Num mundo em que "novas narrativas se sobrepõem aos factos", João Costa alerta para preservação da memória coletiva
O antigo ministro da Educação vai participar no KULTURfest Lisboa. Em declarações à TSF, realça o "paralelismo" entre a ascensão do nazismo e o que está a acontecer atualmente: "Aquilo que se dizia sobre os judeus no passado será o que se diz hoje sobre alguns imigrantes que estão em Portugal"
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A programação do festival KULTURfest Lisboa propõe uma reflexão sobre o papel da Cultura em tempos de ascensão da extrema-direita, com particular foco na Alemanha. Em declarações à TSF, um dos convidados do painel sobre resistência artística, o antigo ministro da Educação João Costa, sublinha que "importa" compreender o passado para que "não se repitam os mesmos erros".
"É impossível não olhar para o que está a acontecer neste momento na Europa e no mundo, e não nos lembrarmos do caminho rápido que foi a ascensão do nazismo num país que era um país de filósofos, de músicos, de grandes nomes da literatura e, portanto, o contexto da Alemanha há quase 100 anos deve inquietar-nos para percebermos que isto também acontece em países com níveis elevados de acesso à educação", explica.
E exemplifica, acrescentando que há "paralelos muito preocupantes": "Aquilo que se dizia sobre os judeus no passado será o que se diz hoje sobre alguns imigrantes que estão em Portugal". Destacando que "é preciso resistir", João Costa garante ainda que "a arte e a cultura" são "fontes" para isso, nomeadamente no "trabalho sobre a memória coletiva".
Estamos, claramente, a deixar que novas narrativas se sobreponham aos factos. Aquilo que, por exemplo, em Portugal se tenta dizer sobre o falhanço dos 51 anos de democracia é uma tentativa de chegar a uma geração que já não tem memória do Portugal pré-democrático (...) São muitos os problemas que temos na saúde, na educação, na habitação, nos salários baixos, [mas] nós estamos muito, mas muito melhor do que alguma vez estivemos. Estas tentativas de transformar as memórias são muito sérias, são muito graves.
Por exemplo, em janeiro assinalaram-se os 80 anos da libertação do campo de concentração de Auschwitz. O antigo governante refere que "é preciso não deixar a memória morrer e não deixar que estas datas sejam apenas efemérides, dias no calendário, em que se sensibiliza muito nesse dia e esquecemos nos outros 364 dias do ano".
O KULTURfest Lisboa arranca esta quarta-feira e estende-se até domingo. A conversa sobre a resistência artística acontece na sexta-feira às 19h00 e toda a programação pode ser consultada aqui.
