Aumento de despedimentos coletivos é "sinal de alarme muito preocupante" para o Ano Novo
O alerta é deixado pelo economista, Filipe Grilo, professor da Porto Business School, a quem a TSF pediu um balanço de 2024 e perspetivas para 2025
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Desafiado pela TSF a definir 2024, Filipe Grilo, economista e professor da Porto Business School, considera que foi um ano de transformação. Apesar de reconhecer que, quando se olha para os dados gerais do PIB, com crescimentos previstos entre 1,6 e 1,7%, sente-se que é “poucochinho”, quando se observa setorialmente, pode haver um motivo para os portugueses celebrarem e outras razões para ficarem apreensivos.
Para celebrar, basta comparar o crescimento com os outros países do centro da Europa para perceber que Portugal está com um crescimento muito interessante e aqui, adianta o economista, “o turismo volta a ser o motor do crescimento económico". No entanto, olhando para outros setores, surge "alguma apreensão". Por isso, Filipe Grilo conclui que "transformação" é a palavra escolhida para definir 2024, uma vez que não tem a certeza se é uma mudança normal do tecido económico, em que alguns setores vão perdendo força e outros vão ganhando robustez, ou se, de facto, há uma crise mascarada que ainda não percebemos. Para o economista, estamos todos um pouco “embriagados” com os números do turismo.
Segundo o professor, se desagregarmos os dados por setores, ou por regiões, podemos começar a ver um Portugal cada vez mais desigual e cada vez mais dependente de certos setores, algo que pode ser problemático no futuro.
Filipe Grilo considera que o crescimento dos despedimentos coletivos é um "sinal de alarme muito preocupante", que deixa marcas em 2024, pois só em três meses, há registo de mais pessoas empurradas para o desemprego do que em todo o ano passado, que já teve valores relativamente altos no último trimestre. Se compararmos estes últimos três trimestres com o período homólogo do ano passado, o valor dispara, não só o número de processos de despedimentos coletivos, como o número de pessoas afetadas pelos mesmos.
“Quando nós olhamos para o número de pessoas despedidas é, de facto, assustador. O que significa que é um despedimento muito específico, ou seja, implica provavelmente o fecho de uma empresa grande (não na definição oficial, mas à nossa escala). No fundo, são certos setores, que nós já identificamos, que estão a ter muitos problemas e que obrigam as empresas a encerrar a atividade."
Entre os motivos para este tipo de crise, mais do que os problemas de produtividade, o economista acredita que estejam as relações comerciais com parceiros de Portugal, como a "Alemanha, em recessão, e a França, que vive uma crise política profunda com problemas nas contas públicas e que poderá trazer-nos problemas já em 2025".
Adianta ainda que estes parceiros comerciais estão mais ligados ao setor industrial e é por isso que começamos a ver dentro do nosso tecido económico um setor industrial em dificuldades, porque os nossos parceiros industriais clássicos também estão com bastantes dificuldades em segmentos, como, por exemplo, os automóveis e as suas repercussões, com mais uma fábrica de componentes a anunciar, esta semana, que ia fechar em Portugal. Filipe Grilo explica que há uma fileira muito dependente destes dois players e se não existe capacidade de aguentar mais uns meses, poderão ser forçados a fechar as portas.
Nas exportações, o professor considera que Portugal beneficiou do crescimento do turismo em Espanha e do aumento substancial de visitantes estrangeiros ao nosso país, em especial, norte-americanos que se destacaram pela primeira vez numa série de indicadores.
“É importante perceber que Espanha tem crescido por causa do turismo e nós estamos nesta relação de dependência do nosso vizinho espanhol e é importante analisar um dado novo. Há outro país que está a entrar por Portugal adentro e está a alavancar todo este setor, que são os EUA e os turistas norte-americanos. Este ano, pela primeira vez, ocuparam o primeiro lugar nas estadias nos hotéis em Lisboa. Isso permite diversificar os parceiros comerciais e robustecer a economia como um todo, porque já dependemos doutras dinâmicas que não a Europa."
O professor destaca ainda a Justiça como um dos principais problemas do país de longo prazo, que impacta o crescimento, até pela manutenção dos níveis elevados de burocracia em qualquer tipo de processo.
A curto prazo, aponta como problemas resolver o Serviço Nacional de Saúde e a habitação, embora realce que o problema da Saúde está inserido numa questão maior: a falta de literacia na gestão de recursos.
Quanto à habitação, Filipe Grilo considera que os sucessivos governos não têm conseguido resolver a crise e qualquer solução que propõem atrapalha na resolução do problema, mas considera que faltam incentivos ao setor da construção para haver casas acessíveis à classe média.
Mesmo perante este cenário, mostra-se otimista quanto ao ano de 2025. Apesar das tensões geopolíticas internacionais e do anunciado protecionismo da nova administração Trump, Filipe Grilo acredita que podem ser caminhos que representam uma oportunidade para as empresas portuguesas se afirmarem no mercado global.
Confrontado com o facto do BCE ter já admitido um potencial risco da dívida soberana na zona euro, num futuro próximo, quer crer que Portugal tem sido o bom aluno da Europa na consolidação das contas publicas e pode ser destino de refúgio dos investidores internacionais.
