O bloco de notas de José Peseiro para a fase a eliminar da Taça das Nações Africanas
O treinador português fala de uma prova apaixonante também para quem está sentado no banco de suplentes. Jogadores que se transformam, emoções à flor da pele. E dificuldades para conter o entusiasmo ofensivo e o impeto das equipas.
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José Peseiro confessa que está a concretizar um objetivo de carreira. A presença na Taça das Nações Africanas (CAN) com a Nigéria representa uma experiência particular no futebol. Ao telefone com a TSF, antes de mais uma dia de preparação para o primeiro jogo da fase a eliminar da prova, o técnico natural de Coruche revela algumas das preocupações que lhe preenchem o dia-a-dia. No plantel tem alguns dos mais destacados jogadores do continente africano, nomes como Vitor Oshimen (Nápoles), Ademola Lookman (Atalanta) ou Samuel Chukwueze (AC Milan).
“Tem sido uma experiência muito rica. Eu tinha o objetivo, a ambição, o sonho de fazer esta competição, de qualificar a Nigéria. É uma prova muito específica pelo contexto, pelo stress, pela pressão, até pela pureza do jogo. Os jogadores acabam por não repetir a forma de jogar europeia - é na Europa que estão os melhores jogadores africanos -, mas sim por aplicar uma outra forma de jogar, mais pura, mais aberta, na procura do ataque desmedido, dos contra-ataques. São jogos abertos, com equipas partidas e resultados que mudam em três ou quatro minutos, resolvidos muitas vezes nos últimos minutos do encontro”.
Um carrossel de emoções que se reflete para a Nigéria no segundo lugar do grupo, com vitória por 1-0 sofre Guiné-Bissau e Costa do Marfim (equipa da casa no torneio) e um empate 1-1 com a Guiné-Equatorial. O primeiro adversário na fase a eliminar para a Nigéria é a seleção dos Camarões, vencedora do troféu em cinco ocasiões, a última em 2017.
“Merecíamos ter vencido os três jogos. O primeiro foi até o encontro onde criamos mais situações de golo claro, mas desperdiçamos. Há que dar mérito à Guiné-Equatorial”, nota José Peseiro. “Somos uma equipa ofensiva, a formação com mais golos marcados na fase de qualificação, que faz sempre ou quase sempre golos nos jogos, que também desperdiça alguns”, faz notar sobre a forma de atuar da Nigéria.
Apenas dois dos jogadores da equipa da Nigéria atuam fora do futebol da UEFA. São dois guarda-redes. “Trabalhamos há mais de ano e meio com esta equipa e é evidente que há trabalho acumulado no que diz respeito à organização, não seria em três ou quatro dias que iríamos consolidar algo, isto se é que se pode consolidar uma processo numa seleção com pouco tempo para trabalhar”.
Ainda assim, há uma ideia clara que tenta transmitir aos atletas. Uma ideia que leva ao plano de jogo para defrontar os Camarões. “Vamos jogar um encontro histórico, com os Camarões, um jogo muito difícil mas também muito importante”, sublinha.
“Apostamos em potencializar uma forma de jogar mais consistente. Manter a matriz de ataque, mas acabamos por mudar de 4x3x3 para 3x4x3, como nos últimos dois jogos, em que procuramos preservar a eficácia e a consistência defensiva. Não é por acaso que o Senegal na última CAN [vencedor daquela edição] só fez um golo na fase inicial, não sofreu nenhum, fez cinco pontos e passou à fase final. Estes torneios curtos exigem a máxima concentração. O importante é manter a baliza sem sofrer golos e, na nossa forma de jogar, tentar fazer o golo e vencer”.
A seleção dos Camarões marcou golos em todos os jogos da fase de grupos. “Mas também sofreu”, lembra José Peseiro. “Ainda ontem estive a ver o terceiro jogo deles. É uma equipa de jogo mais aberto, que se lança com a pureza africana, com jogadores potentes, rápidos, nocivos e intensos. A minha equipa tem alguns jogadores que não são desse tipo. Também por isso escolhi uma forma de jogar que preserva a consistência. Alguns dos meus jogadores da frente - à excepção do Oshimen - são jogadores de ligações, que se gostam de associar, que querem ter a bola e controlar em posse. É preciso manter a forma de jogar, não deixar a nossa equipa partir. Há que estar compactos, coesos, quer estejamos no último terço ou a meio do nosso meio campo”.
José Peseiro imagina uma Nigéria capaz de perder a bola longe da baliza sem ceder à vertigem adversária. “Queremos, quando atacamos, ter um bom posicionamento final, ter a equipa junta para, de forma rápida, se compactar, e poder ganhar a segunda bola e manter as vagas de ataque. Ou, quando estamos mais baixos manter a equipa junta, compacta, sem permitir espaço entre jogadores, entrelinhas, controlar a profundidade. É isso o mais importante para vencer uma equipa como os Camarões, uma equipa que, em alguns momentos, faz do jogo uma vertigem constante. A nossa ideia, o nosso plano de jogo é atacar, ter bola, mas sem bola ser uma equipa compacta, que não concede espaços ao adversário.
A Nigéria enfrenta a seleção dos Camarões em Abidjan, Costa do Marfim, este sábado, 27 de janeiro às 20h00 no jogo dos oitavos de final da Taça das Nações Africanas.