Lisboa recebeu a 10.ª edição dos Encontros do Cinema Português, uma iniciativa da NOS Audiovisuais, para celebrar dez anos de apoio à produção cinematográfica nacional, que vem fazendo o seu caminho... mas tem ainda muito por caminhar. Como o prova um estudo académico apresentado.
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O evento realizou-se durante todo o dia de quarta-feira nos Cinemas NOS Vasco da Gama, em Lisboa, e reuniu profissionais de toda a cadeia do setor audiovisual que puderam ver cerca de meia centena de novos projetos de longa-metragem, além de um debate sobre o futuro do cinema português.
Nas dez edições, desde 2016, já passaram pelos Encontros do Cinema Português cerca de 400 projetos e mais de dois mil participantes.
Em destaque nesta edição esteve a apresentação de um estudo da CresCine, por Manuel Damásio, professor universitário e diretor do Departamento de Cinema e Artes dos Media da Universidade Lusófona, em que é analisada a evolução do cinema em países europeus comparáveis a Portugal.
O estudo (do CresCine, projeto financiado pelo programa europeu Horizon), propõe-se a servir de base empírica para o objetivo de “aumentar a competitividade da indústria cinematográfica europeia”, além de querer “aumentar a diversidade cultural”, pelo enfoque nos “pequenos mercados” do setor.
Assim, o estudo incide sobre as indústrias de cinema de sete países, entre os quais Portugal, Estónia, Lituânia, Dinamarca, Irlanda, Croácia e a região de Flandres, na Bélgica. Foram consideradas cinco dimensões comparativas entre os ecossistemas cinematográficos destes cinco países considerados pequenos na indústria do setor: níveis de audiência em território nacional, exportação, orçamentos médios, volumes de produção e reconhecimento em festivais entre 2014 e 2022. O estudo contemplou igualmente cerca de trinta indicadores quantitativos ao longo da cadeia de valor, desde a produção e financiamento, distribuição, exibição e receção. Com 4%, Portugal é o país onde o share do cinema doméstico é menor, face ao total exibido. A Dinamarca tem 31% de quota doméstica, a Lituânia 19%, só para citar os que obtêm melhor share em termos de produção nacional. No caso português, por cada meio milhão de habitantes, o país 0,65 filmes de ficção e 0,73 de documentários. São os piores números entre os países estudados. Sobre Portugal, Damásio afirma que “Portugal tem flutuações e parece ter um mercado menos homogéneo que alguns dos outros mercados”, com prevalência da ficção 100% nacional. Juntamente com o documentário, tem claramente o peso da produção exclusivamente nacional.
Manuel José Damásio assume que os países são completamente diferentes em várias vocações; por exemplo, “a Irlanda, com uma orientação muito maior à exportação e a esquemas de investimento alternativo; a Dinamarca com uma orientação muito grande às audiências domésticas e a modelos públicos de apoio”. Logo, consoante os mercados, olha-se "para estes mercados tentando estabelecer onde é que eles se situam". "Temos aqui exemplos que nos mostram como para cada um desses mercados, nós podemos trabalhar estudos de caso.”
Damásio referiu o caso da Lituânia, “um país que tem tido tradicionalmente alguma dificuldade em chegar a audiências domésticas, mas que de repente, com um projeto que é este projeto que se chama stand-me chronicles, conseguiu os números absolutamente fabulosos de resultados junto das audiências internas”. Trata-se, referiu Damásio (que entrou na cerimónia por videoconferência, uma vez que se encontrava na Bulgária), de um país que “tem uma orientação muito grande a serviço e que conseguiu através de da consolidação dessa política de orientação a serviços, ter impacto em termos, por exemplo, da criação”. Ou seja, países diferentes com orientações diversas: “Obviamente isso significa que diferentes mercados podem ter diferentes orientações, mas também significa que nós não consideramos que nenhum mercado tenha uma orientação exclusiva.” Por exemplo, a Dinamarca tem “uma orientação muito grande às audiências domésticas e a modelos públicos de apoio”. A isto, não será alheio o desenvolvimento económico do país. Dos países estudados, é o que tem melhores audiências domésticas e é o que produz mais filmes. Portugal está “abaixo desses níveis de produção”. Portugal destacou-se em 2022 na produção do género drama, apesar de ser o país onde o financiamento público é menor.
A colaboração da NOS com a Universidade Lusófona integra ainda a atribuição de um prémio, no valor de 2500 euros, a uma curta-metragem que terá estreia em sala de cinema.
‘O cinema português daqui a 10 anos’ foi o tema central da edição deste ano, que convida à reflexão sobre os desafios, estratégias e oportunidades para fortalecer a visibilidade e o impacto do cinema nacional na próxima década, com um debate que contou com gente da empresa de audiovisual, Elsa Mendes do Plano Nacional de Cinema e os realizadores Ruben Alves e Bernardo Lopes.