Economia

Mexia diz que OPA sobre a Renováveis "dá prémio aos acionistas"

Miguel A. Lopes / Lusa

Presidente da EDP quer reforçar ainda mais a aposta nas energias renováveis. Em entrevista à Vida do Dinheiro, Mexia garante que OPA sobre a EDP Renováveis faz sentido para todos.

Excerto da entrevista ao presidente da EDP no programa A Vida do Dinheiro:

Sabemos que, por obrigações legais, não poderá falar da OPA que a EDP anunciou na semana passada sobre a EDP Renováveis, mas a OPA faz parte de uma estratégia global e disse que é muito importante para o futuro da empresa e para antecipar as metas de 2020. Que metas são essas?

Não posso falar muito sobre a OPA, devido às regras do jogo, mas acho que esta oferta faz sentido para os acionistas da EDP e para os acionistas da EDP Renováveis. A EDP Renováveis tinha um claro problema de liquidez, tinha um problema de mercado e tinha um problema de estrutura de capital, que era subótima.

Vivemos num mundo em que cada vez mais a geração não é uma coisa separada, tem de ser integrada com o resto da cadeia de valor, e isso, obviamente, criando sinergias, em particular no que diz respeito ao cliente final, e por isso faz sentido para toda a gente. Tem-se falado muito de condições de há dez anos, mas eu comparo é com o passado recente e estamos a dar um prémio, o que permite que a EDP, que tem nas renováveis a sua principal aposta, tenha ainda um foco adicional numa área que é aquela onde pomos o grosso do nosso investimento e onde iremos continuar a pôr nos próximos dez anos.

A qualidade das redes de distribuição em Portugal - para ter uma ideia, na última década, o tempo de interrupção desceu mais de 90%- só se faz com investimento racional, equilibrado e, claramente, bem feito.

As renováveis são a estratégia da EDP, e nós fizemos isso antes de a maior parte das companhias assumirem que isso era a sua estratégia. As companhias que conseguiram consolidar-se, crescer e estar na linha da frente seguiram exatamente a mesma estratégia que escolhemos há dez anos. Outras estão a tentar agora, provavelmente tarde de mais.

Um dos riscos apontados à EDP tem que ver com o nível de dívida. A empresa tem vindo a reduzi-la e anunciou que a venda da espanhola Naturgas vai, em parte, servir para amortizá-la. Que percentagem dos 2500 milhões de euros vai servir para isso? É uma preocupação para si?

Quando em 2012 o mercado estava fechado para toda a gente em Portugal, a EDP conseguiu - por força da sua estratégia de estar financiada com dois anos de avanço e da sua credibilidade na relação com o mercado da dívida - nunca ter problema algum.

Obviamente, a vida era mais difícil do que é hoje. Agora, vê-se pelas últimas emissões, temos sido sempre um símbolo de Portugal no acesso aos mercados, reconhecidos por duas das três agências principais, o que mostra que temos feito o que é necessário para lá estar. Houve mais uma vez a reafirmação dessas qualidades na sequência dessas operações, portanto temos tido sempre aquilo que chamo de equilíbrio entre crescimento e desalavancagem.

Conseguimos muito recentemente, há uns meses, fazer uma emissão de dívida em obrigações a oito anos abaixo dos 2%. Isto mostra aquilo que é a credibilidade da EDP no mercado e também aquilo que é a credibilidade hoje da política do Banco Central Europeu (BCE) - em Portugal só há três companhias cuja dívida pode ser comprada pelo BCE, e uma delas é a EDP. Portanto, temos um enquadramento que beneficiou a companhia, não tenho dúvidas, mas que soubemos aproveitar. Por isso, não me preocupa a dívida. Se não me preocupava em 2012, ainda me preocupa menos hoje.

Soubemos fazer aquilo que era necessário no momento certo, ajustámos o nível de investimento, soubemos fazer vendas de ativos, às vezes minoritários, outras vezes na totalidade. Foi o que fizemos agora com a Naturgas, numa operação que é considerada talvez a mais interessante de toda a Europa neste momento, ou seja, em termos de múltiplos - de quantas vezes conseguimos vender os resultados anuais - e vamos dedicar 800 milhões à redução da dívida. Temos sido sempre consistentes: investimento, desinvestimento, abordagem aos mercados, isso tem sido uma nota clara que é reconhecida por todos.

E a venda da Naturgas pode ser lida como um desinvestimento da EDP no mercado espanhol?

Tudo na vida consiste em fazer escolhas. Neste momento impunha-se, mais uma vez, termos a noção daquilo que é mais core, aquilo que vai determinar mais o nosso destino e aquilo que eventualmente é menos core. E estamos num momento absolutamente extraordinário de valorização deste tipo de ativo por entidades que não são elétricas, como a nossa.

Quem neste momento valoriza estes ativos são companhias que não têm que ver com o setor, como fundos de pensões, fundos de infraestruturas para remunerar, num mundo de taxas baixas, os seus pensionistas e outros, com estruturas de capital mais eficientes do que a nossa. Portanto, foi uma questão de eficiência, de criação de valor para os acionistas. E a reação do mercado foi clara, de todos os analistas, mas também do mercado no reconhecimento de que a valorização da EDP, quando anunciou estas duas operações, foi clara, foi consistente e foi reconhecida porque capturou valor. Por isso, não estamos a desinvestir em Espanha, o que fizemos foi ir a uma atividade menos core, a do gás, e focarmo-nos cada vez mais naquilo que é a nossa atividade principal na área da geração, que são as renováveis, mantendo aquilo que é o nosso negócio tradicional na distribuição de eletricidade.

Em Espanha, a venda deixa de fora a comercialização do gás. Porquê esta opção?

Deixa. Eu vendo basicamente os tubos, que têm uma remuneração fixa, mantendo a capacidade de esses clientes continuarem a ser fornecidos de gás por mim. Já não passarão nos nossos tubos, passarão nos tubos de alguém que é remunerado por um ativo regulado. Em Espanha vamos continuar. Somos a empresa que mais tem crescido na oferta conjunta de gás e eletricidade aos clientes finais - e essa estratégia não se vai alterar.

E há novos mercados onde a EDP esteja a pensar investir?

Neste momento, a principal fonte de crescimento são os Estados Unidos. O Brasil é um mercado onde apostamos de uma forma estrutural, independentemente dos problemas de curto prazo. Estamos também no Canadá, no México. Fizemos investimentos importantes no vento. E estamos a investir na Itália, na França, na Roménia, na Polónia. Ou seja, nos países onde existem recursos renováveis, onde existe estabilidade regulatória, estabilidade legal, e por isso temos privilegiado estes mercados onde o passado é o passado e o futuro é o futuro.

Cada vez que tomamos uma decisão temos de ter visibilidade sobre aquilo que é o enquadramento. E quando falávamos nas eventuais alterações ou não de vontades políticas, os EUA têm uma vantagem muito grande, é que o passado fica no passado, e quando há mudanças, estas só se aplicam ao futuro. E isso é uma coisa muito importante na atração de investimento.