Portugal foi um dos principais protagonistas deste ano europeu. O facto de ter assumido, pela segunda vez, a presidência dos Quinze levou a que o seu nome ficasse associado a quase tudo o que de importante se passou na UE.
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Reformas políticas, reformas institucionais, desenvolvimento da «nova economia» e outros avanços marcaram este ano europeu. O ano 2000 começou com o corte de relações com a Áustria e termina com a crise das vacas loucas ao rubro.
Durante este ano, Portugal acabou por ver o seu nome associado a quase tudo o que de importante se passou na União Europeia. Uma das razões foi, indiscutivelmente, o facto do país ter assumido, pela segunda vez, a presidência dos Quinze.
O desempenho de Guterres
O desempenho europeu do primeiro-ministro, António Guterres, foi sem dúvida um dos pontos fortes deste ano, sobretudo na forma como liderou os destinos da UE no primeiro semestre.
Portugal presidiu à UE numa época de risco e de possível ruptura da «família comunitária», depois de, no final de Janeiro, 14 Estados-membros terem cortado relações políticas bilaterais com a Áustria. Esta situação complicou a obtenção de consensos a Quinze por parte da presidência portuguesa, que mesmo assim, conseguiu manter a coesão dos Catorze, sem isolar em excesso o parceiro de Viena.
Apesar de todos os riscos, o primeiro-ministro português conseguiu controlar o acontecimento, tendo um papel bastante activo na resolução da crise poucos meses depois, já durante a presidência francesa da UE.
Uma «nova economia», ao serviço do crescimento económico
A crédito de Guterres fica também a Cimeira Extraordinária sobre Emprego, Reformas Económicas e Coesão Social, Para uma Europa da Inovação e do Conhecimento que decorreu em Lisboa, em Março.
Nesta reunião, os Quinze aprovaram um conjunto de reformas e planos destinados a colocar a «nova economia», baseada na internet e na sociedade da informação, ao serviço do crescimento económico, do emprego e da coesão social na União.
O encontro de Lisboa ficou marcado pelo compromisso de transformarem a Europa no espaço mais competitivo e dinâmico do mundo, no prazo de 10 anos. O que se pretende é que a Europa iguale e, se possível, ultrapasse, os níveis de desenvolvimento económico e tecnológico protagonizados pelos Estados Unidos da América, a grande potência do fim do século XX.
O complicado acordo fiscal
Durante o consulado de Portugal, os Quinze conseguiram também chegar a acordo sobre a fiscalidade da poupança, uma matéria que se arrastava consecutivamente nos últimos anos, sem qualquer resolução à vista.
O acordo fiscal foi alcançado na Cimeira dos Quinze de Santa Maria da Feira, realizado em Junho, depois de consecutivas negociações, onde a presidência portuguesa ultrapassou as fortes resistências do Luxemburgo e, depois, da Áustria. Este compromisso político foi concluído posteriormente pela presidência francesa.
Foi a primeira vez, em 12 anos, que se obteve o consenso dos Quinze sobre o quadro que irá reger a tributação dos rendimentos das poupanças dos cidadãos não-residentes, um passo fundamental para o bom funcionamento do mercado único europeu, onde existe total liberdade de circulação de capitais.
Os Estados-membros da União Europeia comprometeram-se a generalizar, até 2010, um sistema de troca de informações entre as suas administrações fiscais. O objectivo é que todos os cidadãos da Comunidade Europeia paguem impostos pelos rendimentos das suas poupanças, independentemente do Estado-membro onde elas são aplicadas.
Na realidade, isto significa o fim do segredo bancário na UE, pois cada país vai poder reclamar o pagamento do imposto sobre os capitais aplicados noutro Estado-membro.
A primeira Cimeira euro-africana
Outro dos momentos mediáticos do ano foi a primeira reunião de chefes de Estado e de governo da UE e de África, realizada em Abril.
A Cimeira euro-africana, uma ideia lançada por Portugal em 1996, esteve em dúvida durante muito tempo, devido a divergências no lado africano sobre o seu formato, tendo inclusivamente sido retirada, à última hora, do programa oficial da presidência portuguesa.
O encontro entre chefes de Estado europeus e africanos valeu fundamentalmente pelo facto de se ter concretizado, pois não teve resultados substanciais. Os Quinze já concordaram que a segunda Cimeira se realiza em Portugal, no ano de 2003.
Em Julho, António Guterres cedeu a liderança da UE ao presidente francês Jacques Chirac, mas não foi por isso que perdeu protagonismo.
A polémica Cimeira de Nice
A Cimeira Europeia de Nice alcançou, em 10 de Dezembro, no final da presidência francesa da UE, um acordo histórico sobre a reforma do funcionamento da União Europeia e das suas instituições, após quatro dias de intensas e dramáticas negociações em que Portugal esteve no centro das atenções.
O acordo, que marca o «nascimento» do Tratado de Nice, esteve bloqueado durante muito tempo por Portugal e pela Bélgica, que acabariam por ver satisfeitas as suas reivindicações em matéria de reforço dos respectivos pesos relativos no Conselho de Ministros, a principal instância decisória da UE.
Trata-se da mais importante reforma institucional da história da Europa comunitária, abrindo caminho ao alargamento da União Europeia a mais 12 Estados, dez ex-países comunistas do Leste europeu e as ilhas mediterrâneas de Chipre e Malta, um objectivo estratégico dos Quinze desde a queda do muro de Berlim.
Na Cimeira de Nice, os líderes europeus deram ainda um passo gigante na criação de um «identidade europeia de segurança e defesa», que deverá estar operacional no ano que vem.
A União Europeia pretende criar, até 2003, uma força de 50 a 60 mil homens, mobilizável em 60 dias e capaz de intervir e estar no terreno durante pelo menos um ano, em situações de gestão de crises nas quais a NATO não possa ou não queira intervir.
Tendo por base a experiência da NATO, foram criados oficialmente na Cimeira de Nice três órgãos político-militares que serão declarados operacionais até ao fim de 2001: um comité político e de segurança, apoiado por um comité militar e um estado-maior.
A UE passará a poder lançar operações de gestão de crises como, por exemplo, a evacuação urgente de cidadãos europeus que estejam num país em guerra.
Os Quinze ainda não conseguiram, no entanto, chegar a acordo com a Nato sobre o acesso aos meios da Aliança devido à oposição da Turquia, que é membro da Nato mas não da UE.
Finalmente, o nome de Portugal fica ligado, ainda que involuntariamente, ao regresso à actualidade da crise das «vacas loucas» neste final do ano europeu, com a descoberta nos Açores, de um bovino proveniente da Alemanha suspeito de estar contaminado com BSE.