Marcelo Rebelo de Sousa apresentou, esta quarta-feira, uma nova edição das «Farpas» de Eça de Queiroz e Ramalho Ortigão, destacando a actualidade dos textos do século XIX, nomeadamente, no que se refere à intolerância do poder às críticas.
A presença do professor despertou muita curiosidade nas pessoas, devido à sua saída da TVI, o que tornou pequena a sala da livraria Bertrand, onde foi apresentada a edição definitiva das «Farpas», dirigida por Maria Filomena Mónica.
Apesar Marcelo Rebelo de Sousa nunca se referiu directamente à polémica que levou ao fim da sua colaboração na TVI como comentador político após as críticas do ministro dos Assuntos Parlamentares.
No entanto, a situação deu outra actualidade às palavras de Eça, que criticava o espírito da sua própria época dizendo que «quem se compromete (com uma opinião), não tem onde» a exprimir.
Marcelo Rebelo de Sousa lembrou que os textos de crítica política e social de Eça de Queiroz e Ramalho Ortigão têm «tanta coisa que permite um paralelo» com os dias de hoje, nomeadamente, o «cepticismo, a distância entre governantes e governados, a crítica à linguagem e à prática política e a falta de sentido de humor» de quem é criticado.
Citando directamente as palavras de Eça de Queiroz, Marcelo referiu-se ao descrédito do Parlamento, ao desrespeito pela figura do chefe de Estado (o Rei) e à ideia de que «ninguém ousa publicar metade da opinião, porque tudo o que sai disso toma as proporções de um escândalo».
Marcelo Rebelo de Sousa explicou que os textos das «Farpas» demonstram «uma independência crítica e um não-alinhamento e uma postura panfletária» que se alinharam com a «crise do sistema representativo, uma crise económica e financeira e um novo-riquismo dominante nas novas classes».
Destacando as medievais «cantigas de escárnio e maldizer» como um «filão» na literatura portuguesa, Marcelo Rebelo de Sousa afirmou que «a ironia não é uma grande qualidade portuguesa», em especial para os criticados, pois reagem com «falta de sentido de humor».