Responsável pela transferência de Maradona lembra profecia: "Venci pelo meu povo, mas no próximo ano vou vencer pelos napolitanos"
À TSF, Pierpaolo Marino, antigo dirigente e conselheiro, conta pormenores da convivência com El Pibe e "a punhalada no coração" que sentiu quando soube da morte do ex-jogador argentino
Corpo do artigo
A estadia de Diego Armando Maradona no Barcelona estava a chegar ao fim e o mundo do futebol ansiava para saber o destino da estrela argentina. Atento à situação, Pierpaolo Marino montou uma estratégia para levá-lo para o Nápoles e, assim, nasceu um dos casamentos mais felizes da história do futebol entre um jogador e um clube. Em entrevista à TSF, o antigo dirigente explica a forma como liderou a transferência mais cara até àquela época.
Em 1984, El Pibe estava de saída da Catalunha, depois de "cortar relações" com a administração blaugrana, e Marino soube aproveitar a oportunidade. "Já conhecia muito bem o primeiro empresário dele, Jorge Cyterszpiller e, entretanto, obtive a informação por parte de um intermediário, Ricardo Fuica, que o Barcelona poderia vender o Maradona. A partir daí, usamos outro intermediário, o espanhol [José María] Minguella. Na altura, como eu era diretor do Avellino, já conhecia os dirigentes do Nápoles, António Juliano e [Corrado] Ferlaino, e então disse-lhes que se podia fazer esta transferência e apresentei a minha equipa de intermediários", detalha. O processo redundou num negócio avaliado em quase sete milhões de euros.
A administração dos napolitanos gostou tanto da visão de Marino que fez com que fosse trabalhar para o clube uma época mais tarde. Com apenas 30 anos, assumiu logo o cargo de diretor-desportivo e começou a florescer "uma relação ótima" com Maradona. "O Diego sabia que o tinha ajudado na transferência para o Nápoles e então apoiava-me muito. Eu era novo, de tal forma que existiam jogadores mais velhos do que eu, como o capitão, na altura, [Giusseppe] Bruscolotti. O Diego respeitava-me muito", revela.
Marino viu Maradona vencer o campeonato do mundo "praticamente sozinho" e festejou no balneário da Argentina
A proximidade entre os dois desenvolveu-se ao ponto de Maradona decidir levá-lo consigo para o Mundial do México, em 1986, além do fisioterapeuta do clube, Salvatore Carmando. O antigo dirigente recorda uma competição em que o génio da Argentina venceu "praticamente sozinho". O jogo dos quartos de final contra a Inglaterra, em que ultrapassou meia equipa adversária, ao "levar a bola da sua metade do campo até à baliza adversária", não lhe sai da cabeça.
No álbum de memórias de Marino reluzem também as palavras que Maradona lhe dirigiu após a vitória diante da Alemanha na final da prova. "Quando o abracei no balneário, ele estava com a taça no braço e disse-me: 'Diretor, agora venci pelo meu povo, mas, no próximo ano, vou vencer pelos napolitanos.' Foi um profeta porque, na época seguinte, ganhamos o campeonato e a Taça de Itália."
A notícia da morte dada por De Paul e o sonho 'irreal' de ter visto jogar Maradona: "Parece impossível alguém ter feito aquilo que Diego fazia em campo"
Depois da dobradinha, incluindo a conquista da primeira Serie A da história do clube, Maradona manteve-se no Nápoles, mas Pierpaolo Marino saiu para a Roma. Só regressou cerca de duas décadas depois, entre 2004 e 2009, para ser diretor-executivo.
Apesar de não terem voltado a trabalhar juntos, a amizade manteve-se, ao longo dos anos, até 25 de novembro de 2020, dia da morte do astro argentino. Na altura, Marino era diretor técnico da Udinese. "Soube da morte do Diego pouco tempo antes de um jogo da Taça de Itália contra a Fiorentina. Estava no túnel e o Rodrigo de Paul, argentino e capitão da Udinese, aproximou-se de mim a chorar, a dizer que não queria entrar em campo, e perguntou-me: 'Diretor, já soube da notícia do Diego?' Para mim, foi uma punhalada no coração. Depois nem olhei para o jogo. O meu pensamento estava só nele, no grande e imenso Diego", recorda.
Apesar de ter "trabalhado com grandes jogadores", Marino não tem dúvidas em classificar Maradona como "o melhor futebolista de sempre". "Diego era futebol. Às vezes, reflito sobre o azar de não poder tê-lo mais como amigo, de não poder vê-lo mais. Por outro lado, quase duvido se alguma vez existiu, se foi um sonho... porque parece impossível alguém ter feito aquilo que Diego fazia em campo", confessa.
Aos 70 anos, Marino está retirado do futebol. O antigo dirigente deixou a Udinese no final da época 2022/2023 devido a um problema de saúde.
