Um cientista sul-africano duvida da aplicação prática da vacina contra o vírus da febre hemorrágica ébola, desenvolvida por cientistas norte americanos, cuja descoberta vem publicada na edição de hoje da revista «Nature».
Um cientista sul-africano duvida da aplicação prática da vacina contra o vírus causador da febre hemorrágica ébola, desenvolvida por cientistas norte-americanos, cuja descoberta vem publicada na edição de hoje da revista «Nature».
Segundo Robert Swanepoel, do Instituto de Virologia sul-africano (NIV), apesar do êxito obtido nos testes à vacina em macacos, a sua aplicação em seres humanos vai apresentar «enormes problemas», um vez que o custo da sua produção é «milionário» e a possibilidade de ser utilizada reduzida.
A vacina foi desenvolvida por uma equipa coordenada por Gary J. Nabel, do Instituto Nacional da Saúde de Bethesda, Maryland, e é o primeiro teste em primatas a conseguir uma resposta eficaz do sistema imunitário contra o ébola.
Testes em sub-tipo do vírus
Os médicos trabalharam com o sub-tipo do vírus identificado no Zaire, considerado o mais mortal das quatro estirpes conhecidas (Ebola-Zaire, Ebola-Sudão, Ebola Costa do Marfim e Ebola-Reston).
Swanepoel, que acaba de regressar do Uganda onde colaborou no controlo de um surto de ébola que matou mais de 150 pessoas desde meados de Outubro, considera que quem produzir a vacina terá de fazê-lo por «caridade», uma vez que não poderá recuperar os custos através de «vendas contínuas».
«Esta doença pode desaparecer durante os próximos vinte anos antes de ressurgir», disse o cientista, levantando a questão da utilização da vacina entretanto.
Ainda que tenham uma incidência mortal muito elevada, assinalou o biólogo, os surtos de ébola desaparecem rapidamente devido a esta característica.
Mutação do vírus é problema para vacina
Como coordenador da unidade especial de patógeneos do NIV, Swanepoel sublinhou outro problema que enfrenta a vacina e que se relaciona com a mutação que o vírus do ébola apresenta nos distintos surtos registados, desde há 26 anos, em vários países da região equatorial africana.
«A próxima vez que o vírus aparecer será outra estirpe e mesmo quando se produzir uma vacina contra todas as variantes conhecidas, a última a aparecer será de um tipo distinto e a inoculação provavelmente não resultará em imunização», continuou o investigador.
Ressalvou ainda que a viabilidade económica de uma vacina contra o ébola não pode ser comparada à de outras destinadas à erradicação da varíola, poliomielite ou sarampo, cujas constantes epidemias em todo o mundo vão permitir que os laboratórios produzam centenas de milhões de doses a um preço acessível.
Descobrir origem, eis a questão
Apesar de reconhecer o mérito de tentar combater a doença com uma vacina, Swanepoel e a sua equipa apostam na erradicação do ébola através da descoberta da origem do vírus e do animal que o hospeda entre um surto e outro.
Experiências de laboratório efectuadas em determinadas espécies de morcegos mostraram que estes animais não morrem mesmo depois de terem sido infectados pelo ébola, o que levanta algumas hipóteses mas não confirma se é este o reservatório natural do vírus.
A febre hemorrágica de ébola recebeu a sua denominação devido ao nome de um rio no noroeste da República Democrática do Congo (ex-Zaire), onde foi detectado pela primeira vez em 1976, causando a morte de 270 pessoas.
A doença, que com a epidemia no Uganda já causou mais de mil mortos, foi, desde então, identificada periodicamente em vários países da zona tropical africana, como Costa do Marfim, Gabão, sudoeste do Sudão e no Quénia.