
O papel e a participação de quem paga as faturas nas entidades gestoras para garantir mais qualidade, eficiência e transparência, a necessidade de inovação e a valorização estratégica dos setores da água e dos resíduos num futuro mais sustentável foram temas de discussão nas últimas “Conferências de Março” da ERSAR.
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A análise, os painéis de discussão e a partilha de experiências foram novamente as bases da iniciativa organizada pela Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR) no Pavilhão do Conhecimento, em Lisboa. Vera Eiró, Presidente do Conselho de Administração, ressalta que nesta quarta edição, as Conferências de Março também realçaram o propósito de tornar mais visível e transparente o trabalho da entidade reguladora, demonstrando a vitalidade dos setores envolvidos. “Muitas vezes são invisíveis e só damos por eles quando alguma coisa corre mal”, referiu. Com ventos de mudança a soprar da União Europeia, “ventos ciclónicos”, foi a expressão ouvida no auditório, Vera Eiró destacou o impacto das novas diretivas nas decisões tomadas em Portugal. “As exigências são assentes em questões ambientais, mas sobretudo em temas de resiliência que são estratégicos”. Para ilustrar as pretendidas novas metas há dois exemplos: a deposição em aterro de resíduos urbanos tratados em Portugal ronda os 57%, sendo que o objetivo para 2035 é ter, no máximo, 10%. Em relação à reciclagem de resíduos urbanos, atualmente ronda os 32%, situando-se a meta para 2035 nos 65%.
Responsabilização conjunta
Para a ERSAR este é também o tempo de enfatizar a importância da responsabilização conjunta de entidades gestoras e consumidores. “São a peça fundamental sobretudo em setores monopolizados, como o caso da água onde não há opção de escolha”, sublinhou a entidade que regula o setor. “O trabalho desenvolvido beneficia tanto os consumidores de hoje como os de amanhã”. Na gestão de resíduos urbanos, os consumidores desempenham também um papel ativo, porque a qualidade do serviço e a recolha seletiva depende, em parte, da separação correta do lixo na origem. Paulo Fonseca, Coordenador do Departamento Jurídico e Económico da Associação Portuguesa para a Defesa do Consumidor (DECO) pede transparência, sublinhando que as entidades gestoras devem ser claras na definição das tarifas praticadas, “o que não está a acontecer”, alerta. Sobre eventuais aumentos na fatura, o responsável da DECO afirma que não devem ser os consumidores a arcar com os custos das ineficiências do sistema e, neste caso, dá o exemplo da água desperdiçada ou perdida pela infraestrutura deficiente. Na recolha seletiva, Paulo Fonseca citou experiências com os biorresíduos que já estão em vigor, desde 2023, e que têm uma lógica de bonificar o consumidor, “mas são muito poucas as que efetivamente o fazem”.
A Deco concorda com a responsabilização dos consumidores, mas Paulo Fonseca defende que é essencial dar-lhes mais voz. O responsável afirma ainda que a instituição tem vindo a promover informação para elevar os níveis de literacia dos consumidores sobre gestão sustentável da água e dos resíduos urbanos, sublinhando, todavia, que é preciso envolvê-los no trabalho desenvolvido pelas entidades gestoras. “Muitos dos problemas evocados, resultam, em parte, da resistência de algumas entidades gestoras à regulação”, refere. Para a Deco, assegurar a qualidade do serviço exige uma regulação forte, capaz de sancionar incumprimentos.
Pelo quarto ano consecutivo, a ERSAR organizou as Conferências de Março tendo como tema-chapéu o valor estratégico da água e dos resíduos urbanos para um futuro mais sustentável. Especialistas dos dois setores apresentaram resultados e discutiram soluções para maior eficácia e qualidade dos serviços.
Reforçar a circularidade e a inovação
A importância da circularidade na gestão da água e dos resíduos motivou um dos painéis de debate onde foi destacada a necessidade e relevância de unir setores menos óbvios para gerar sinergias benéficas. Entre os exemplos surgiu o caso da estação de tratamento de Frielas que, desde 2019, reaproveita água residual para o sistema de refrigeração de uma grande superfície comercial. Como incentivo à modernização dos setores e na lógica de premiar e reconhecer boas práticas desenvolvidas nas entidades gestoras, a entidade que as regula, a ERSAR lançou este ano o Prémio Inovação. Estiveram em votação, entre os pares, três projetos do qual saiu vencedor o Wat(t)er FabLab – Impressão 3D da Empresa de Águas e Energia do Município do Porto. Trata-se de um projeto que utiliza a impressão 3D e surgiu da reciclagem de resíduos produzidos nas obras de reparação da empresa. Através da utilização de bioplásticos biodegradáveis e recicláveis, o processo permite a produção interna de peças essenciais para a gestão das infraestruturas de abastecimento de água, com custos até 70% inferiores aos tradicionais.
