Sociedade

O pedreiro a quem ardeu a rebarbadora e a troca de favores

Bárbara Baldaia

Pedrógão tenta reerguer-se das cinzas, mas o fogo levou quase tudo. Muitos não têm sequer as ferramentas de trabalho para poderem recomeçar a trabalhar. Impera a máxima "ser uns para os outros".

Abílio Bernardo é um homem de olhos claros e cabisbaixos. Guarda as mãos dentro dumas calças com vinco e encaixa um palito no canto da boca. Desloca-se num "papa-reformas", como lhe chama Dina Duarte entre risos. Ela, que anda a distribuir alguma da solidariedade que chega a Pedrógão Grande, percebeu a situação dele em conversa com Eugénio Santos. Estão a tentar ajudá-lo.

- É pedreiro, não é? Tem que me dizer aquilo que lhe faz falta

- Então, foram duas rebarbadoras...

- Tem que ser um orçamento... O que é essencial.

- Posso escrever já.

- Não, mas eu preciso de um orçamento.

- Eu sei quanto custa uma rebarbadora...

Pedrógão procura renascer das cinzas. As pessoas querem voltar à vida normal, querem voltar a trabalhar, mas, muitas vezes, foram as próprias ferramentas de trabalho que arderam.

- Uma rebarbadora custa 200 euros.

- E é essencial para começar a trabalhar?

- É essencial uma rebarbadora. Também me ardeu o martelo elétrico, que custa 400 euros.

- Se começar com a rebarbadora já consegue fazer alguma coisa...

- Agora vou ali ver um telhado e não tenho rebarbadora para cortar a telha...

- Então e onde é que isso se vende?

- A outra comprei lá em baixo no Luís Miguel.

Há telhados que é preciso reparar, há muros que é preciso voltar a erguer, há hortas e quintas que é preciso reconstruir.

E os vizinhos ajudam-se uns aos outros.

- Há uma coisa que lhe vou pedir. Se eu precisar da sua ajuda para reconstruir os currais da Ti Cacilda, pode ajudar?

- Claro.

- Então, pronto, fazemos já este negócio.

Abílio regressa ao "papa-reformas" com um ar mais leve. Dina e Eugénio regressam à mala do carro dela para acabar de separar bananas e curgetes, detergentes e papel higiénico.