Concertação Social: patrões denunciam "falta de ambição", sindicatos avisam que novo programa "acentua dificuldades"
Em declarações à TSF, o secretário-geral da CGTP lamenta que esteja a ser criada uma "maior exploração no mundo do trabalho, uma maior desregulação dos horários de trabalho, maior precariedade e mais dificuldades". Já a Confederação Empresarial de Portugal pede um "sinal de mudança" ao Governo
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O Governo e os parceiros sociais reúnem-se esta quarta-feira em Concertação Social, formalizando a primeira reunião com o novo Executivo, que será presidida pelo primeiro-ministro, Luís Montenegro. A "falta de vontade" nos sucessivos ciclos governativos e as alterações à lei laboral, que "perpetuam e acentuam as dificuldades" dos trabalhadores, preocupam os parceiros sociais.
A agenda oficial da reunião indica que haverá intervenções das confederações empresariais e das centrais sindicais, bem como serão abordados "outros assuntos", além da apresentação de cumprimentos institucionais, sem detalhar um tema em concreto.
Esta será a primeira reunião dos parceiros sociais na Comissão Permanente de Concertação Social (CPCS) com o novo Governo, o segundo liderado por Luís Montenegro, e que contará também com a presença da ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Maria do Rosário Palma Ramalho, do ministro de Estado e das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento, do ministro da Economia e da Coesão Territorial, Manuel Castro Almeida, e do ministro da Agricultura e Mar, José Manuel Fernandes.
Em declarações à TSF, o secretário-geral da CGTP, Tiago Oliveira, garante que não vai perder a "oportunidade" para dizer ao primeiro-ministro tudo aquilo que os trabalhadores sentem "diariamente nas empresas e nos locais de trabalho". O sindicalista acredita que é "possível outro rumo para o país, responder aos interesses da maioria e responder aos interesses dos trabalhadores".
Sobre a revisão da lei laboral, Tiago Oliveira confessa estar preocupado: "Olhamos para aquilo que é o programa do Governo e [vemos] que é uma perpetuação e um acentuar de deste rumo de dificuldades." Nota ainda que em Portugal existem 1,3 milhões de trabalhadores com vínculos precários e lamenta que, em momento algum, as empresas se "responsabilizem por isto".
Critica igualmente que o Executivo tenha visto na possibilidade de voltar a dar a escolher aos trabalhadores se querem receber o subsídio de férias e de Natal em duodécimos ou da forma tradicional uma forma de contornar os baixos salários praticados no país.
Nenhum trabalhador que tivesse um salário digno, que lhe permitisse durante um mês pagar casa, pôr comida na mesa, pagar energia, pagar os estudos, pagar os combustíveis e ter uma vida desafogada que lhe permitisse o espaço de acesso à cultura, ao lazer e à família, recorreria ao pagamento do subsídio de férias e de subsídio de Natal em duodécimos.
O líder da CGTP acusa também o Governo de dar "cada vez mais argumentos" aos patrões para que seja criada uma "maior exploração no mundo do trabalho, uma maior desregulação dos horários de trabalho, maior precariedade e mais dificuldades".
Já o presidente da Confederação Empresarial de Portugal, Armindo Monteiro, espera que desta reunião possa sair um "sinal de mudança" e "vontade de convergir" para um compromisso do crescimento da economia.
"A nossa economia não tem crescido e esta reunião vai determinar muito a vontade dos parceiros sociais, que são o dínamo da sociedade civil, para mudar este estado de coisas. Não podemos assumir e aceitar este facto de não crescermos como uma fatalidade", explica.
Armindo Monteiro fala, então, numa "falta de ambição e vontade", argumentando que "todos os relatórios" concluem que Portugal cresce "sistematicamente abaixo do potencial".
Se crescemos abaixo do nosso potencial, quer dizer que não estamos a fazer tudo aquilo que podemos fazer para crescer mais. Portanto, se nós estamos a crescer, é por vontade própria. E essa convergência de vontades pode mudar isto.
A revisão da legislação laboral é um dos temas que deverá ser discutido em sede de Concertação Social, dado que o programa de Governo tem várias medidas nessa área e que o tema estava já previsto, mas a crise política adiou a discussão. No programa de Governo, o Executivo abriu a porta a dar "maior flexibilidade no gozo de férias por iniciativa do trabalhador", com a possibilidade de comprar de dias de férias, "com um limite a definir contratualmente entre as partes". Atualmente, o Código do Trabalho prevê que "o período anual de férias tem a duração mínima de 22 dias úteis", ainda que admita que no âmbito da negociação coletiva possam ser acrescentados dias. No âmbito de uma revisão da lei laboral, o Governo quer ainda "equilibrar de forma mais adequada" o direito à greve "com a satisfação de necessidades sociais impreteríveis". A alteração, que foi admitida pelo próprio primeiro-ministro na campanha eleitoral, no início de maio, tem suscitado críticas por parte dos sindicatos.
Entretanto, na fase inicial da apresentação do programa do XXV Governo Constitucional no Parlamento, Luís Montenegro afirmou que as mudanças na lei laboral que o Governo pretende introduzir visam assegurar “a possibilidade de haver serviços mínimos garantidos” e de “conciliar direitos”, “sem ofender” os trabalhadores.
Outras das várias mudanças que o Governo pretende introduzir diz respeito à possibilidade de os trabalhadores voltarem a poder escolher se querem receber os subsídios de férias e de Natal em duodécimos ou da forma tradicional, bem como "clarificar, desburocratizar e simplificar" vários regimes como o de parentalidade, teletrabalho, organização do tempo de trabalho, transmissão de estabelecimento, 'lay-off' e processo do trabalho.
Além da legislação laboral, o acordo tripartido de valorização salarial e crescimento económico 2025-2028, que foi assinado em outubro, previa a discussão de outras matérias em sede de Concertação Social, como a saúde e segurança no Trabalho, a formação profissional, a sustentabilidade da Segurança Social, a reorganização e modernização administrativa e o estatuto dos benefícios fiscais.
Em declarações à Lusa, as confederações patronais indicaram ainda que querem que temas como a modernização da economia e a imigração estejam na agenda da Concertação Social.
