Tianna derrubou os muros que baralharam os caminhos entre o coração e a mente e deu a conhecer a sinuosa viagem até à medalha de bronze nos Mundiais de Atletismo, em Londres.
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Cheguei. Vi. Conquistei. A mim própria.
O ouro foi-lhe pendurado ao pescoço nos Jogos Olímpicos de 2012 e 2016. O mesmo ouro morou no mesmo cachaço de Tianna Bartoletta nos Mundiais de Atletismo de Helsínquia (2005) e Pequim (2015). Em Londres, em agosto de 2017, a norte-americana defendia o título mundial de salto em comprimento, mas a caminhada foi mais complicada do que era suposto, por isso apenas o bronze lhe sorriu. E ela sorriu para o bronze.
Bartoletta fugiu de casa há três meses. Saltou de quarto em quarto, na Holanda, onde treina. O casamento com John Bartoletta, um empresário norte-americano, mudou-a, levou-a a questionar-se e conduziu-a por um labirinto de pensamentos sombrios. "Eu sabia que defender o meu título seria difícil. Podem não acreditar, mas esta medalha de bronze é a medalha mais especial que alguma vez ganhei", garantiu no Instagram, horas depois da conquista.
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E explicou: "Porque há três meses tive de fugir da minha própria casa, tive de decidir quais os pertences que eram mais importantes, tive de deixar os meus cães, tinha pouco dinheiro. Ainda não tenho uma morada. Tudo para oferecer a mim própria a oportunidade de ter uma vida e o amor que mereço, que não envolvesse medo ou discussões, ameaças e abusos. (...) Arrisquei muito ao mandar a minha vida pelos ares num ano tão importante para a minha carreira. Mas era altura de ver que eu valia a pena. Valeu a pena. Obrigado por me acompanharem".
Em entrevista à BBC, Tianna derrubou os muros que baralharam os caminhos entre o coração e a mente e deu a conhecer a sinuosa viagem até então. "Não confiava em mim para tomar as melhores decisões. Perdi a minha personalidade, sinto que me tornei numa estranha para mim própria. Havia coisas que amava no início das quais me afastei. Perdi noção do que queria. Eu estava absorvida no que os outros queriam", explica.
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O sucesso na pista, apesar daquele turbilhão na vida pessoal, manteve-se e isso mascarou a situação. Enganou-a por uns tempos. Atrasou a decisão, a reação. "Ficou tão negro na última época que contemplei meter-me à frente de um comboio. Comecei a sentir que não havia outra maneira de fugir dos sentimentos de frustração e vergonha."
Bartoletta voltou a concentrar-se nos treinos, mesmo que a morada dos documentos já não falasse verdade. Também eles mentiam, tal como a sua mente lhe fez durante uns tempos. Agora que venceu a batalha interior, o que dizer a quem passa pelo mesmo?
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"O mais importante é: não estás sozinho. Tu sabes isso, mas não o sabes no teu coração", diz, admitindo também que foi difícil pedir ajuda. "Podes ser forte ou fraco e isso não é um reflexo de ti como pessoa. Não és menos porque não consegues sair [da situação]. É uma situação muito difícil, é complexa, confusa e é complicado para as pessoas que não a vivem perceberem. Mas gastem o tempo necessário a olhar para vocês no espelho e digam 'valho mais do que isto'.
Na quarta-feira, Tianna publicou uma frase inspiradora no Instagram: "Ela fez o estragado parecer bonito e o forte parecer invencível. Ela caminhou com o universo aos ombros e fê-lo parecer um par de asas". Agora Tianna Bartoletta vai descansar os ossos e gastar tempo a ver o seu reflexo na medalha de bronze, a tal que lhe fala verdade.
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