
Os desafios e as soluções para implementar transportes públicos mais sustentáveis, eficientes e atrativos para os cidadãos, cumprindo as metas da neutralidade carbónica definidas, foram o foco de mais uma conferência da iniciativa TECH4 Sustainability, realizada no dia 13 de dezembro, no CEIIA, em Matosinhos.
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'Melhor Mobilidade’ foi o tema do evento promovido pelo Município do Porto, sob coordenação da Porto Digital e da Direção para a Neutralidade Carbónica do Porto, no âmbito da atividade do Pacto do Porto para o Clima, e da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP) como parceiro.
A iniciativa começou com Filipe Araújo, vice-presidente da autarquia, a traçar um cenário de “mudança de paradigma da mobilidade” na próxima década no Porto, com mais e melhor oferta, e também maior gratuitidade de transporte. Na sua intervenção, Filipe Araújo referiu o compromisso no qual a cidade se tornará “mais amiga das pessoas”, com mais espaço para a mobilidade suave e para os peões. Segundo o também vereador do Pelouro da Inovação e Ambiente da Câmara do Porto, a chegada da alta velocidade ferroviária em 2032 será fulcral em todo o processo.
Investimento na mobilidade do futuro
“Nós hoje temos, no Porto, mais de mil milhões de euros a ser investidos em mobilidade. Para quem vinha do zero já é claramente alguma coisa e temos praticamente um investimento, mais ou menos igual, que também se afigura para os próximos tempos com as novas linhas de Metro. E aqui ainda nem sequer estou a pôr a linha de alta velocidade, que também terá, obviamente, um grande impacto”, declarou Filipe Araújo, na sessão de abertura da conferência que deu visibilidade à evolução dos sistemas de transporte urbano, com contribuição da ciência e da tecnologia, e a soluções contemporâneas, elétricas, a hidrogénio, gás natural e biometano, com potencial para estimular a utilização do transporte público, em detrimento do automóvel.
“Hoje estamos a materializar o que vai acontecer na próxima década que é, de facto, uma mudança como nós não assistíamos há muito tempo. Quando pensamos porque é que temos mais carros e mais congestionamento, temos que pensar que não foi dada solução às pessoas para se moverem de forma diferente”, defendeu, adiantando que, por exemplo, com “as novas linhas de Metro e de Metrobus” haverá “mais condições para puxar o espaço público mais para o lado do cidadão e menos para o lado do automóvel”.
O vice-presidente da Câmara do Porto considerou ainda que a alta velocidade permitirá “ligar vários polos importantes, em tempo e custo competitivo, face a outros meios de transporte, nomeadamente, o carro privado”, promovendo “uma transformação brutal na zona de Campanhã”, onde ficará localizada a futura estação. “Disso não há dúvida, porque sabemos o que acontece em qualquer zona do mundo quando há uma estação de alta velocidade. Mas, acima de tudo, queria dizer que, para o país e para a região, vai ser uma enorme oportunidade. Saibamos nós utilizá-la bem para nos capacitar e para nos continuarmos a desenvolver”, sublinhou.
Novas soluções de mobilidade verde
No primeiro painel sobre ‘Descarbonização da Mobilidade’, moderado por André Brochado da Câmara Municipal do Porto, Cristina Pimentel (STCP - Sociedade de Transportes Colectivos do Porto) afirmou que a empresa fará parte da grande mudança que se avizinha em termos de mobilidade, até porque, após o processo de “intermunicipalização” em 2021, “se prepara para assinar com os acionistas o novo contrato de serviço público para os próximos 10 anos”. “A STCP vai assumir-se, mais uma vez, como o esqueleto e o grande operador rodoviário do Grande Porto”, referiu, adiantando que a empresa “acompanhará as grandes alterações que a cidade vai viver nos próximos anos, nomeadamente com a abertura de novas linhas de Metro, de novos corredores de BRT - Bus Rapid Transit [Porto e Matosinhos] e continuidade dos Corredores de Alta Qualidade”. “Traremos um plano de investimentos devidamente adaptado a esta nova realidade e que contempla já uma estratégia muito sólida relativamente à descarbonização da empresa, à modernização da sua frota e à constante inovação da sua operação”, indicou.
