"Não digam nada que vos possa comprometer." Avante! teve no ar uma rádio clandestina
À TSF, Maria da Piedade Morgadinho, funcionária do PCP, conta que uma das tarefas "mais empolgantes que teve" foi, precisamente, ter trabalhado na Rádio Portugal Livre, onde esteve 12 anos. Considera que o mundo atravessa "dias muito perigosos" e assegura que, apesar dos 93 anos, "se fosse necessário voltar, voltaria"
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Um estúdio improvisado no palco da Festa do Avante mostrou aos ouvintes como era feita a rádio na clandestinidade durante a ditadura. A TSF coloca-a no ar.
"Interrompemos a nossa rubrica Discos Pedidos para alertar os nossos ouvintes de uma notícia de última hora: estão a ser apreendidos rádios na região de Beja", o som ecoa do aparelho antigo.
No estúdio improvisado do palco, há uma mesa, dois telefones, três microfones e outras tantas atrizes, que "estão numa cave" a partir da qual "recebem algumas pessoas que vêm assistir à rádio".
"Pedem-lhes para não fazerem barulho, para se sentarem muito quietas, porque qualquer pessoa nos pode denunciar", explica a atriz Isabel Costa, da companhia de teatro Os Possessos, que faz o texto e interpretação da locução desta rádio, que está no ar há mais de um ano.
Durante 40 minutos passam na antena músicas de intervenção banidas pela censura. "E, entretanto, tem rodado. [O projeto] foi pensado para os terceiros e quartos anos, muito especificamente, porque é nessas idades que estudam o século XX e, em particular, a Revolução Portuguesa de 1974. Mas o que tem acontecido é que muitas pessoas nos têm procurado, penso que pela temática, e então acabamos por no próprio espetáculo ir atualizando consoante o público que temos à frente", explica.
A iniciativa inspira-se na Rádio Portugal Livre, emissora do PCP, que emitia desde a Roménia.
"Recomendamos que não digam nada que vos possa comprometer", ouve-se novamente.
E, desta vez, à boca de cena estava uma espectadora muito especial, que foi "muitíssimo ouvida para fazer este espetáculo": em causa está Maria da Piedade Morgadinho, funcionária do partido há 73 anos.
Os meus melhores 12 anos foram na rádio.
À TSF, a comunista conta que uma das tarefas "mais empolgantes que teve" foi, precisamente, ter trabalhado na Rádio Portugal Livre, onde esteve 12 anos. Por considerar que o mundo atravessa atualmente "dias muito perigosos", assegura que, apesar dos 93 anos que carrega, "se fosse necessário voltar, voltaria".
A Rádio Portugal Livre esteve no ar de 1962 a 1974 e fechou com um aviso: "Se for preciso, voltaremos."