António Tadeia e a história de Ruben Amorim: do 3x4x3, à vulnerabilidade pública e o dia por explicar no Seixal

Ruben Amorim
Adam Vaughan/EPA (arquivo)
Na TSF, o autor de "Mister Amorim - A história do treinador que não quis ser igual aos outros" (da editora Manuscrito) revela alguns pormenores sobre a carreira do técnico português. Ruben Amorim chegou a Manchester há um ano, com estreia pelo Manchester United a 24 de novembro de 2024
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Nem Guardiola, nem Mourinho. O autor de "Mister Amorim - A história do treinador que não quis ser igual aos outros" mostra um caminho diferente percorrido pelo antigo jogador profissional, no trajeto até se tornar treinador de futebol e campeão pelo Sporting. António Tadeia começa por explicar à TSF que aspeto afasta Amorim da separação - que já se tornou um clássico, um pouco como Bilardo/Menotti noutros tempos - entre Pep Guardiola e José Mourinho. O autor lembra que Amorim nunca se mostrou obcecado pelo jogo no convívio com quem lhe era próximo, e daí que poucos lhe antecipassem um futuro como técnico.
"Quanto à personalidade ou ao modelo de liderança, acredito que tanto Mourinho como Guardiola são muito obsessivos. Não vejo o Ruben dessa forma", explica o autor do livro.
António Tadeia falou com alguns dos amigos e antigos companheiros de Amorim, como Filipe Çelikkaya, antigo companheiro de Amorim no Belenenses, que começou ainda antes de Ruben Amorim a preparar-se para treinar. Nas conversas entre antigos companheiros, mantidas muitas vezes à mesa, em convívios onde se juntavam Çelikkaya ou Amorim, Ruben não revelava o mesmo nível de obsessão com o jogo.
Mas o autor lembra a relação próxima entre Ruben Amorim e José Mourinho no início da formação do técnico. "O Ruben fez uma pós-graduação que era patrocinada pelo Mourinho, algo que foi muito importante na formação dele como líder e como treinador, e depois, tendo sido um dos melhores alunos desta pós-graduação, foi convidado a estagiar com José Mourinho no Manchester United". Talvez tenha nascido aí o interesse em orientar um dia os Red Devils, sendo certo que o "aluno estrela" de Mourinho terá encontrado nessa experiência alguma "orientação futebolística".
"Tudo aquilo que Amorim foi construindo como modelo de jogo teve sempre muito mais que ver com o ideário mourinhista do que guardiolista", considera António Tadeia, mas essa comparação resume-se ao jogo jogado.
"Não se pode ser aquilo que não se é. O José Mourinho é um tipo confiante e que extravasa confiança e, muitas vezes, se supervaloriza. É dessa forma que se impõe como alguém que está num outro patamar, que está um pouco acima, tanto com jornalistas como com jogadores, alguém inacessível", considera António Tadeia. "O Ruben, sendo um tipo divertido - Mourinho também era, em particular no início - percebeu na construção da relação com os jornalistas que, vulnerabilizando-se, consegue tirar mais da relação que estabelece, tanto dentro do balneário como fora do balneário."
Há nesta vulnerabilidade pública uma característica única revelada pelo treinador. Mas há outros aspetos do perfil do treinador que surgiram cedo na carreira, na primeira e marcante experiência. "Teve no Casa Pia a dureza de ter como pupilos jogadores que tinham sido colegas dele de longa data. Falo de Bruno Simão, Tiago Santos e Evandro Roncatto. A disparidade de tratamento entre o Bruno Simão e o Tiago Santos é um bom exemplo. Ele não tratava melhor o Bruno Simão do que tratava o Tiago Santos, aliás, o Tiago Santos era amigo da família, havia relações familiares, mas Bruno Simão era alguém que encaixava no onze e na equipa do Casa Pia, ao contrário do Tiago Santos. E mesmo sendo Tiago Santos um dos melhores amigos de Ruben Amorim, um amigo de infância, e tendo até sido o Ruben a querer que ele fosse para o Casa Pia, Tiago Santos raramente jogava".
Terá sido no Casa Pia que surgiu a proximidade de Ruben Amorim ao modelo (pelo menos em fase estática) 3x4x3 como abordagem primeira ao jogo e à construção da equipa. Mas Ruben Amorim não começou a carreira a jogar desta forma.
"Ao falar com antigos jogadores do Casa Pia não houve consenso. Todos eles tinham uma ideia sobre o jogo em que foi feita a alteração, mas havia várias versões da história. Teve de ser o próprio Rúben a esclarecer, eu perguntei-lhe, mas ele também já não se lembrava muito bem. Chegamos à conclusão que terá sido num jogo da taça. Mas o mais importante das equipas do Amorim não é a organização estática, até porque, na ponta final da carreira no Sporting, a equipa já defendia em 4x2x4 e depois em 4x4x2, e só mesmo quando era forçada defendia no 5x2x3. A atacar era sempre um 3x2x5 e muitas vezes um 3x1x6, com um dos médios na linha da frente".
Se Amorim mudou de um jogo para outro esse modelo, António Tadeia entende como improvável que o técnico volte a mudar de ideias num ápice. "Aquilo que me parece é que, para o modelo de jogo que quer para as equipas - e já com muitos anos de experiência nesta organização estática - ele assumiu que aquele era o melhor ponto de partida. Eu acredito que os treinadores são os proativos, que partem de uma ideia para o desempenho. Ele acha que é a melhor maneira de organizar as equipas, tanto nos momentos de organização estática como para preparar a equipa para a transição ofensiva ou defensiva".
Neste livro, o autor recorda o dia em que Ruben Amorim foi até ao Seixal negociar um lugar na estrutura encarnada, depois da passagem pelo Casa Pia. Sobre dúvidas e versões contraditórias. Luís Filipe Vieira mantém neste livro a versão que já afirmou publicamente, que queria fazer de Ruben Amorim um novo Rui Vitória, um técnico que queria ter por perto, lançar na estrutura e fazer dele, um dia, o treinador principal das águias.
"Ele diz que sim, (Vieira). Esse é um dos dias mais conturbados da carreira do Ruben Amorim, o dia em que foi ao Seixal falar com o Pedro Mil Homens para integrar a estrutura do Benfica e acabou por se ir embora sem falar sequer com Luís Filipe Vieira. Eu acho que Amorim percebeu que aquele não era o sítio ideal para começar. Mas é um dia que ninguém explica com total transparência. Luís Filipe Vieira diz que sim, que queria que o Ruben entrasse no futebol por ali, para ser o treinador do Benfica a breve prazo. Houve pessoas no Benfica que dizem que, quando deram por ele, já estava em Braga. A questão que ninguém esclarece se quando saí do Benfica já tem o Braga? Mas então porque ainda vai para o Estoril? Ou vai para o Estoril porque está à espera para ir para o Braga?".
O caminho de Ruben Amorim passou por Braga onde começou pela equipa B. Em "Mister Amorim, a história do treinador que não quis ser igual aos outros", o autor António Tadeia visita ainda outros períodos do percurso profissional do treinador, das conquistas pelo Sporting à carreira como jogador profissional.