Bancários manifestam-se por melhores salários após "lucros extraordinários" dos bancos
Dos cinco grandes bancos que operam em Portugal, já apresentaram as contas relativas a 2023 o Santander Totta, o Novo Banco e o BPI com crescimento dos lucros para 1.030 milhões de euros, 743 milhões de euros e 524 milhões de euros.
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Trabalhadores bancários protestam esta quinta-feira em Lisboa por aumentos salariais dignos após os lucros que apelidam de "extraordinários" dos bancos em 2023, numa ação concertada com os sindicatos de Espanha que protestam também esta quinta-feira em Madrid.
"Vivemos num mundo em que os problemas de portugueses são também dos espanhóis. (...) Temos muito capital espanhol nos nossos bancos e daí os embarcámos nesta luta", começa por explicar o presidente do Mais Sindicato, António Fonseca, em declarações à TSF.
A manifestação desta quinta-feira, pelas 14h00 frente à sede da Associação Portuguesa de Bancos (APB, em Lisboa), é convocada pelos sindicatos dos bancários ligados à UGT (Mais Sindicato, SBN e SBC) que, num comunicado conjunto, consideraram que é altura de dar "um grito uníssono de insatisfação e preocupação com as atuais condições laborais".
"O grande problema aqui é que a banca ao longo dos anos negociou connosco com base na taxa de inflação do ano anterior, que fechou em 4,3 e nunca com a inflação que está prevista para 2024. Há aqui dois pesos e duas medidas: quando interessa falar na taxa de inflação do ano anterior, fala-se do ano anterior, quando não interessa, fala-se na que virá a seguir e isso nós não podemos aceitar", explica António Fonseca.
Segundo os sindicatos, depois de durante o período difícil da troika e anos seguintes os bancários terem sido os "pilares fundamentais" do setor financeiro, hoje são "tratados como escravos da banca" apesar dos lucros históricos do setor, que beneficia do aumento das taxas de juro (que leva os bancos a cobrarem mais nos juros dos créditos enquanto os juros pagos nos depósitos sobem mais devagar).
"Os sindicatos e os trabalhadores ficam muito contentes que as empresas para quais trabalham tenham resultados positivos. Agora, parece-me que tem de existir um esforço por parte dos acionistas e dos bancários para reconhecer também esse trabalho dos trabalhadores", nota o presidente do Mais Sindicato, acrescentando que as taxas aumentaram e as comissões e os lucros não baixaram.
Dos cinco grandes bancos que operam em Portugal, já apresentaram as contas relativas a 2023 o Santander Totta, o Novo Banco e o BPI com crescimento dos lucros para 1.030 milhões de euros, 743 milhões de euros e 524 milhões de euros.
Caixa Geral de Depósitos (CGD, o banco público) e BCP ainda não apresentaram, mas os dados até setembro (a CGD lucrou 987 milhões de euros e o BCP 651 milhões de euros) permitem antever que 2023 deverá ultrapassar o recorde de 2007. Nesse ano, os cinco grandes bancos (Caixa Geral de Depósitos, BCP, Banco Espírito Santo, Santander Totta e Banco BPI) lucraram quase 2.900 milhões de euros.
"Enquanto os trabalhadores enfrentam condições precárias, os lucros extraordinários fluem para as mãos dos acionistas, muitos dos quais são estrangeiros", consideraram esta quarta-feira os sindicatos em comunicado, acrescentando que nos bancos se vive um ambiente de trabalho que sobrecarrega os trabalhadores que são cada vez menos (devido a reduções do quadro pessoal) e têm de fazer o trabalho exigido e muitas vezes sem receberem horas extraordinárias.
Para este ano, estes sindicatos reivindicam aumentos de 6% (enquanto os bancos que subscrevem o Acordo Coletivo de Trabalho do setor propõem 2%, o que os levou a apelidarem essa contraproposta de "miserável e indecorosa"), assim como mais progressões, criação de carreiras sólidas e que componentes remunerativas sejam incluídas no salário base.
Informalmente, segundos fontes do setor à Lusa, os bancos admitem que o valor de aumento fique acima de 2% mas não muito (em 2022 os bancos propunham aumentos de 4% e fecharam acordo nos 4,5%).
Para os sindicatos que hoje convocam a manifestação, os bancários não podem "aceitar ser tratados como simples peões num jogo onde o verdadeiro valor humano está a ser desconsiderado" e cabe aos bancos, mas também às autoridades reguladoras, compreender que salários e carreiras dignos são "essenciais para manter o setor bancário saudável e justo".
Os lucros da banca têm sido falados nesta pré-campanha eleitoral, mas sem dominar o debate. Nos seus programas eleitorais, entre outras propostas, o PCP quer a taxação extraordinária dos lucros da banca, a Iniciativa Liberal defende o fim do imposto adicional de solidariedade e a privatização da CGD e o Bloco de Esquerda quer que o banco público (CGD) intervenha para a banca baixar os juros no crédito à habitação.
Em debate esta terça-feira com o líder da líder da Aliança Democrática (coligação que integra PSD, CDS-PP e PPM), a líder do BE, Mariana Mortágua, propôs que a CGD baixe o 'spread' dos empréstimos em 1,5 pontos percentuais, o que levaria a poupar dinheiro às famílias (estimando que num empréstimo de 150 mil euros cada família pouparia 1.600 euros anuais) e criaria concorrência entre bancos.
A AD, o PS, o Chega e o PAN ainda não apresentaram os seus programas elitorais, o que vai acontecer nos próximos dias.
Também hoje decorre em Espanha manifestações de bancários (a principal decorre em Madrid a meio da manhã) convocada pelas confederações sindicais Comisiones Obreras, UGT e FINE).
O setor bancário espanhol teve em 2023 um ano de lucros recorde. Santander, BBVA, CaixaBank, Sabadell e Bankinter tiveram lucros conjuntos de 26.000 milhões de euros (a estação de rádio Cadena Ser diz que o valor é equivalente a toda o Produto Interno Bruto [PIB] das Astúrias durante todo um ano).
A negociação salarial em Espanha é plurianual, propondo os bancos aumentos salariais de 7% para todo o convénio coletivo 2024-2026, enquanto os trabalhadores pedem um mínimo de 17%.
Em Portugal há cerca de 40 mil bancários e em Espanha 140 mil.
Notícia atualizada às 08h30
