"A televisão como a conhecíamos já não existe. E penso que não terá grande futuro"
O Dia Mundial da Televisão foi proclamado a 21 de novembro de 1996, pelas Nações Unidas. No dia em que se assinala esta data, o jornalista Joaquim Letria, que marcou a televisão durante décadas, foi o convidado da Manhã TSF.
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Chegou à televisão depois de ter já deixado marca na rádio e nos jornais. É com apenas 18 anos que chega ao Diário de Lisboa, passando depois pela Revista Flama, pelo Rádio Clube Português, pela Associated Press e pela BBC. Logo a seguir ao 25 de Abril, é nomeado diretor-adjunto de Informação da RTP para os programas não-diários.
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Entrevistado na Manhã TSF, Joaquim Letria recorda o momento criativo que marcou esses tempos, com programas como o "TeleDomingo" (o 'avô' do atual "Prós e Contras") e o Informação 2. "É das grandes recordações que tenho na minha vida. No fundo, foi criar uma televisão nova e trazer essa alternativa para o povo português", lembra.
Foi logo em 1975 que moderou o histórico debate histórico entre Álvaro Cunhal e Mário Soares - do qual saiu a famosa expressão "Olhe que não!". Um debate de três horas que Joaquim Letria recorda como um encontro entre "dois estadistas", que só acabou quando um assistente de realização da RTP gatinhou até à mesa de Letria para pedir que terminassem, de uma vez.
"Hoje não há debates", comenta o jornalista, sobre o atual panorama televisivo. "Aquilo é como os combates da Bombox no Parque Mayer, nos anos 1950. É tudo chique e sem graça nenhuma. São pugilistas de terceira, com 'soundbites' e pouco mais."
Joaquim Letria não se vê como um "homem da televisão", mas como "um jornalista que está onde é preciso". Mas hoje, diz, os comentadores políticos estão a ocupar o lugar dos jornalistas nas televisões. A mescla entre os dois mundos, frisa, não vem de agora. Antigamente, a televisão já era "uma máquina em que os políticos se metiam muito e em que havia grandes jogadas" - comparando a então estrutura da televisão público a uma "bebinca", um bolo indiano "com muitas camadas".
Há quatro anos, voltou para uma rubrica regular num programa da TVI, depois de um longo jejum televisivo. "Estive 17 anos sem que alguém me perguntasse sequer se precisava de alguma coisa para comer", atira, deixando críticas às atuais chefias das televisões portuguesas. "As direções e as administrações das televisões hoje sabem muito pouco de televisão, podiam até estar a administrar uma fábrica de salsichas" em vez de canais televisivos, sugere Letria.
A televisão como a conhecemos, Joaquim Letria não tem dúvidas, está condenada. "Já não há paciência para aturar programas daquilo a que chamamos 'televisão generalista'", declara. "A televisão como a conhecíamos já não existe mais. E penso que não terá grande futuro."
O caminho deverá passar, cada vez mais, "pelos canais temáticos, pelas 'Netflixs', para as histórias, para as séries,..", adverte. "A caixa que mudou o mundo está a caminho de alguma coisa, mas ainda não percebemos bem o que é."