Economia

Vêm aí 100 milhões para a internacionalização das empresas

Gustavo Bom/Global Imagens

Assumiu a pasta da Internacionalização em julho. Eurico Brilhante Dias lê os sinais da economia e revela como funciona o fundo Internacionalizar.

O programa Internacionalizar foi aprovado esta semana. É um fundo dos fundos de que valor?

Antes do montante, porque é que precisamos de um fundo dos fundos? Porque apresentar mais um fundo às vezes é deitar mais dinheiro sobre um problema...e pode ser atirar para um buraco sem fundo. Aquilo que identificámos foi uma lacuna em duas áreas específicas. Trabalhamos bem a promoção externa com o sistema de incentivos, com os meus colegas do Compete, trabalhamos a captação de investimento e temos recursos para captar investimento direto estrangeiro e promover o investimento nacional, mas esses recursos não podem ser utilizados para duas coisas: promover IDE e suportar operações de exportação com financiamento do importador. Aquilo que temos vindo a trabalhar com os ministérios da Economia e Finanças, e queremos construir em 2018 para estar operacional em 2019, é um fundo que pode orçar, no limite, 100 milhões de euros, mas depois tenha a multiplicação noutros fundos que procuram captar IDE com participação de outros atores externos. Um perímetro de 100 milhões de euros que pode ter um efeito multiplicador que em 2019, e em função da nossa capacidade de captar IDE, poderá andar próximo das cinco centenas (500 milhões).

Quando esses fundos vão chegar às empresas? Só em 2019?

Continuamos a trabalhar nas linhas, por exemplo, da convenção Portugal-Angola, nos seguros de crédito, nos seguros de caução, em alguma linha específica para a apoiar a banca comercial nesse processo, mas queremos fechar um processo que é relativamente longo e é menos rápido do que gostaríamos, em particular quando pensamos que estamos a constituir um fundo agora que precisa de passar na Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) e precisa de uma construção que demora tempo. Não queremos antecipar e fixar prazos que não sejam possíveis de concretizar.

Como será a articulação entre o setor privado e o setor público?

Esse era o grande desafio do programa Internacionalizar. Aliás, essa é a grande questão do programa. O primeiro-ministro sinalizou logo em 2016 que o processo de internacionalização é um processo partilhado. Aquilo que procurámos foi apresentar um draft, levado ao conselho estratégico para a internacionalização da economia, presidido pelo primeiro-ministro e discutido na Assembleia. O que fizemos foi, a partir daí, construir um instrumento que, com a governação do conselho estratégico para a internacionalização da economia, com a articulação com o Ministério dos Negócios Estrangeiros, das Finanças, da Economia - e outros setoriais, como Agricultura e Justiça, onde estão alguns dos custos de contexto -, para servir de interface com as confederações internacionais, com as câmaras de comércio. E ter um programa conjunto para ver as exportações em conjunto, porque há muitas ações que são desenvolvidas por privados e que têm apoio público, em particular da AICEP, e para promovermos uma imagem de Portugal que acrescente valor aos bens e aos serviços produzidos no nosso país. A resolução que o Conselho de Ministros aprovou no dia 9 de novembro tem um método e esse é grande parte da eficácia do programa.

Que salto quer que seja dado na forma como o país é visto fora?

O salto qualitativo é necessário. Porque Portugal em muitas geografias ainda não é percebido como um país onde se produzem bens e serviços de elevado valor acrescentado. Portanto, o trabalho que temos de fazer como terra de acolhimento no turismo, como economia capaz de produzir produtos de elevado valor acrescentado, é um trabalho para continuar a fazer. Dizer que parte do Airbus é produzido em Portugal, que a cortiça está na Sagrada Família, que temos uma parte substantiva do BMW série 5 produzida em Portugal, na parte mais complexa da eletrónica de um BMW, continuam a ser aspetos que são desconhecidos. A tarefa que temos para fazer é alterar, junto de decisores económicos, públicos e privados no exterior, esta perceção do país. Se formos capazes de o fazer vamos arrastar esta imagem de qualidade, até uso a palavra "sofisticação" e para um made in Portugal que acrescenta valor. Vamos fazer este trabalho com os ministérios e a AICEP está fortemente envolvida. Mas não basta, precisamos dos agentes privados e de outros atores do universo público.

