Futebol na Polónia "é muito físico", mas Sá Pinto aposta na tática para vencer a liga

Facebook/Legia Waszawa
Em conversa com a TSF, o treinador português admite que foi um risco ir treinar para a Polónia e que não compreende a cultura do futebol polaco.
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Ricardo Sá Pinto está na Polónia "para ganhar títulos". Após passagens pela Sérvia, Grécia, Arábia Saudita e Bélgica, o técnico de 46 anos escolheu o Legia de Varsóvia como quinta aventura no estrangeiro.
Foi oficializado em agosto do ano passado no campeão polaco, pegando numa equipa que ocupava o sexto lugar do campeonato e que "vivia um ambiente de desconfiança, descrença e desmotivante."
Cinco meses depois, os resultados estão à vista: o Legia de Varsóvia já trepou até ao segundo lugar e está apenas a três pontos do líder Lechia Gdansk. Tem presença garantida nos quartos-de-final da taça, e nos últimos 17 jogos conta apenas com... uma derrota.
Ao leme de um emblema histórico da Polónia, Ricardo Sá Pinto embarcou em Tróia para estagiar, com o objetivo de fugir ao inverno rigoroso que se sente em terras polacas e que obriga a uma pausa já habitual no campeonato.
Nesta entrevista à TSF, o antigo internacional português fala sobre a mudança da Bélgica (Standard Liège) para a Polónia, a vantagem de ter quatro portugueses no plantel - Luís Rocha, Cafú, André Martins e Salvador Agra (agora juntou-se Iuri Medeiros) -, a cultura polaca, o estágio em Tróia e oferece uma visão atual do futebol português.
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1 - Ricardo Sá Pinto, desde que pegou na equipa, o Legia subiu do sexto ao segundo lugar, estando nesta altura muito perto do líder Lechia Gdansk, e perdeu apenas 1 dos últimos 17 jogos. As coisas têm corrido bem...
Sim, é verdade. Cheguei numa altura muito difícil ao clube. Foi um risco, porque falamos de um clube que está habituado a ganhar e onde os adeptos não aceitam um empate nem uma derrota. O cenário era pouco positivo quando cheguei, por isso foi, um risco. Mas os treinadores têm de correr sempre riscos e o que eu queria para a minha carreira era treinar uma equipa que lutásse para ganhar títulos. Portanto escolhi o Legia de Varsóvia.
2 - Objetivo é ganhar o campeonato e a taça?
Sem dúvida nenhuma! São os dois grandes objetivos da nossa equipa.
3 - Com o campeonato na Polónia parado, escolheu Portugal para estagiar, mais concretamente Tróia. Imagino que a escolha tenha sido do Ricardo Sá Pinto?
Sim, aconselhei. Logicamente, conheço como ninguém o meu país e pareceu-me uma boa solução para trabalhar, tendo em conta que na Polónia, por esta altura, registam-se temperaturas negativas e neva constantemente, tornando-se impossível treinar. O mês de fevereiro vai ser difícil mas já vamos estar em competição, como tal vamos ter que nos adaptar. Eles já estagiaram em vários países mas em Portugal sabia que íamos encontrar excelentes condições. Treinámos na academia idealizada pelo José Mourinho que tem ótimas instalações, tivemos privacidade, encontrámos temperatura extraordinárias, fomos muito bem recebidos. Correu-nos muitíssimo bem este estágio e estou bastante satisfeito com a escolha.
4 - Conta com quatro portugueses no plantel: Luís Rocha, Cafú, André Martins e Salvador Agra. Considera isso um fator decisivo tendo em conta que o treinador é português?
Não acho decisivo. Já treinei em cinco países e nem todos tinham jogadores portugueses. No entanto, reconheço que é mais fácil principalmente pela cultura que têm do futebol português e do facto de se adaptarem mais rápido à minha ideia de jogo...
5 - O André Martins é um bom exemplo disso, não é? Treinou-o no Sporting e foi buscá-lo ao Olympiakos.
