O bastonário da Ordem dos Advogados concorda com a regra que vai impedir os jornalistas de divulgar o conteúdo das escutas telefónicas por parte de jornalistas. Os advogados Ricardo Sá Fernandes e António Marinho Pinto estão contra esta norma.
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O bastonário da Ordem dos Advogados concorda com a nova regra de impedimento da publicação do conteúdo de escutas judiciais por parte de jornalistas, a não ser que esta seja autorizada de forma expressa pelos visados.
Em declarações à TSF, Rogério Alves entende que este impedimento não põe em causa a liberdade de expressão, uma vez que o direito constitucional relativo à privacidade tem excepções.
O bastonário recordou um hipotético caso em que um juiz num tribunal pode considerar que mais importante do que o direito à privacidade de uma pessoa poderá ser a convicção de que essa pessoa preparar um atentado terrorista ou um homicídio.
Rogério Alves explicou que, apesar deste impedimento, os «jornalistas podem continuar, por um lado, a fazer a sua própria investigação sobre os seus casos e, por outro lado, a divulgar tudo aquilo que não esteja em segredo de justiça, a fazer o seu comentário sobre os processos».
«O que não podem é revelar algo que foi obtido dentro de um processo em condições muito específicas de autorização de um juiz e que corresponde a conversas privadas que devem também, como regra, no segredo de quem as profere ou, no limite, serem utilizadas para fins de investigação criminal», concluiu.
Opinião diferente tem o advogado Ricardo Sá Fernandes, que não tem dúvidas em classificar esta norma que vai constar do novo Código Penal, que entrará em vigor dentro de 15 dias, como uma «vergonha» e está ferida de inconstitucionalidade.
O causídico, que não percebe como Rogério Alves se referiu à questão das escutas como uma fase anterior aos julgamentos, lembrou que «no julgamento, a regra não é a da protecção da privacidade».
«O julgamento é, muitas vezes, uma exposição da privacidade. No julgamento, a regra constitucional é a da publicidade e o que se passa no julgamento, designadamente a audição das escutas telefónicas, a leitura de transcrições, se for relevante para o julgamento é relevante para o público», defendeu.
Também António Marinho Pinto partilha da opinião de que a imposição desta norma é «gravíssima», pois tornará a democracia opaca e comandada pelos segredos, ao contrário daquilo que seria desejável num Estado de Direito.
«Esta alteração ao Código de Processo Penal vai traduzir-se numa grave restrição e numa grave limitação à liberdade e ao direito do informar», afirmou este advogado, que tal como Ricardo Sá Fernandes diz que a «regra em processo penal é a da publicidade».
Marinho Pinto vai mais longe e diz mesmo que «com estas regras estamos a assistir a uma modificação do paradigma processual democrático que é transformar o segredo, a opacidade em regra».
Este advogado sublinhou que com esta nova norma as escutas «raramente poderão ser transcritas porque raramente os interessados vão autorizar a sua publicação e transcrição pela comunicação social».