Vítor Serpa lembra José Manuel Constantino: "Mostrava grande preocupação quanto ao futuro do desporto em Portugal"
O antigo diretor do jornal desportivo A Bola ficou "muito impressionado" e até "perturbado" quando soube que José Manuel Constantino tinha morrido precisamente na hora em que se dava o encerramento dos Jogos
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Vítor Serpa, antigo diretor do jornal desportivo A Bola, recorda o último almoço com o presidente do Comité Olímpico Português, poucos dias antes de ele ter partido para Paris. "Eu fiquei com a sensação de que [os Jogos Olímpicos de] Paris era realmente o seu último projeto em vida, o estar em Paris, ir a estes Jogos Olímpicos era, para ele, provavelmente o ponto final", recorda Vítor Serpa. Em declarações à TSF, o jornalista diz que ficou "muito impressionado" e até "perturbado" quando soube que José Manuel Constantino tinha morrido precisamente na hora em que se dava o encerramento dos Jogos. "Pronto, deixou de viver, foi o encerramento da sua vida (...) tive essa sensação que quase estaria à espera do final dos Jogos para finalmente morrer."
No almoço que teve poucos dias antes do início dos Jogos Olímpicos, Vítor Serpa lembra um homem já muito debilitado, mas "com uma grande coragem física". "Nós conversamos um pouco e o José Manuel Constantino manifestava a sua grande preocupação em relação ao futuro do desporto em Portugal, não tanto pela ideia de que o desporto português precisa de mais dinheiro em cima dos seus problemas, mas porque precisava, sobretudo de uma outra visão política", recorda. "Essa é que era a grande luta, o grande desafio da sua vida, que o desporto ganhasse um estatuto de maioridade que não tem", salienta.
O ex-diretor do jornal desportivo A Bola conta que José Manuel Constantino defendia que o desporto "pudesse verdadeiramente fazer parte do projeto político nacional, não apenas nos momentos em que há medalhas e que os nossos governantes participam com selfies e com outras formas de estar e presenciar, elogiar, mas que depois não tem realmente correspondência para o futuro", critica.
Vítor Serpa lembra uma figura ímpar, "absolutamente fascinante do ponto de vista da qualidade do pensamento". "Eu acompanhei-o muitos anos, e ele foi decisivo na forma como ajudou a transformar a educação física em Portugal. Foi também decisivo depois nos cargos públicos que desempenhou, nomeadamente agora como Presidente do Comité Olímpico de Portugal, dando a precisamente ao Comité um estatuto, uma força, um poder que realmente não conhecia antes."
O jornalista, que escreveu em 2021 o livro sobre os Jogos Olímpicos "Os Jogos dos Deuses e do Diabo", lembra que José Manuel Constantino vibrava com as vitórias dos atletas, mas de uma maneira muito low-profile.
"Ele não era propriamente muito exuberante, nem nas vitórias, nem nas derrotas. Sorria muito quando as pessoas falavam quantas medalhas é que nós vamos ganhar agora, por exemplo, em Paris ou em Tóquio", recorda.
Uma medalha pode ter grande impacto do ponto de vista mediático, "mas depois verdadeiramente em relação aquilo que é o desenvolvimento e o crescimento do desporto e da ideia dos portugueses em relação ao desporto, isso às vezes não conta muito", lamenta.