Sim, o André foi sempre um jogador que eu admirei e que sempre teve qualidade na sua relação com a bola, apesar de não ser muito forte fisicamente e intenso nas suas ações. É um jogador que consegue marcar a diferença no Légia e confio muito nele. Agora se é português ou não, para mim é mais fácil pelo facto de já entender bem o jogo, por ter a tal cultura tática portuguesa e por conhecer o meu método de trabalho. A realidade que eu encontrei na Polónia é muito analítica e focada na dimensão física. Os polacos trabalham com muito mais frequência a parte fisiológica do que propriamente a parte tática. Não entendo alguma cultura que existe na Polónia. É um futebol muito físico e de duelos, dão pouca importância ao lado mais estratégico...
6 - Acha que é por aí que marca a diferença, impondo a tal componente tática e transmitindo a tal cultura futebolística portuguesa?
Não sei se a minha forma de trabalhar e ver as coisas é a ideal ou não, mas o certo é que consegui equilibrar a equipa e obter resultados. Não quer dizer que esta seja a única forma até porque o Legia antes já obtiveram resultados. Cada treinador tem a sua forma de pensar o jogo e trabalhar. Este é a minha e felizmente tem dado resultados.
7 - E mais a nível pessoal, gosta de viver em Varsóvia? É fácil para um português adaptar-se à cultura polaca?
Para mim a adaptação foi muito fácil. Gosto de viver em Varsóvia, vivo no centro e estou pertíssimo de tudo. A cidade é segura, tem uma oferta a nível de restauração e hotelaria vasta e é uma cidade evoluída ao contrário do que muitas pessoas pensam. Surpreendeu-me pela evolução. Quanto ao clima, também ao contrário do que se diz, até foi aceitável. As pessoas não são tão efusivas como são os portugueses, mas são simpáticas e receberam-me bem.
8 - O Ricardo Sá Pinto iniciou a carreira em futebol sénior, como treinador principal, no Sporting. Para muitos treinadores chegar ao Sporting é o topo da carreira. No entanto, o Ricardo Sá Pinto começou logo lá. Quais são os pontos positivos e negativos que traz disso?
Eu fiz um trajeto seguro e sustentado. Acho que é importante os treinadores, quando iniciam as suas carreiras, passarem pela formação e serem treinadores adjuntos a um bom nível. Depois as oportunidades vão surgindo e eu comecei a carreira da forma como foi. Nos juniores do Sporting, juntamente com o Abel Ferreira, fomos campeões nacionais. Depois subi à equipa principal e recordo-me da vitória histórica sobre o Manchester City, uma equipa que na altura ganhou duas vezes ao FC Porto, que era o campeão nacional. Chegámos às meias-finais da Liga Europa e, por isso, considero que foi um trajeto muito positivo.
9 - Tem acompanhado o futebol português?
Não tanto como eu gostaria. Tenho visto muito jogadores individualmente, uma vez que para o Legia o mercado português é um mercado alvo do clube. Contudo, logicamente que vou sabendo como está a classificação, que o Sporting ganhou a Taça da Liga e que vem aí um dérbi lisboeta.
10 - O campeonato está muito renhido, quem acredita que parte em vantagem para ganhar o título?
Ainda falta quase a segunda volta inteira, tudo pode acontecer, mesmo que seja o FC Porto a liderar o campeonato neste momento. Vemos um Sp. Braga, surpreendentemente ou não, a fazer uma grande época. Portanto, no meu ponto de vista, qualquer uma das quatro equipas (FC Porto, Benfica, Sp. Braga ou Sporting) ainda pode conquistar o campeonato.
11 - Trabalhou com Abel Ferreira no Sporting. Acredita que ele é o homem certo para levar o Sp. Braga ao título e que isso pode acontecer em breve?
Acredito que o Sp. Braga a cada ano que passa está cada vez mais próximo de ganhar o campeonato e o Abel Ferreira está muito bem posicionado para que isso aconteça. O Abel começou comigo nos juniores do Sporting, depois eu saí para a primeira equipa e ele ficou como treinador principal nos juniores iniciando a sua carreira. Estou muito contente com o percurso que ele fez, tem demonstrado grande competência e é um sério candidato a ganhar este ano o campeonato.
12- E o Ricardo Sá Pinto vê com bons olhos um regresso ao futebol português?
Sempre. Logicamente que sim.