Música e cinema unidos num "ritual para processar emoções": documentário "As Fado Bicha" quer "juntar pessoas"
Realizado pela luso-francófona Justine Lemahieu, o filme acompanha a jornada artística e ativista da dupla Lila Tiago e João Caçador. A documentarista diz à TSF que tudo começou depois de um concerto, onde ouviu uma música que lhe tocou particularmente
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Depois de assistir a um concerto das Fado Bicha no bairro onde vive, em 2019, Justine Lemahieu quis realizar este documentário por várias razões, a começar pela canção "Crónicas do Maxo Discreto". "A música toca um tabu, que é a sexualidade escondida", como refere a realizadora à TSF, "ou seja, homens heterossexuais que têm outra sexualidade escondida por causa da impossibilidade que a sociedade dá dessa sexualidade de existir".
A luso-francófona confessa que este é um tema que lhe é muito próximo. "Este tabu existe dentro da minha família e era a primeira vez que encontrava pessoas que tinham a coragem de falar desta questão."
Mas as motivações não ficaram por aqui. "Acho muito interessante a forma como as Fado Bicha estão no cruzamento de um questionamento sobre género e sobre classe social, por exemplo", afirma, revelando que partilha com a banda um amor pelo fado. "Nasci em França, mas estou cá há 20 anos, e a forma como transmitiam a paixão pelo fado, tocou-me. Foi este amor pelo fado, pela música, que nos juntou", sublinha.
Após o concerto em 2019, Justine Lemahieu enviou uma mensagem às Fado Bicha, pelas redes sociais, com a sua ideia. "No início, a Lila [Tiago] estava com dúvidas porque era ainda a fase inicial das Fado Bicha, e, também, ter a presença de uma câmara, frequentemente, é uma entrega muito grande", explica a cineasta, frisando que "foi o João [Caçador] que insistiu".
A partir daí, começou a acompanhar as filmagens dos ensaios, os concertos, bastidores e as rodagens de videoclip - um longo percurso, que durou até ao ano passado. Apesar de alguma hesitação inicial, Justine Lemahieu realça que as Fado Bicha sempre a acolheram "de forma muito aberta, com generosidade e paciência".
A realizadora não esconde a felicidade de ver o documentário chegar às salas de cinema. "Estou muito contente! Vai estar em Lisboa, no Porto, em Santarém, Setúbal, Leiria e em mais cidades. A minha alegria é que [o documentário] possa chegar a mais pessoas, a um público diversificado, que se calhar não conhece as Fado Bicha, e assim possa conhecê-las."
Justine Lemahieu expressa ainda um desejo: "Espero que o filme possa juntar as pessoas. O fado e o cinema são rituais que juntam as pessoas para processar, em conjunto, as nossas emoções. Espero que o filme tenha esse papel."
