José Faria, a testemunha-chave no processo contra Avelino Ferreira Torres, assegurou esta quarta-feira em tribunal que foi testa-de-ferro dos negócios alegadamente ilegais do arguido, confirmando assim o essencial da acusação do Ministério Público.
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O depoimento no Tribunal de Marco de Canaveses contraria a tese do próprio Avelino Torres, defendida antes, mas na mesma audiência, segundo a qual José Faria actuava por conta própria.
«O senhor Ferreira Torres é que me dava ordens» afirmou. «Fazia tudo o que ele mandava», sublinhou mesmo a testemunha.
José Faria respondeu a várias questões do procurador Remízio Melhorado sobre os negócios que alegadamente executou em nome de Ferreira Torres: contactava os proprietários dos terrenos, acertava com eles os preços e depois pagava-lhes com o dinheiro que o autarca lhe dava.
Foi desse modo que comprou várias propriedades, a favor da imobiliária detida por Ferreira Torres e família, a Horizontes do Tâmega, pagando por elas 71 mil contos (355 mil euros), segundo Faria.
Uma das propriedades adquiridas chamava-se Monte do Alto Marão e tinha 55.000 metros quadrados. Faria contou que pagou 12 mil contos por esse terreno, «que estava destinado a receber uma zona industrial», admitindo que recebeu uma gratificação de 5.000 contos porque «tinha feito um bom
Negócio».
Questionada pelo procurador, a testemunha-chave admitiu que Ferreira Torres lhe emprestou quatro a cinco mil contos, ao longo de 30 anos, e garantiu que pagou tudo.
Avelino Ferreira Torres tinha dito que lhe emprestara mais de cem mil contos.
Faria testemunhou também que trabalhadores da Câmara colaboraram na construção de um campo de jogos numa quinta de Avelino Ferreira Torres.
Admitiu ter desenvolvido negócios próprios no ramo imobiliário e identificou, inclusive, três empresas a que esteve ligado.
Em resposta a um requerimento de Nuno Brandão, um dos advogados de Avelino Ferreira Torres, a juíza-presidente do colectivo, Teresa Silva, decidiu pedir uma perícia psiquiátrica à testemunha, no sentido de se avaliar a sua credibilidade e a sua aptidão mental para depor.
O pedido vai ser dirigido, com nota de muito urgente, ao Departamento de Psiquiatria do Gabinete Médico-Legal que funciona junto do Hospital de Penafiel.
Apesar deste pedido, a magistrada admitiu o testemunho de José Faria, decidindo mais tarde, em função da perícia psiquiátrica, se o considera ou não.
Também na sessão de hoje, o denunciante dos factos que originaram este julgamento, Gil Mendes, disse que a sua colaboração com as autoridades se apoiou em «dados» que lhe foram fornecidos precisamente por José Faria.
«Sei pelo que o senhor José Faria me contou», «ouvi falar», «não vi, mas ouvi» ou «sem ter a certeza absoluta do que vou dizer» foram algumas das expressões mais utilizadas por Gil Mendes ao longo do seu depoimento.
Avelino Ferreira Torres está a ser julgado pela alegada prática de corrupção e mais cinco crimes alegadamente cometidos no exercício de funções autárquicas.
No final da sessão de hoje do julgamento, José Faria disse aos jornalistas que não tem medo da perícia psiquiátrica, «desde que não seja feita por Avelino Ferreira Torres».
Já o ex-presidente da Câmara e arguido disse não fazer a mínima ideia do que resultará desse exame, mas acrescentou: «Ele não anda lá muito bem».
Aos jornalistas, o arguido insistiu que emprestou «montanhas de dinheiro» a Faria e exibiu um cheque e uma declaração alegadamente comprovativos da existência desses empréstimos.
O cheque era de 25 mil contos e a declaração referia-se a um pagamento de 75 mil contos.
Questionado sobre o resultado que espera do julgamento, afirmou: «Se não for absolvido, é a denegação da Justiça, é tudo uma farsa».
A conversa com os repórteres acabou com Avelino Ferreira Torres a acusar alguns deles de «javardos», depois de ser questionado sobre a alegada proximidade entre ele e a testemunha-chave.
O julgamento prossegue dia 14, às 14:30, altura em José Faria continua a depor, e dia 28, às 09:30.