O artista, natural de Vila Velha de Ródão, tinha 97 anos
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O escultor e pintor Manuel Cargaleiro morreu este domingo aos 97 anos. O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, já lamentou a morte do artista plástico numa nota publicada no site da Presidência.
"Tendo vivido em Paris desde 1957, Manuel Cargaleiro nunca deixou que o cosmopolitismo significasse desenraizamento. Prova disso é a memória das imagens e das cores da Beira Baixa na sua obra, nomeadamente a lembrança das mantas de retalhos; prova disso igualmente a empenhada presença do artista na região onde nasceu, através da Fundação e do Museu Cargaleiro", pode ler-se na nota de Marcelo.
O Presidente, que condecorou Cargaleiro com as Grã-Cruzes da Ordem do Infante D. Henrique e da Ordem de Camões, afirma, nesta nota de pesar, que nunca vai esquecer o último encontro que manteve com o artista, há apenas algumas semanas.
"Na casa deste em Lisboa, em que continuava a sonhar projetos para o futuro e a acreditar na Vida, sempre prestigiando Portugal", acrescenta.
"Morreu tranquilo, rodeado pelos seus"
Manuel Cargaleiro "morreu tranquilo, rodeado pelos seus, adormeceu", disse a sua companheira.
O artista plástico nasceu em 16 de março de 1927 em Chão das Servas, no concelho de Vila Velha de Ródão, no distrito de Castelo Branco. O presidente da autarquia, Luís Pereira, recorda um homem cativante que ajudou a prestigiar e levar o nome do município a todos o país e fala de uma grande perda para a cultura nacional.
"Neste momento estamos extremamente emocionados, é uma perda enorme para todos nós. O mestre cargaleiro era uma pessoa cativante e prestigiou imenso o nosso país e em particular o concelho de Vila Velha de Ródão pela obra e legado que nos deixa. Para mim, o que é mais relevante é o seu humanismo, a proximidade com as pessoas e a alegria contagiante de viver. Uma pessoa marcante a todos os níveis e foi uma perda para Vila Velha de Ródão e para o nosso país", acrescentou à TSF Luís Pereira.
A sua obra foi fortemente inspirada no azulejo tradicional português. Em 1949, ingressou na Escola Superior de Belas Artes de Lisboa e participou na Primeira Exposição Anual de Cerâmica, no Palácio Foz, em Lisboa, onde realizou a sua primeira exposição individual de cerâmica, no ano de 1952.
No início de carreira, ainda na década de 1950, recebeu o Prémio Nacional de Cerâmica Sebastião de Almeida, e o diploma de honra da Academia Internacional de Cerâmica, no Festival Internacional de Cerâmica de Cannes, em França, numa altura em que iniciara funções de professor de Cerâmica na Escola de Artes Decorativas António Arroio e apresentara as suas primeiras pinturas a óleo no Primeiro Salão de Arte Abstrata.
Nas décadas de 1960 e 1970, participou em exposições individuais e coletivas e durante este período afirmou-se não apenas como conceituado ceramista, mas também como desenhador e pintor. Nos anos 1980 começou a explorar a tapeçaria.
A partir da década de 1990, predominariam na sua obra os padrões aglomerados e cromaticamente intensos onde continuaria a ser evocado o azulejo português.
Em Castelo Branco, viria a ser inaugurada a Fundação Manuel Cargaleiro, em 1990, depois expandida com o respetivo museu e mais tarde, no Seixal, distrito de Setúbal, a Oficina de Artes Manuel Cargaleiro.
Boa parte da obra de Manuel Cargaleiro está na cidade, capital do distrito onde nasceu. O presidente da Câmara de Castelo Branco, Leopoldo Rodrigues, adiantou à TSF que a autarquia quer inaugurar muito em breve um novo espaço onde seja possível garantir que a obra do escultor seja eterna.
"Castelo Branco tem uma presença muito forte do mestre Manuel Cargaleiro, é em Castelo Branco que está a sede da fundação Manuel Cargaleiro e o museu, sendo que neste momento tem dois espaços dedicados e estamos a trabalhar no sentido de inaugurar e disponibilizar um terceiro espaço muito direcionado à parte da cerâmica do mestre. É um espaço que, em termos físicos, já está concluído. Falta-nos algumas questões relacionadas com os espaços expositivos e de como esses espaços serão agora organizados no espaço físico que já dispomos para o efeito. Esse será um trabalho que iremos fazer com alguma celeridade, sendo que o mestre Manuel Cargaleiro todos os dias se celebra em Castelo Branco e nos espaços referenciados há pouco", revelou Leopoldo Rodrigues.
No último ano teve patente as exposições "Eu Sou... Cargaleiro", no Mosteiro de Ancede - Centro Cultural de Baião, no distrito do Porto, uma mostra de pintura na Casa Museu Teixeira Lopes - Galerias Diogo de Macedo, em Vila Nova de Gaia, intitulada "Cargaleiro, Pintar a Luz Viver a Cor", e uma exposição de gravura no Fórum Cultural de Ermesinde, em Valongo, de nome "A essência da cor". Este ano levou obras nunca expostas à sua oficina, no Seixal.
O ceramista recebeu, em Paris, em 2019, a medalha de Mérito Cultural do Governo português e a Medalha Grand Vermeil, a mais alta condecoração da capital francesa, onde viveu grande parte da sua vida.
Na altura, foi também inaugurada a ampliação da estação de metro de Champs Elysées-Clémenceau, com novas obras de Manuel Cargaleiro, depois de originalmente concebida e totalmente decorada pelo artista português, em 1995, incluindo o painel em azulejo "Paris-Lisbonne".
Em 2017, no exato dia do seu 90.º aniversário, foi condecorado com a Grã-Cruz da Ordem do Infante Dom Henrique.