Serpa Pinto, um dos homens que fez a travessia de Angola a Moçambique por terra, morreu há cem anos em Lisboa. Um dos últimos heróis do passado, deixou-nos relatos e registos astronómicos, climatéricos e etnográficos de África.
Corpo do artigo
Passaram cem anos da morte de um dos últimos exploradores portugueses. A 28 de Dezembro de 1900, morria Alexandre Alberto da Rocha de Serpa Pinto, antigo governador-geral de Moçambique e explorador de África nas vésperas do Ultimato britânico.
Como oficial do exército teve o seu mérito reconhecido desde muito novo. Das explorações ficaram os seus relatos e registos dos dados astronómicos, climatéricos e etnográficos.
No século XIX, a «partilha de África» voltou a ser motivo de tensões entre as potências europeias. A industrialização e a redefinição geoestratégica do continente, depois das invasões francesas e das pretensões napoleonicas, demonstram a necessidade de novos mercados e de matérias-primas.
A Grã-Bretanha destacou-se nesta luta e dirigiu a sua atenção às terras africanas teoricamente sob alçada de Portugal. Para tal, utilizaram como argumento o tráfico português de escravos, em 1939, que veio a ser abolida no domínio português 30 anos depois.
Foi neste cenário que nasceram na Europa instituições de carácter científico, como Sociedades de Geografia, que instigadas ou fomentadas pelos governos se prontificavam a actuar em África para «cientificamente» conhecer melhor as comunidades indígenas de modo a orientar e implantar a presença europeia naqueles territórios.
Portugal, como potência colonial mas país atrasado industrialmente na Europa, teve de actuar e seguir as pisadas, com compromissos, de «ocupação» e «reconhecimento» efectivo das terras, que formalmente pertenciam ao Império português. A pressionar o gogverno de Lisboa e legitimados pela Conferência de Berlim tinha a Grã-Bretanha, a França, a Alemanha e mesmo da Bélgica.
Exploração africana forçada
Foi nessa perspectiva que nasceram as expedições de carácter geográfico-científico e colonial de ocupação, entre elas a de Henrique Carvalho à Lunda, de Hermenegildo Capelo e Roberto Ivens - de Benguela às terras de Iácca e do Sul de Angola a Quelimane -, e a de Serpa Pinto, que atravessou a África Austral de Angola até Durban na Costa Oriental.
No telegrama enviado ao rei D. Luís, enumera como fruto do seu trabalho 20 cartas geográficas, estudos metereológicos, 3 volumes de desenhos e avultado diário e o estudo completo do Alto Zambeze e de 72 cataratas. Refere ainda a perda de muita gente e as guerras constantes.
Depois do ultimato britânico de 1890, em que Lisboa cedeu e negociou, a Grã-Bretanha veio a ocupar os territórios que hoje são a Zâmbia, Malauí, Zimbabwe, Tanzânia e a África do Sul.
Serpa Pinto morreu 10 anos depois do ultimato inglês, em Lisboa, com 54 anos. A recordação da sua passagem no cone sul de África ficou, durante dezenas de anos, na vila com o seu nome no sul de Angola - Serpa Pinto, actualmente denominada Menongue. Em Portugal, muitas ruas receberam o seu nome, já sem grande memória dos seus feitos.
Cronologia
1839
1839- Os ingleses criaram um projecto de lei para eliminação do tráfico negreiro, da autoria de lorde Palmertson, que permitia que navios de guerra britânicos actuassem nas terras e costas africanas para prender embarcações de traficantes humanos com bandeira portuguesa.
1860
1860- O governo britânico ordenou a incorporação de Bolama (já ocupada desde 1830) na colónia britânica da Serra Leoa e naquele mesmo ano uma esquadra inglesa entrou na baía de Lourenço Marques (Moçambique) e notificou Lisboa de que o Reino Unido iria ocupar o território a sul dessa baía.
1876
1876- Foi proposta na Sociedade de Geografia de Lisboa uma viagem de travessia do continente africano, em missão de reconhecimento e soberania. O major Serpa Pinto e os oficiais da Marinha Hermenegildo Capelo e Roberto Ivens ficaram encarregues da missão.
1877
1877- o major Serpa Pinto foi de Benguela ao Bié e estudou as nascentes do Cuanza e Capelo e Ivens deslocaram-se de Benguela às terras de Iaca, explorando os cursos dos rios Cubango, Luando e Tchicapa.
879
1879- Serpa Pinto completava a sua missão, que o levou a atravessar Angola e a viajar por terras que hoje são parte da Zâmbia, Zimbabué e República da África do Sul.
1884-
1884- Na Conferência de Berlim, sobre o Direito Público Colonial, foi definida uma nova política de ocupação dos territórios africanos. O direito histórico que Portugal defendia foi substituído pela posse efectiva dos territórios.
1886
1886- Mapa cor-de-rosa: foi considerado português todo o território entre Angola e Moçambique.
1887-
1887- Serpa Pinto foi nomeado Cônsul Geral de Zanzibar.
1889-
1889- Como governador de Moçambique, Serpa Pinto foi protagonista de violentos confrontos de soberania e ocupação com forças autóctones e britânicas na região do Chire.
1890
1890- A Inglaterra emitiu um «ultimatum» em Janeiro, que passariam eventualmente por acções ofensivas em Moçambique e um bloqueio naval a Lisboa e a ocupação da Madeira e S. Vicente, em Cabo Verde.