Após três anos de obra, Convento de São João de Cabanas, comprado por cantora lírica, começa a funcionar este agosto como alojamento turístico e espaço de eventos
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O Convento de São João de Cabanas em Afife, Viana do Castelo, onde viveu o poeta Pedro Homem de Mello e inspirou algumas das suas poesias mais conhecidas, acaba de ser reabilitado.
Após três anos de obra, vai abrir ao público, este mês de agosto, como alojamento turístico e espaço de eventos. A obra com traça do arquiteto Fernando Cerqueira Barros, recebeu recentemente uma menção honrosa no European Prize of Architecture Philippe Rotthier 2024.
O mosteiro, que começou por ser habitado por monges beneditinos e pertenceu à família do autor do poema “Havemos de ir a Viana”, foi comprado pela cantora lírica suíça, Nathalie D’Ornano, e está apto para acolher hóspedes, que poderão fazer refeições no espaço onde comiam os monges e dormir nas suas antigas celas.
“A nível de construção civil, a obra está pronta. Estamos agora com acabamentos, pequenas coisas de carpintaria, pinturas. Está a ser montada a cozinha do restaurante. Já tem acontecido aqui alguns eventos e o edifício está praticante pronto a receber hóspedes. Inclusive, durante o mês de agosto, já vão ficar aqui algumas pessoas”, contou o arquiteto, que guiou a TSF durante uma visita ao renovado convento.
A parte de alojamento, para já, conta quatro quartos, nas antigas celas, e mais dois na casa pertencente à quinta, onde são cultivados produtos agrícolas, árvores de fruto e um roseiral. Futuramente poderão ser criados mais dois quartos em antigos moinhos da propriedade.
Recuperada foi também a igreja do antigo mosteiro, cujas paredes exteriores voltaram à sua cor emblemática. “Recuperamos a cor tradicional que era o rosa velho. Inclusive, Pedro Homem de Mello fala num dos seus poemas, ‘da cor da folha da rosa’ [‘A minha terra é Viana’, cantado por Amália Rodrigues], e de Cabanas, ‘róseo jardim’, e, portanto, fizemos a recuperação destas cores antigas que o mosteiro tinha”, justificou Cerqueira Barros, descrevendo que a enorme magnólia, junto ao edifício, também foi intervencionada para manter o espírito do lugar, juntamente com o som do correr contínuo da água do ribeiro de Cabanas. “A magnólia é tema de vários poemas, não só de Pedro Homem de Mello, mas de outros poetas. Portanto, é muito relevante no pátio de entrada e na relação com o rio”, indica o arquiteto, que se mostra satisfeito com o resultado final da obra, que apesar da intervenção profunda, aos olhos de quem o visita, parece apenas que o imóvel foi lavado e pintado. Enaltece o investimento “pessoal e financeiro” da nova proprietária, e o seu empenho em manter intacta a identidade e a poesia do local.
“Infelizmente em muitos edifícios desta escala, pequenos mosteiros, casas nobres, rurais, tem havido uma imposição de programas hoteleiros muito pesados, com números de quartos enormes que obrigam à construção de novas alas e à transformação dos espaços”, comentou, continuando: “Aqui, há uma adaptação muito grande do programa ao edifício, foi isso que permitiu que antiga cozinha fosse reconstruída para ser cozinha, que o refeitório dos monges volte a ser a sala de refeições do restaurante, que o número de celas se mantenha e, portanto, cada pessoa vai poder dormir num quarto que tem a escala original”. Considera que houve um “encontro muito feliz” entre o querer da proprietária e a equipa responsável pela execução da obra.
Aquando do início da obra, em 2021, Nathalie D’Ornano, [ausente do país no dia desta reportagem], estimou o valor da obra em um milhão de euros. E mostrou-se completamente rendida ao Convento de São João de Cabanas. "É uma história de amor. Uma folie (loucura). Fiquei completamente enamorada. De tudo. Da Natureza, do jardim, do edifício, do ribeiro e da energia que é muito boa aqui", disse. A cantora lírica transformou, entretanto, um outro imóvel junto ao mosteiro, no “Café de Cabanas”. Entre um e outro, passa o caminho de Santiago.
O convento de São João de Cabanas foi fundado por S. Martinho de Dume em 570.
De arquitetura religiosa, maneirista, pertenceu à Ordem de S. Bento (1382). Foi habitado por frades beneditinos, até à extinção das ordens religiosas. Manteve o perfil arquitetónico. Está classificado com Imóvel de Interesse Público desde 1984.
O convento de Cabanas foi comprado em 1897 por Adolfo Cunha Pimentel, antigo Governador Civil do Porto, avô de Pedro Homem de Mello, que fez depois dele o seu refúgio no Minho.
Nas paredes exteriores do imóvel e em vários pontos da freguesia de Afife, ao seu redor, há painéis em azulejos azuis e brancos, com escritos de homenagem ao poeta e poemas do próprio.
"O rio passa em Cabanas, por entre fragas...tão lindo, que embora desça da serra, parece que vai subindo!", é um trecho de poesia que se lê, num dos quadros de azulejo azul e branco, na parede do convento, assinado pelo poeta Pedro Homem de Mello, com data de 6 de setembro de 1939, quando ali passava temporadas.