Em relação aos países da CPLP, sobretudo Angola e Moçambique, há medidas concretas?

Os mercados da CPLP, falando de Angola e Moçambique, continuam a ser mercados muito importantes para as empresas portuguesas e têm um valor para a economia portuguesa muito superior àquilo que aparece nas estatísticas quando olhamos para o ranking. Angola é o mercado para onde mais empresas portuguesas exportam. Não é em valor - o ano de 2016 foi muito difícil para as empresas portuguesas, as exportações para Angola desceram praticamente 50% Este ano estão a crescer 40%, mas a partir de uma base diferente. E Moçambique, apesar de ser um mercado longínquo, é onde também estão muitas empresas e onde Portugal faz a diferença. Mesmo antes de eu entrar para este cargo, a AICEP já tinha tomado a decisão de abrir delegações em todos os países da CPLP. É uma opção política, não apenas económica ou de suporte às empresas portuguesas. Os instrumentos que temos, como linhas comerciais suportadas pelo Tesouro, têm sido essencialmente dirigidos aos mercados da CPLP. Veremos como é que evoluem estes dois mercados num futuro próximo, porque temos sofrido dificuldades recentes, em particular em 2016. Aquilo que propusemos foi reforçar o apoio às empresas nesses mercados e estamos preparados. Até porque grande parte das pequenas e médias empresas (PME) que entram e saem do setor exportador, entram e saem de mercados lusófonos.

A mudança da Presidência em Angola abre novas perspetivas?

Nesse aspeto só posso repetir a frase do ministro dos Negócios Estrangeiros: são assuntos do Estado angolano, Portugal respeita a soberania do Estado angolano.

E China e Macau estão no radar do programa Internacionalizar?

Estão muito. A República Popular da China é um mercado incontornável. Temos vindo a crescer nas exportações, mas continua com um défice da balança de bens e serviços. São economias com dimensões tão diferentes, era pouco provável que não tivéssemos um défice com um mercado daquela dimensão e com aquela capacidade de produção. Aquilo que fizemos foi anunciar a abertura do consulado em Cantão, dentro do plano estratégico da AICEP, e temos Pequim, Xangai, Macau. Manifestámos, esta semana, à vice -ministra do Comércio, que veio a Portugal, mas também às autoridades de Macau, que estamos disponíveis para um instrumento de cofinanciamento para PME em países de língua portuguesa, dando já um primeiro sinal de que o fundo dos fundos pode ser útil para fazer coinvestimento com capital macaense, neste caso do fundo de Macau. E consideramos que Portugal tem de crescer naquele que vai ser o maior mercado consumidor do mundo, com uma procura muito sofisticada. Estamos a falar de economias em que os bens portugueses, apesar de serem poucos, podem ter uma valorização única. Vamos continuar esse caminho. As nossas exportações valem para a China 1,5%, portanto é muito pouco, é 1/15 do que exportamos para Espanha.

Existe uma meta para alcançar na China?

Para a China, em concreto, não. Temos mercado a mercado, percebemos que há um grande esforço a fazer na diversificação, acima de tudo nos mercados para onde exportam as empresas. Por exemplo, mais de 20% das nossas exportações são para o mercado espanhol, depois logo a seguir vêm a França, a Alemanha e por aí adiante e percebemos logo que os principais mercados valem 50% das nossas exportações. Mas a maior questão está quando olhamos para as empresas que exportam e percebemos que metade exporta só para um mercado. Essa é que é a questão da concentração e que a política pública tem de procurar dar resposta e que procuramos dar com o programa Internacionalizar.

A entrevista a Eurico Brilhante Dias vai para o ar este sábado, às 13h, na TSF. É também publicada na edição em papel do Dinheiro Vivo deste sábado, que sai com o Diário de Notícias e com o Jornal de Notícias.