Caro Benfica, seja bem vindo à Mata encantada onde também mora uma equipa invicta
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Tal como o Benfica, o Caldas SC ainda não perdeu esta temporada. Na memória de grande parte do plantel ainda está a epopeia na Taça de Portugal de 2017/2018, quando a equipa perdeu apenas nas meias-finais, diante do Aves. Faltou jogar com um dos grandes do futebol português.
Para receber o Benfica há também uma novidade no Campo da Mata, um cuidado especial por parte do Caldas Sport Clube. Um novo relvado instalado em contrarrelógio, colocado a uma segunda-feira, antes do primeiro treino da semana, à vista de todos, sócios, jogadores, equipa técnica. A cinco dias de receber o líder invicto da 1ª liga, os jogadores sabem que, até à hora do jogo, a um sábado à noite, ninguém pode pisar aquele relvado. Mas se é esse o preço a pagar, então está tudo bem, garante o defesa/médio Diogo Clemente.
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"Lembro-me que o clube fez um grande esforço para que os jogos se realizem aqui na mata em 2018, tal como está a acontecer hoje para podermos receber o Benfica. Enquanto jogador, isso é muito gratificante", explica Diogo Clemente, lateral esquerdo ou médio, um dos jogadores presentes na caminhada histórica do clube - então no Campeonato de Portugal - na Taça de Portugal de 2017/2018. Um percurso que só terminou nas meias-finais.
Desde então, os muros que cercam as bancadas do Campo da Mata estão pintados de branco, as bancadas de negro, ladeadas por faixas amarelas. São as cores que o estádio do Caldas Sport Clube assumiu antes dos jogos decisivos nas Caldas da Rainha, depois de eliminar Académica de Coimbra, Farense e Arouca a jogar no estádio a que chamam, "mata encantada".
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Nove jogadores continuam ao serviço do clube. O treinador é o mesmo, tal como o presidente e a maioria da direção. "Ainda hoje me arrepio ao falar disso. É, sem dúvida, a melhor memória que tenho do futebol". Diogo Clemente deixou o Caldas após essa temporada [aventuras na UD Oliveirense, Arouca e Estrela da Amadora], mas regressou à cidade e ao clube alvinegro.
"Sabemos que na mata tudo pode acontecer. Esta é a mata encantada, com o nosso público, as bancadas cheias, muito público a tentar ver o jogo, nem que seja em cima das árvores, como já vimos noutros momentos. Vamos tentar voltar a fazer história nesta cidade e neste estádio mágico", acredita Diogo Clemente. Um cenário a repetir, desta vez contra o Benfica.
Um grande nas Caldas da Rainha, finalmente
Paulo Inácio tem 39 anos, os últimos nove da carreira passados ao serviço do Caldas SC. Vibrou como um jovem com o sorteio da Taça de Portugal e com as sortes do clube. "Ao assistir ao sorteio, claro que as memórias daquele ano nos vieram à cabeça. Pensávamos que era algo que já não se ia repetir. Casa cheia, com certeza. Vai ser mais uma noite mágica".
"Continuam cá nove jogadores desde aquela temporada das meias-finais. Este é um clube que trata bem os atletas, isso é importante", resume o médio. "Nesta altura, o jogador que vem para o Caldas fala desse percurso".
Para o jogo com o Benfica, há uma expectativa controlada. "Esperemos que aconteça taça. Mas, sobretudo, esperamos que a malta das Caldas se divirta. Há muitos anos que não jogava aqui um dos grandes do futebol português. "Também sabemos que nos anos 50 o Benfica já perdeu aqui, alguns de nós já fizemos umas pesquisas (risos)", lembra Paulo Inácio.
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Em 1958, o Caldas jogava na 1ª divisão do futebol português e recebeu o Benfica no Campo da Mata. Uma vitória por 3-2, num jogo onde esteve a perder por 2-0. Um capítulo dourado da história do clube da cidade. "Já sabia dessa história, que o Caldas já tinha ganho uma vez ao Benfica", lembra o atual capitão, Thomas Militão, defesa central.
