Miguel Telles Antunes apresentou ontem, na Academia das Ciências de Lisboa, o livro «O Último dos Neandertais em Portugal». Revelações surpreendentes - como, por exemplo, a Península Ibérica ter sido o último refúgio desta espécie - pautaram a sessão.
Corpo do artigo
Miguel Telles Antunes contou ontem, na Academia das Ciências, uma história: (parte da) história do Homem. Uma plateia reduzida - cerca de 30 pessoas -, escutou a voz calma e o discurso pausado do investigador que, capítulo a capítulo, falou da sua obra «Os Últimos Neandertais em Portugal».
Telles Antunes, investigador da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa, não se deixou intimidar pelo «peso» da Academia das Ciências (e do seu belíssimo Salão Nobre), não utilizou termos imperceptíveis e foi essa a magia que nos fez chegar. Afinal o Homem de Neandertal, que por aqui terá vivido há cerca 27 mil anos, pode dar um contributo valioso para perceber qual a origem e o destino do Homem.
O Homem de Neandertal terá encontrado o seu último refúgio na Península Ibérica. A representação desta espécie, que teve muita importância na Europa e no Próximo Oriente, vai-se reduzindo devido à pressão da «concorrência»: o Homo Sapiens.
No entanto, segundo Telles Antunes, uma das hipóteses que este trabalho veio consolidar é que o Homem de Neandertal é uma espécie distinta do Homo Sapiens e não uma sub-espécie, como muito tempo se pensou. Neandertal e Sapiens terão «coexistido na mesma área geográfica e sobreviveu a espécie mais forte», avança o investigador.
Ao longo da história de pequenas/grandes revelações que nos contou, Miguel Telles Antunes deu conta dos resultados das escavações feitas na Gruta das Salemas, na Gruta da Columbeira e na Gruta da Figueira Brava - esta localizada no Parque Natural da Arrábida.
Os vestígios do passado permitiram-lhe e à vasta equipa de investigadores, pormenorizar as condições em que teriam vivido os últimos Homens de Neandertal, de que se alimentavam, que fauna e flora existiam.
Algumas conclusões são surpreendentes: o estudo da Arábida e a composição da sua cadeia permitem afirmar que a agora serra foi anteriormente uma ilha. Por lá passaram tartarugas terrestres - uma espécie já extinta que terá sido um petisco para estes homens porque, conforme frisou Telles Antunes, era um animal lento e bastava partir a carapaça.
Os vestígios de mamíferos encontrados na Gruta da Ribeira Brava, como os golfinhos e a foca anelada, apontam claramente «para um clima mais frio que hoje».
Conselho Nacional de Paleontologia vai estimular investigação
«Os Últimos Neandertais em Portugal» é a edição em livro das comunicações do colóquio internacional sobre o mesmo tema, realizado a 18 de Janeiro de 1999 e agora reunidas na colecção «Memórias da Academia das Ciências de Lisboa, Classe de Ciências», com o apoio à edição da Fundação para a Ciência e Tecnologia e do Instituto de Conservação da Natureza.
O editor e coordenador da obra, frisou que «este livro é um estudo muito detalhado sobre o habitat em que viveram os últimos homens de Neandertal». O «produto final» é fruto do trabalho de muitos especialistas, nacionais e estrangeiros.
O ministro da Ciência e da Tecnologia, José Mariano Gago, presidiu à sessão de lançamento do livro e sublinhou o «verdadeiro trabalho detectivesco» que é levado a cabo pelos investigadores na área de paleontologia.
Mariano Gago, que criou um grupo de trabalho para avaliar as condições da investigação científica em Portugal, anunciou ontem a criação «a breve trecho» de um Conselho Nacional de Paleontologia.
Este organismo, que resulta das necessidades sentidas pelos investigadores em Portugal, deverá «contribuir para a preservação, conservação e definição de áreas estratégicas de intervenção em matéria de paleontologia em Portugal». O futuro Conselho Nacional de Paleontologia deverá agregar instituições públicas, universidades e o Estado.