A APDC critica a sobreposição do sector financeiro à lei, já que se uma pessoa solteira com um empréstimo contraído se quiser casar terá que fazê-lo pelo regime de comunhão geral de bens.
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A Associação Portuguesa de Direito do Consumo (APDC) criticou hoje o que chamou de sobreposição dos interesses do sector financeiro à lei, no que respeita a contratos de crédito à habitação celebrados por pessoas solteiras.
No conteúdo dos contratos, «entre outros atropelos», há uma norma imperativa que dita que, se o contraente celibatário se vier a casar, «terá de o fazer obrigatoriamente pelo regime da comunhão geral de bens», referiu o presidente da APDC, Mário Frota.
Segundo o jurista, «se a lei estabelece que, no silêncio das partes, vigora o regime de comunhão de adquiridos, não pode haver quem, em circunstância alguma, se sobreponha à lei e obrigue uma pessoa a casar em comunhão geral de bens. Sob pena de graves, pesadas sanções, terá a pobre da criatura de se sujeitar a um regime de bens que a lei não impõe em qualquer circunstância», realçou.
Mário Frota considera que esta situação «mostra bem a dimensão da imposição do sector financeiro, banca, instituições de crédito e das sociedades financeiras nas aquisições a crédito, enquanto grupo de pressão cujo poder vai além do que foi definido pelo legislador».
«Ainda hoje, no Diário Económico, Jorge Sampaio se vem queixar de que Portugal está espartilhado por grupos de interesses poderosos e de que o poder político vive uma fraqueza manifesta. É a confirmação de que quem dita as regras são as instituições financeiras», disse.
Segundo o presidente da APDC as instituições de crédito utilizam esta estratégia para reforçar a segurança no caso de falta de pagamento e as pessoas acabam por aceitar «porque não têm casas para arrendar e, para comprar, precisam de recorrer ao crédito».
Mário Frota lamenta que, em Portugal, não haja «uma preocupação com as pessoas e com o equilíbrio dos orçamentos» e que as instituições não se interessem «com as desgraças que podem criar».
Frota dá ainda o exemplo da Grã-Bretanha, onde «uma eventual subida de juros não afecta a vida das pessoas, porque, em vez de verem aumentado o montante das prestações, é-lhes aumentada a duração do pagamento de 20 para 21 ou 22 anos».