Pelo menos 183 mil pessoas foram mortas durante os 24 anos da ocupação indonésia de Timor Leste, mais de 70 por cento às mãos das forças de segurança indonésias e milícias, segundo um relatório polémico.
Os números em causa surgem no relatório da Comissão de Acolhimento, Verdade e Reconciliação Timor Leste, a que a agência Lusa teve acesso parcialmente.
Até agora não havia nenhum documento com o balanço do número de mortos no país durante a ocupação indonésia.
O relatório diz que, neste tempo, 183 mil pessoas morreram e verificaram-se oito massacres. Entre 1977 e 1979, pelo menos 84200 pessoas foram vítimas fatais da fome e doença, em resultado das transferências forçadas de populações para campos fortemente controlados por militares indonésios.
Identificações codificadas
Ao longo das 2500 páginas o documento não só contém os nomes das vítimas, mas também daqueles que violaram os direitos humanos entre 25 de Abril de 1974 e 25 de Outubro de 1999.
As identificações são secretas, apenas o presidente da República de Timor-leste, Xanana Gusmão, que recebeu o relatório em Outubro passado, tem na mão a chave para a descodificação.
No relatório consta ainda uma lista de actos condenáveis verificados que vão desde execuções colectivas a deslocações forçadas da população civil, passando por actos de tortura, violações e abusos de crianças.
O documento diz que estes actos não foram praticados apenas por forças indonésias. O partido que ocupa o poder, a FRETILIN, Frente Revolucionária de Timor-leste Independente, e a oposição, a UDT - União Democrática de Timor, também poderão estar envolvidos nestes ataques.
O relatório refere por exemplo o massacre de 160 guerrilheiros da FRETILIN e familiares, ocorrido em Setembro de 1981 nas encostas do Monte Aitana, entre os distritos de Manatuto e Viqueque, a sudeste de Díli.
Sobre os acontecimentos de 1999, quando se realizou a consulta popular sobre a independência patrocinada pela ONU, o documento conclui que a violência não resultou de acções descontroladas nem de actos individuais de militares indonésios, mas de uma estratégia calculada pelas altas patentes.
Divulgação polémica
A divulgação deste relatório tem sido muito polémica e tem marcado a agenda política em Díli, com a liderança política timorense solidariamente favorável à não divulgação imediata do conteúdo.
As organizações de direitos e a hierarquia católica timorense pressionam em sentido contrário para que as violações cometidas durante a ocupação venham ao conhecimento público.
O relatório é fruto de um trabalho feito no terreno realizado ao longo de 18 meses, onde foram realizadas mais de 1500 acções de reconciliação comunitária, com vítimas e violadores frente-a-frente.
«Chega» é o nome do documento, expressão que representa um alerta às consciências para que tudo o que se passou nunca mais se volte a repetir.