhorem a prestação da organização", defendeu o diplomata.
Além dos encontros à porta fechada, o processo deste ano foi aberto à sociedade civil, tendo sido realizados debates, apresentações públicas e entrevistas com todos os candidatos.
"Este processo, bastante aberto, transparente, ajudou bastante. Guterres pode, diretamente, comunicar aos membros a sua visão. Essa visão foi apreciada e vista como adequada ao alto dirigente que a ONU precisa neste momento", adianta.
Ismael Martins diz, no entanto, que também muito contou o currículo do português.
"O engenheiro Guterres não convenceu apenas pela palavra, convenceu pelos exemplos, pelo que havia feito em Portugal e na ONU, sobretudo o empenho que teve na resolução do grande problema dos refugiados", acrescentou.
O embaixador lembra que, apesar de Angola ter declarado o seu apoio logo no início da corrida, muitos dos seus colegas africanos preferiam que fosse cumprido a rotatividade, que apontava para a escolha de alguém da Europa de Leste.
Essa continuava a ser a situação em setembro, quando Ismael Martins, que na altura presidia ao Grupo Africano de Embaixadores na ONU, organizou uma sessão particular com um grupo de representantes de vários Estados africanos e o candidato.
"Foi feito para que ele pudesse comunicar aos países africanos a sua visão para o continente. Nesse dia pude ver, em vários colegas, uma abertura e uma aspiração comum por termos uma pessoa como António Guterres a dirigir a ONU", recordou.
O diplomata diz que ao longo da campanha o ex-primeiro-ministro de Portugal "tornou-se, também, a escolha dos africanos."
Ismael Martins diz que os candidatos da Europa de Leste foram prejudicados pela falta de organização e unidade do seu grupo, o que lhes custou alguns apoios que teriam à partida.
"Não é um grupo que esteja estruturado, que seja coeso, e isso, naturalmente, teve o seu peso no relativo insucesso que o grupo teve em eleger um dos seus membros", explicou.
Ismael Martins acredita que paz e segurança "é o tema que vai marcar o mandato, porque está na origem de todos os outros problemas" bem como o cumprimento dos objetivos da Agenda de Desenvolvimento Sustentável Pós-2015.
"Sem desenvolvimento também não há paz nem segurança. É preciso atacar os problemas ligados ao desenvolvimento dos países e, sobretudo, responder às aspirações elevadas da juventude de todo o mundo", concluiu o embaixador.