No mesmo painel, Cecília Silva do Departamento de Engenharia Civil, da FEUP, deu a conhecer o projeto BooST, cujo objetivo é impulsionar o uso da bicicleta em “cidades-principiantes”, proporcionando conhecimentos técnicos específicos para o efeito. “É um modo totalmente independente do carbono que temos estado a desconsiderar quando falamos de mobilidade suave. Andar a pé é importante, mas a bicicleta também o é, e em Portugal acreditamos que a bicicleta não é culturalmente possível e no Porto acreditamos que a topografia é impossível”, comentou, considerando que “hoje fazemos tecnologias para resolvermos coisas bem piores que topografia, portanto, tecnologicamente não é o problema e culturalmente também não, porque nos anos 50 andávamos de bicicleta”.
“Hoje estamos a materializar o que vai acontecer na próxima década que é, de facto, uma mudança como nós não assistíamos há muito tempo."
Futuro mais sustentável a chegar em "alta velocidade"
“Mobilidade a Alta Velocidade” foi o tema de um segundo painel com Rui Calçada, diretor da FEUP e especialista em ferrovia, que considerou que tendo em conta “lições de outros países” a concretização das primeiras linhas [Lisboa-Porto e Porto-Vigo] fará “uma revolução” em Portugal. “A alta velocidade mostrou que, onde foi implementada, revolucionou completamente os países, quer do ponto de vista económico e de coesão territorial, quer a forma como as pessoas se movimentavam”, afirmou, defendendo que este “é o meio de transporte mais eficiente” tanto de passageiros como de mercadorias, a longa distância. Defendeu também que deve “articular-se com todos os outros modos”, por forma a formar uma rede que permitirá também uma melhor mobilidade à escala das cidades. O especialista destacou ainda a necessidade de criação de “corredores” de alta velocidade para o transporte de mercadorias na Europa.
Sobre a chegada da alta velocidade, Susana Bettencourt, do departamento municipal de planeamento urbano da câmara municipal do Porto, afirmou que o projeto criará, por via da nova infraestrutura ferroviária e da nova estação, “uma nova centralidade” e também “um polo intermodal” em Campanhã.
“É uma oportunidade enorme para a cidade do Porto e temos que saber aproveitá-la. Vai reduzir, na nossa opinião, muitíssimo a utilização do automóvel, porque vai ser um grande polo intermodal naquele local”, declarou, adiantando que a autarquia tem intenção de criar “uma nova ligação rápida através de uma antiga linha desativada entre Campanhã e a Alfândega”. Referiu ainda que a ali nascerá também uma conexão ao aeroporto Francisco Sá Carneiro.
“Vai ser uma transformação muito grande no território, não só para Campanhã e para a cidade, mas para o país”, considerou Susana Bettencourt , reforçando que a câmara do Porto está “a trabalhar no sentido de aproveitar ao máximo essa imensa oportunidade” da chegada da alta velocidade ferroviária. E convidou até a população interessada a “visitar no átrio dos Paços do Concelho”, a maquete do percurso da linha e também “a proposta” da autarquia “para a frente nascente de Campanhã”.
Um último painel, sobre “O papel da Mobilidade na neutralidade carbónica das cidades do futuro”, abordou a agenda BE.Neutral, que envolve 44 entidades, agregando indústria, academia e setores científico e tecnológico, visando a criação de plataformas de mobilidade sustentável para descarbonizar oito municípios da região Norte, entre eles o Porto. E focou soluções como plataformas digitais integradas, uma nova geração de infraestruturas físicas e digitais, e novos serviços de mobilidade com vista à descarbonização das cidades, tendo como convidados Sandra Melo, coordenadora de investigação e desenvolvimento na área da mobilidade do CEiiA, Pedro Barradas, da ARMIS, uma empresa especialista em digitalização e descarbonização do transporte e da mobilidade, Margarida Pina, da BEN4US, do CEiiA, para a valorização de novos serviços de mobilidade, e Mafalda Mendes, coordenadora científica da Herbi. Neste último caso, trata-se de uma startup que criou um biodispositivo de sequestro de CO2, através de plantas, e que depois é quantificado e transformado “em valor económico [créditos de carbono] para a cidade”. Segundo Mafalda Mendes, pelo menos três municípios, um deles Matosinhos, vão implementar ou estão interessados no biodispositivo.
Os conteúdos produzidos no âmbito desta atividade estão disponíveis no site do https://tech4sustainability.porto.digital/.
