Coimbra dos tratores: comida, vontade e pernoita não são problema para quem quer ser ouvido
Agricultores vão reunir-se com a Direção Regional de Agricultura e Pescas e estão prontos para pernoitar numa das avenidas que dá acesso à baixa da cidade.
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A Avenida Fernão Magalhães, em Coimbra, é esta quinta-feira o destino de uma fila de tratores com pelo menos sete quilómetros que saíram de Montemor-o-Velho com a Direção Regional de Agricultura e Pescas (DRAP) como destino para entregar reivindicações.
Pelas 16h00 já tinham estacionado em quatro vias - duas em cada sentido - da avenida que liga a rotunda da Casa do Sal à baixa da cidade e, com um fogareiro, já se assava bifanas para fazer frente às próximas horas.
"Estamos prontos", garantiu um dos presentes à TSF, "queremos ver os nossos direitos serem os que verdadeiramente são". E se para isso tiverem de ficar "várias horas" em Coimbra, ficarão. Têm comida para "o almoço e para a noite" e não será por aí que terão "problemas".
José Pinto da Costa admite até que possam ficar ali, além desta noite, também "nos dias a seguir". Faz-se acompanhar de "um fogareiro, uma panela de febras e um cobertor", todos companheiros para ver no que é que vai dar a reunião com a DRAP.
Há quem tenha levado para Coimbra "reboques com cobertores", outros fazem-se acompanhar de tendas e também quem vá a casa, voltando na manhã desta sexta-feira, se for caso disso: "É uma questão de nos organizarmos, sendo certo que estamos preparados para nos mantermos firmes até termos algumas reivindicações resolvidas."
Quando saíram de Montemor, sabiam que não tinha "data de regresso" e que esta depende de algo que os faça "voltar a casa". Até lá, a luta mantém-se e espera por um "sinal de que há vontade política para de uma vez por todas resolver alguma situação".
Foram mais de 200 os tratores e máquinas agrícolas começaram a entrar na cidade às 14h00 e, pouco depois das 15h00, já bloqueavam por completo uma parte da artéria. Só uma hora depois é que a circulação automóvel foi permitida numa via em cada sentido da avenida.
Sofia Costa, jovem agricultora, integra o protesto. Conta à TSF que "nem sempre" é fácil viver da agricultura - no caso, do arroz.
"Gostamos do que fazemos e queremos ter condições e vontade para continuar", mas avisa que se um ano não correr bem, é preciso esperar pelo seguinte "e esperar melhoras".
Os custos de produção, lamenta, "não têm acompanhado a valorização do produto final" e Sofia Costa lamenta também a retirada de alguns produtos fitofármacos "devido a alterações da União Europa e que têm vindo a diminuir as opções de controlo de infestantes".
Espera que da reunião com a DRAP saia a perceção de que "os agricultores em Portugal e o setor precisam de atenção e que o Governo o tem esquecido", mas deixa também um apelo: "Valorizem o produto nacional, continuem a consumir nacional."
Os agricultores iniciaram o protesto cerca das 10h30, em Montemor-o-Velho, com uma marcha lenta a partir da Estrada Nacional (EN) 111 em direção à avenida Fernão Magalhães, na Baixa de Coimbra.
Sob muitas buzinadelas, as viaturas chegaram à baixa de Coimbra, onde a PSP já tinha reservado uma área para estacionamento, que não foi suficiente face à quantidade de tratores e máquinas agrícolas.
"A razão da inflação não está na produção", é uma das principais frases dos agricultores, que se queixam de várias situações.
A manifestação, aparentemente espontânea e não integrada na programação do protesto do Movimento Civil Agricultores de Portugal, que hoje decorre em vários pontos do país, partiu de um grupo de produtores agrícolas do Baixo Mondego, que se concentraram em Montemor-o-Velho, a cerca de 25 quilómetros de Coimbra.
O protesto decorre um dia depois de o Governo ter anunciado um pacote de mais de 400 milhões de euros, destinado a mitigar o impacto provocado pela seca e a reforçar o Plano Estratégico da Política Agrícola Comum (PEPAC).
Segundo um comunicado divulgado na quarta-feira, os agricultores reclamam o direito à alimentação adequada, condições justas e a valorização da atividade.
O movimento, que se apresenta como espontâneo e apartidário, garantiu que os agricultores portugueses estão preparados para "se defenderem do ataque permanente à sustentabilidade, à soberania alimentar e à vida rural".