Militão está no Caldas Sport Clube desde 2001. Com 30 anos, é agora o capitão de equipa. "É um sonho. Quando era miúdo, lembro-me que o Benfica veio jogar na pré-temporada com o Caldas, aqui na mata. Eu entrei de mão dada com um jogador do clube. Lembro-me que, na altura, entre colegas brincávamos, "um dia havemos de jogar aqui com o Benfica"".
Ao olhar para o relvado, Thomas assume a ambição do balneário. "Não nos vamos acanhar, vamos fazer o nosso jogo", garante. "Sou o único da minha geração (1992) que aqui continua. Para mim significa muito, não só entrar com a braçadeira em campo, mas sobretudo poder receber, aqui nas Caldas, um clube desta dimensão".
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Um choque de realidade, com vídeos para ver noite dentro
José Vala tem 50 anos. Está há sete anos na liderança da equipa principal. Já antes havia passado pelo Caldas, como jogador, treinador e técnico-adjunto. "Sonhamos com a possibilidade de ganhar ao Benfica, é verdade. Sonhar não paga imposto. O nosso trabalho centra-se nessa pequena percentagem de possibilidades", garante.
Professor de educação física, José Vala trabalha para o município vizinho de Óbidos. Como ele, toda a equipa técnica, seis pessoas, têm outras profissões para além do futebol. Esta é também a condição da esmagadora maioria dos jogadores do plantel da equipa que lidera a zona sul da Liga 3.
"Somos uma equipa técnica amadora. Estou a chegar a estas horas (18h33, menos de meia hora antes do treino) porque venho do meu trabalho. Esta semana a equipa técnica teve de fazer a primeira reunião online, através da Dropbox. Preparamos a semana assim. Quanto ao adversário, já está em análise", explica José Vala.
O técnico recebe a TSF na sua sala de trabalho, ao lado do balneário. É segunda-feira, faltam cinco dias para o jogo. É preciso fechar a porta para que o ruído das máquinas que colocam o novo relvado não se intrometa na conversa. "No meu trabalho, tenho um seminário enorme para organizar esta semana, tenho estado muito preocupado com isso. Mas agora, à noite, quando sair do treino, vou ver a análise do adversário. Ainda tenho de ir ver o que o Rui Oliveira [técnico adjunto] descobriu do adversário (risos)".
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"Mudou muita coisa. Desde logo a programação dos treinos, estivemos uma semana inteira sem poder ir ao relvado, a treinar em sintético, no campo aqui ao lado, treinar apenas em meio campo". José Vala e os jogadores têm de atravessar a estrada e passar para o sintético da Quinta da Boneca, campo de treino e jogo dos escalões de formação do clube. E como os horários de treino estão limitados ao início da noite, a equipa principal divide o relvado, durante os treinos, com a formação.
Sobre o adversário sobram adjetivos já gastos por muitos adversários. José Vala simplifica. "Não só é o primeiro classificado mas também o conjunto em melhor forma em Portugal", comenta sobre o Benfica. "Esperamos um Benfica muito pressionante, a tentar ganhar a bola alto. Mas houve um lance do jogo com o Rio Ave em que saíram muito bem da pressão e chegaram ao golo. Não sei se vamos ter a capacidade para arriscar tanto. Mas nós podemos perder o jogo, mas se perdermos, vai ser jogando o nosso jogo. Uma equipa que quando tem bola gosta de jogar com ela, mas também é capaz de sair para as transições".
Não é difícil motivar os jogadores nesta semana. Muitos ainda se recordam das enchentes no Campo da Mata em 2018. "Grande parte do grupo lembra-se daquilo que se passou em 2017/2018. Foram os melhores momentos que já passamos no futebol. Para além de recordar esses momentos, vamos poder desfrutar do jogo".
