Luís Quintais vence vigésima edição do Correntes D'Escritas com "A Noite Imóvel"
"A Noite Imóvel" recebe o Prémio Literário Casino da Póvoa 2019. Marcelo Rebelo de Sousa marcou presença no anúncio do grande vencedor do festival literário, na Póvoa de Varzim.
Corpo do artigo
"Que lugar? Sobes o lance de escadas próximo. Frio. E ao cimo das escadas deparas-te com o estreito corredor que dá para uma sala onde a luz explode através das portadas abertas de par em par. Essa luz intensa, essa luz deflagrante é já uma promessa de cegueira, o casulo onde a noite se esconde. A noite servir-te-á de pretexto para tudo o que vieres a dizer. Aí ficarás, suspenso de tempo e memória." Assim reza a sinopse de "A Noite Imóvel", o livro que recebe o Prémio Literário Casino da Póvoa 2019. O júri decidiu, por maioria, premiar a "qualidade da escrita, a coerência das propostas e a exemplaridade dos conceitos".
Luís Quintais tem 50 anos. Nasceu em 1968 em Angola. É antropólogo, poeta e ensaísta.
TSF\audio\2019\02\noticias\19\ricardo_alexandre_perfil_luis_quintais_longa
"Nasci em Angola, quando Angola 'era nossa' (que horror!). Cresci e estudei em Lisboa. Em 1995 parti para Coimbra para lecionar, onde permaneço."
Leciona no Departamento de Antropologia da Universidade de Coimbra. Professor em cursos sobre culturas visuais, literatura e antropologia, antropologia médica e antropologia cognitiva.
Quintais desenvolveu etnografia sobre guerra e memória traumática com ex-combatentes das guerras coloniais portuguesas e também investigação no arquivo da psiquiatria forense portuguesa.
"Como antropólogo prefiro as fronteiras, os espaços que teimam em persistir entre culturas, os interstícios, os híbridos, as ontologias fluidas, as anomalias".
Tem publicado ensaios em diversas revistas da especialidade sobre as implicações sociais e culturais do conhecimento biomédico, em particular sobre a psiquiatria. Desenvolve atualmente investigação sobre as interações entre biotecnologias, arte e cognição.
Com orgulho em ser um discípulo de Wallace Stevens, que traduziu como poeta, publicou pela primeira vez em 1995, A Imprecisa Melancolia (1995), depois Lamento (1999) e Umbria (1999), Verso Antigo (2001), Angst (2002), e Duelo (2004), obra com a qual ganhou o Prémio Pen Clube de Poesia e o Prémio Luís Miguel Nava - Poesia 2005. A coletânea de poesia completa Arrancar Penas a Um Canto de Cisne venceu o Grande Prémio de Poesia Teixeira de Pascoaes APE/C.M. de Amarante 2015-2016. Suspeita que nunca escreverá qualquer romance.
Começou a tirar fotografias porque muitos dos poemas e muitos dos ensaios que escreve são "sobre o «ver»". Usa as imagens "como um arquivo de traços" que o ver vai "deixando na paisagem. Raramente fotografava pessoas".
Na fotografia, na antropologia, na poesia, "a mesma vontade de pensar a biografia através de indícios, sombras, ruínas; a mesma vontade de interrogar a fragilidade, a violência, a memória e a morte".
Vive em Coimbra num bairro cheio de gente envelhecida e cheio de gatos. Diz que gosta de velhos e de gatos.
Ouve música de Bach a Monteverdi, de Handel a John Coltrane e Chet Baker, mas também Ornette Coleman, Brian Eno, Durutti Column, David Sylvian, Sparklehorse e muito blues.
Gosto de cinema. "De Vertov, de Chaplin, de Tati, de Godard, de Tarkovsky, e, sim, de Chris Marker. E muitíssimo de cinema japonês: Ozu, Mizoguchi, Kurosawa e Kobayashi, entre outros". Suspeita que "é no Japão que estiveram, talvez ainda estejam, os mais importantes artistas visuais".
Diz-se um homem de esquerda, mas sem ênfase. A sensibilidade trágica que carrega não lhe permite converter-se a muitos dos entusiasmos políticos.
Estruturalmente agnóstico, acredita mais na redenção do que na revolução. E afirma: a redenção será poética ou não será!