Uma das 500 casas que arderam é a de Sebastião Esteves. Agora, só gostava que o ajudassem a reconstruí-la. "Fresquinha de verão e quentinha de inverno", mas modesta. "Não me importa de luxos".
Sebastião Esteves vive em Nodeirinho, Pedrógão Grande, tem 83 anos e um carro com rádio, que é a companhia dele. Sintoniza-o na Rádio São Miguel, e explica que emite para "Penela, Castanheira de Pera e Pampilhosa da Serra" e que "dá música que é uma maravilha, tudo portuguesa, não tem nada dos ie-ie-iés".
É tudo o que lhe resta. O resto ardeu. "E eu não ardi porque não calhou", acrescenta.
Sebastião Esteves tem vontade de falar, conta pormenorizadamente o que lhe aconteceu, os barulhos que ouviu ("uma zoeira medonha"), as imagens que testemunhou ("lume pelo ar, por todos os sítios"), nada lhe sai da cabeça. "Pensei 'vou aqui morrer assado', vi-me aflito", confessa, ao mesmo tempo que se emociona.
"Fui para a casa de banho e agarrei-me à Nossa Senhora. Parece que ainda estou a ver aquilo". Depois, fugiu. Conta como escapou do fogo, como só lhe sobrou o carro, como toda a casa ardeu. "Tinha tudo o que era preciso, máquina de lavar, frigorífico, um fogão - tinha dado 210 euros por ele ao Henrique - três televisões - uma na sala, outra na cozinha e outra no meu quarto, só para estar na cama a ver televisão quando me ia deitar", relembra.
Eram "quartos pequenos, antigos", descreve Sebastião, que agora só queria que o ajudassem a arranjar a casa para poder voltar a viver nela: "Não me importa de luxos, o que é preciso é ter uma casinha para viver e aquela minha casinha era tão boa. Tinha-a forrada com aquelas placas de esferovite. Era tão fresquinha de verão e tão quentinha de inverno. Era uma maravilha! Estava ali a viver tão bem...".
Fecha os olhos, descansa a cabeça no encosto do Opel vermelho, aponta para as pernas. "Sou eu e mais as minhas pernas. Não tenho mais nada. E o carro, que não me ardeu, o que foi um milagre. Eu digo que foi Nossa Senhora de Fátima que me acudiu".
Agora está a viver em casa de uma vizinha de uma aldeia próxima e conta com os alimentos da ajuda que chegou a Pedrógão Grande e que são distribuídos pelos voluntários da freguesia da Graça.