Ex-secretária de Estado considera beijo de Rubiales um alerta para Portugal incluir crime de assédio sexual
A ex-governante e atual investigadora da Universidade de Coimbra Rosa Monteiro destaca, em declarações à TSF, que o problema em Portugal continua a ser a falta de "mecanismos suficientes" para oferecerem "uma resposta eficaz a estas situações".
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A ex-secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade Rosa Monteiro defendeu esta terça-feira que o polémico beijo de Luis Rubiales a Jenni Hermoso, durante os festejos do Mundial de futebol feminino, é só mais um alerta para a necessidade de reforçar o Código Penal português e, desde logo, incluir o crime de assédio sexual.
"Não temos ainda um crime tipificado como assédio sexual. Ainda este ano foi chumbado, na Assembleia da República, a proposta para ser efetivamente criado o crime de assédio sexual. Há entendimento de uma corrente penal, que não tem sido propriamente muito favorável para as vítimas de qualquer forma de violência no nosso país", afirma, em declarações à TSF.
A investigadora da Universidade de Coimbra, que destaca a existência do artigo 170.º do Código Penal, que prevê o crime de importunação sexual, considera que este é limitado e avança que existem várias instituições internacionais que concordam com esta premissa.
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"O Conselho da Europa tem alertado, tem feito recomendações ao nosso país e a quem legisla - à Assembleia da República, neste caso - que deve ser criado e amplificado aquilo que está previsto", explica.
Se a atitude de Luis Rubiales fosse replicada em solo português, Rosa Monteiro sublinha que a Federação Portuguesa de Futebol tem, desde o ano passado, um regulamento disciplinar que atua perante situações semelhantes, alertando, contudo, que o problema em Portugal continua a estar na resposta.
"Continuamos a ter uma resistência muito grande e muito considerável em reconhecer aquilo que são inclusivamente comportamentos previstos na legislação, na regulamentação e em instrumentos internacionais, dos quais os nossos Estados estão veiculados, portanto, continuamos também a não ter os mecanismos suficientes para uma resposta eficaz a estas situações", lamenta.
A antiga secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade explica que para esta situação contribui também o facto de ainda se continuar a suspeitar das vítimas, o que faz com que estas não se sintam confortáveis para fazer uma denúncia.
"Há muito medo, muito receio por parte das vítimas de apresentarem denúncias, mesmo quando existem, esses mecanismos nas entidades empregadoras - imagino quando não existem. Tem havido um avanço no sentido de reconhecer que tem de se criar estruturas e culturas que sejam protetoras das vítimas", defende.
Sobre o comportamento do líder da Real Federação Espanhola de Futebol, Rosa Monteiro considera que foi inaceitável e revelador de um problema nas instituições.
"Foi este machismo e sexismo estrutural, é qualquer coisa que está entranhado no funcionamento das instituições, nós sabemos e compreendemos que são comportamentos que tradicionalmente eram desvalorizados, neste momento não são", realça, afirmando que, por isso mesmo, se exige uma atitude diferente a todos aqueles que estão à frente de instituições.
"Quem está nas lideranças das instituições, sejam elas políticas, sejam elas o que forem, tem de ter uma voz muito firme no estabelecimento daquilo que é certo, daquilo que é o correto, de acordo com os quadros morais e legais", atira, afirmando que esta resposta é essencial para evitar casos que retiram dignidade às mulheres, além de legitimarem a violência e o assédio.