O nome tem estado perdido na história do cinema português, mas o legado permanece e há uma nova atenção sobre a realizadora. "Quem é Bárbara Virgínia?" estreia no Doclisboa.
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A 20 de setembro de 1946, uma cidade do sul de França recebe o primeiro Festival Internacional de Cinema. A edição inaugural de Cannes apresentou em competição filmes como "Roma Cidade Aberta", de Rossellini, "Breve Encontro" de David Lean, "Gilda" de Charles Vidor e também dois portugueses - "Camões" de José Leitão de Barros e "Três Dias Sem Deus", de Bárbara Virgínia.
Bárbara Virgínia. A primeira mulher a realizar um filme de ficção em Portugal em 1946. Foi a única longa-metragem que realizou, com apenas 22 anos.
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Ricardo Vieira Lisboa, investigador e crítico de cinema, conta que "Três Dias Sem Deus" foi um filme particular - o produtor não tinha qualquer relação com o cinema (era um importador de canetas de tinta permanente), foi adiado várias vezes (durante a Segunda Guerra Mundial faltava a película) e o realizador escolhido não pode participar porque teve de ir para os Estados Unidos.
Bárbara Virgínia, atriz principal do filme, era também assistente de realização e acabou por ser convidada para assumir as rédeas.
"Três Dias Sem Deus" marca a estreia das mulheres portuguesas na realização de ficção, mas é também o primeiro exemplo de um filme de género gótico em Portugal, "que nunca fez escola", que vem na linha dos filmes americanos dos anos 40, como "Rebecca" de Hitchcock ou "O Monte dos Vendavais" de William Wyler.
A história encaixa no género, tal como a própria realização - "o jogo de luz e sombra, pormenores como uma maçaneta que roda, um rosto assustado, um corredor escuro, um piano que toca...".
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Do filme que foi a Cannes restam apenas 26 minutos de película sem som. E da memória de Bárbara Virgínia sobra também muito pouco.
Nos últimos anos, tem surgido um novo interesse. Ricardo Vieira Lisboa descobriu uma entrada num dicionário de cinema; texto curto, que o levou a querer saber mais. Daí resultou uma tese de mestrado.
Na mesma altura, Luísa Sequeira encontrava também esta história esquecida quando estava a preparar um projeto sobre a mulher no cinema em Portugal. E teve a ideia de fazer um documentário.
"Quem é Bárbara Virgínia" estreia no festival Doclisboa. Nele, viajamos ao lado de Luísa Sequeira, abrimos o álbum de fotografias, percorremos a história desta mulher que ousou realizar um filme em 1946, em Portugal.
Bárbara Virgínia era um nome artístico. Uma homenagem às mulheres da família. Chamava-se Maria de Lourdes Dias Costa e nasceu a 15 de novembro de 1923 em Lisboa.
Declamadora de poesia, atriz de teatro e de cinema, apresentadora de programas de rádio, escritora, assistente de produção, realizadora. Morreu a 7 de março de 2015, durante a rodagem do documentário, na véspera do dia da mulher. Tinha 92 anos. Faz parte da história do cinema português.
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"Quem é Bárbara Virgínia?" estreia no Doclisboa na quarta-feira, dia 25, às 18h45, no Cinema São Jorge, em Lisboa. Tem uma segunda projeção no domingo, dia 29, às 14h00, na Culturgest.
No Brasil, estreia na Mostra de São Paulo a 27 de outubro.