RB Leipzig: o crescimento do tamanho da controvérsia de um dos maiores da Alemanha
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A curta história do RB Leipzig principiou há cerca de apenas uma década (2009) e com uma denominação algo complexa: SSV Markranstädt. Foi este o clube que originou um dos maiores clubes alemães da atualidade. Para que percebamos, porém, as raízes da história, teremos que recuar até ao final dos anos 80, mais concretamente a 1989, ano que marcou o princípio do fim do Muro de Berlim.
Com a reunificação da Alemanha, nada ficara como dantes. Duas realidades bem distintas se uniram. Uma Alemanha de Leste, conhecida por RDA (República Democrática Alemã), menos populosa e menos poderosa financeiramente e uma Alemanha Ocidental, RFA (República Federal Alemã), com mais estímulo e impulso e mais preparada para as exigências do mundo moderno.
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E essas diferenças fizeram sentir-se precisamente aquando da junção das duas Ligas existentes (visto que eram dois países diferentes) por intermédio da Bundesliga, campeonato germânico uno e indivisível. A cidade Leipzig, do lado do Leste, foi, obviamente, uma das "condenadas", tendo logo ganho forma o facto das equipas do Ocidente sobreporem-se às de Leste. Nessa altura, como agora, o poder do dinheiro fazia toda a diferença, estando no capital, por intermédio de fábricas, grandes empresas e indústrias o impulso fundamental para o crescimento de clubes como o Bayern de Munique, Eintracht Frankfurt, Werder Bremen, Borússia Dortmund e Bayer Leverkusen. O super campeão do leste Dynamo Dresden, para se ter uma ideia, encontra-se atualmente na última posição da 2.ª Divisão, nunca tendo tido expressão no contexto primodivisionário alemão, e o Magdeburgo um escalão abaixo, a lutar também pela sobrevivência.
Ainda hoje se fazem sentir as dificuldades dos clubes da antiga RDA no panorama futebolístico germânico, mas, por fim, a força do dinheiro ergueu um clube do leste, concretamente da cidade de Leipzig. Tudo começou com o facto do empresário austríaco Dietrich Mateschitz, cofundador da empresa de bebidas energéticas Red Bull, ter adquirido o modesto SSV Markranstädt, que, alguns anos depois, decidiu tudo alterar e do SSV Markranstädt praticamente nada restar. Nem símbolo, nem nome, tão-pouco cores. Mateschitz decidiu transpor a empresa para os relvados e, à proibição por parte da Bundesliga em denominar explicitamente Red Bull Leipzig, ficou o clube mascarado de RasenBallsport Leipzig, comummente denominado RB Leipzig.
E desengane-se quem julga que o império da Red Bull no futebol passa apenas pela cidade de Leipzig. O extinto Casino Salzburgo, na vizinha Áustria, deu lugar ao Red Bull Salzburgo, atual super campeão do país (e cidade) de Wolfgang Amadeus Mozart. Nos Estados Unidos, o New York Red Bulls é um dos grandes clubes a disputar a MLS e até no Brasil, por intermédio do Red Bull Bragantino, que acabou de ascender ao escalão máximo do futebol brasileiro.
O sucesso, esse, é proporcional ao tamanho do império da gigante das bebidas energéticas. No que toca ao RB Leipzig, num projeto, ainda que endinheirado, bem sustentado numa lógica empresarial e de scouting de topo, longe das loucuras dos cheques em branco dos xeiques das arábias, o clube germânico já é um dos gigantes do país, não obstante o seu curto historial. Entre os tubarões da Alemanha somente desde 2016/17, logo o RB disse, nessa primeira temporada, ao que vinha, com a obtenção de uma fabulosa 2.ª posição, só atrás do todo-poderoso Bayern.
Na temporada seguinte, um 6.º lugar, seguido, em 2018/19, do 3.º, sempre, por isso, em lugares cimeiros e de grande destaque. Esta temporada, para não fugir à regra, encontra-se o grande representante do leste alemão na 3.ª posição, a um ponto de Borússia Dortmund e cinco do Bayern, encontrando-se, pois, bem vivo na luta pelo cetro alemão.
No contexto europeu, o ano de estreia, e logo na Champions, não correu de feição, tendo os Die Bullen quedado-se pela 3.ª posição, num grupo onde militava o FC Porto e que acabou por culminar nos quartos-de-final da Liga Europa. Na presente, porém, o cenário é mais milionário. O RB Leipzig encontra-se, precisamente, prestes a defender a vantagem de uma bola a zero trazida de Londres, numa eliminatória a contar para os oitavos de final da Liga dos Campeões, diante do Tottenham liderado pelo icónico José Mourinho. A equipa, orientada pelo jovem técnico de 32 anos Julian Nagelsmann, onde pontificam jogadores como Timo Werner, Marcel Sabitzer, Dani Olmo, Konrad Leimer e Dayot Upamecano, todos eles na faixa dos 25 anos para baixo, poderá, assim, prosseguir uma epopeia inspiradora, numa espécie de "tenho em mim todos os sonhos do mundo", imortalizado por Fernando Pessoa, através de um dos seus heterónimos Álvaro de Campos.
As histórias de encantar, contudo, terão sempre os seus fantasmas e o RB Leipzig tem os seus. A rejeição da esmagadora maioria dos adeptos germânicos a magnatas e a clubes de vertente empresarial é de tal forma grande que a jornada 24 da Bundesliga ficou marcada por radicais protestos contra o RB Leipzig e o magnata Dietmar Hopp. Hopp que fez do Hoffenheim um clube sem expressão um clube de relevo nacional.
Indiferentes à hostilidade, derivado a essa inexistência de raízes populares de conservação dos valores do futebol, os adeptos do RB Leipzig sonham com o poderio germânico e, claro também, além-fronteiras. As perspetivas são tendencialmente altas. Um plantel com vitalidade, muito jovem, recheado de valor e grandes jogadores. Como tal, quem sabe se brevemente, a começar por hoje, na receção ao Tottenham, se comecem a cumprir esses tais "todos os sonhos do mundo".
André Rodrigues (A Economia do Golo)
Esta rubrica é uma parceria TSF e A Economia do Golo