"Desiludidos." Cenário de "sérias dificuldades" com aumento do preço dos combustíveis "preocupa" associações
A perda de competitividade das empresas portuguesas em relação a Espanha é um dos principais motivos de preocupação evidenciados no Fórum TSF
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Os portugueses podem contar novamente com o aumento substancial dos preços dos combustíveis a partir desta segunda-feira. Ouvidas no Fórum TSF, várias associações mostram-se "preocupadas" e "desiludidas" com a atuação do Governo de Luís Montenegro, que anunciou o descongelamento progressivo da taxa de carbono.
O gasóleo e a gasolina devem subir, em média, três cêntimos. O preço do gasóleo simples deverá ser de 1,70 euros por litro e o de gasolina deverá rondar os 1,80 euros. Estes valores já têm em conta os descontos aplicados pelas gasolineiras e a revisão das medidas fiscais temporárias para mitigar o aumento dos preços dos combustíveis, nomeadamente o descongelamento da taxa de carbono.
Ouvido no Fórum TSF, o diretor-geral da Associação Portuguesa das Empresas de Distribuição, Gonçalo Lobo Xavier, garante que não há alternativa para este cenário.
"A inflação não tem crescido tanto como nos outros anos porque, os custos dos alimentos e da energia não têm subido tanto, que são, sem dúvida, os dois principais segmentos que têm contribuído para o aumento da inflação. Agora, se temos aqui um elemento que vai pressionar os preços e que vai pressionar toda a cadeia, evidentemente que podemos esperar um aumento dos preços no fim da cadeia e teremos de ser nós a dar essas más notícias aos consumidores", assume.
As empresas de distribuição queixam-se, ainda assim, da elevada carga fiscal sobre os combustíveis e da decisão do Governo de descongelar a taxa de carbono. Gonçalo Lobo Xavier insiste que não existem "alternativas" para substituir as frotas de pesados que "ainda têm os combustíveis fósseis como o grande mentor, sobretudo em transportes logísticos de maior duração e de maior distância".
"O negócio da distribuição, seja ela alimentar ou não alimentar, é um negócio de eficiências, é um negócio de saber comprar bem, saber ter um bom entreposto, saber fazer colocar o produto nos espaços comerciais de uma forma eficiente e que seja, do ponto de vista do custo, o menos oneroso possível. Ora, evidentemente, a taxa de carbono tem um impacto grande em todo este processo", explica.
Também a Associação Nacional dos Transportadores Rodoviários em Automóveis Ligeiros (ANTRAL) assegura que este aumento prejudica quem trabalha com os táxis e defende a necessidade de distinguir aqueles que usam o carro para trabalhar e aqueles que usam o automóvel de forma particular. Florêncio Almeida pede por isso autorização ao Governo para aumentar as tarifas.
"Nós temos mais dificuldades nos transportes coletivos, porque tudo o que é outro transporte também pode imputar no seu cliente o aumento que vai sofrendo. Por vezes, não são fáceis essas negociações, mas têm essa liberdade. Táxis e transportes públicos não podem aumentar sem que o Governo queira negociar. Nós temos muito mais dificuldade em atualizarmos os nossos sistemas tarifários - porque é do interesse público - do que outras empresas quaisquer. Agora, para os táxis, quanto mais aumentar, mais penalizante é num setor que já há uns sete ou oito anos está a passar por sérias dificuldades e que naturalmente se vai agravar com o aumento do preço do combustível", destaca.
A vice-presidente da Associação Nacional de Revendedores de Combustíveis lamenta igualmente, no Fórum TSF, que o Governo não tenha dado ouvidos às preocupações da associação e alerta para o impacto do aumento da taxa de carbono, sem esconder a "desilusão" sentida perante a decisão do Executivo de Luís Montenegro.
"Tivemos, no início deste mês, no dia 3 de outubro, uma reunião na secretaria de Assuntos Fiscais, na secretaria de Estado. Levantamos estas questões todas, porque vemos que é muito importante e, qual não é o nosso espanto quando, passado pouco tempo da reunião que tivemos, vão fazer exatamente o contrário daquilo que nós tínhamos antecipadamente solicitado. Ficamos desiludidos, porque não foi tido em linha de conta aquilo que nós alertámos", confessa.
Mafalda Trigo sublinha ainda que, sempre que o gasóleo e a gasolina aumentam em Portugal, quem ganha são os espanhóis.
"Se realmente acontecer uma baixa dos impostos - o que aconteceu no início deste ano nem foi Portugal baixar os impostos -, foi Espanha que os subiu, mas ao ver esse diferencial, nós acabamos por ganhar. Por outro lado, é claro que Espanha, ao ver que teve essa perda de rentabilidade, não esteve quieta e acabou por voltar a baixar os impostos", denuncia, acrescentando que os "revendedores que estão junto às fronteiras estão praticamente parados".
Esta opinião é partilhada por Luís Mira, secretário-geral da Confederação dos Agricultores de Portugal, que alerta para as consequências do aumento dos preços dos combustíveis, nomeadamente, para o facto deste setor perder cada vez mais a sua competitividade para o país vizinho.
"Traz uma grande diferença entre Portugal e Espanha, um dos principais países com quem os produtos portugueses da agricultura portuguesa concorrem, e isso leva a que depois eles não sejam competitivos", evidencia.
Luís Mira aponta ainda que a energia mais utilizada na agricultura é o gasóleo, com uma percentagem a rondar os 70%, e lembra que "não há como fugir" a esta realidade.
"Eu não tenho alternativa, ainda não tenho tratores elétricos e, portanto, não consigo, enquanto atividade, procurar uma alternativa para compensar isso. Por outro lado, isso também impacta nos custos de transporte, o que nos torna menos competitivos. A nossa preocupação é a competitividade da agricultura portuguesa e, quando se voltam a colocar taxas que nos tornam mais diferentes, com custos maiores relativamente a outros países, isso preocupa-nos", insiste.
Já Acácio Pires, ativista ambiental e membro da associação Zero, fala numa "situação extremamente grave" e defende a necessidade de um "investimento sério na eletrificação do sistema de transportes".
"Isto é a lógica do mercado europeu de licenças de carbono. As licenças de emissão, que neste caso as grandes indústrias têm de comprar, são depois convertidas em investimento. No caso em Portugal, são todas adjudicadas ao fundo ambiental, que depois terá de investir essas verbas para obtermos resultados positivos em termos ambientais. Na lógica do ISP, do IUC e do ISV, nós temos de adotar um pouco esta lógica. Não tudo de uma vez, porque as retas são muito elevadas, mas pelo menos uma percentagem substancial dessas verbas. No ano passado, defendemos que deveria ser 10%, e, este ano, reforçamos um pouco, para 15% desses impostos", argumenta.
A continuação da subida desta taxa nos combustíveis e o aumento do imposto petrolífero fazem parte da proposta do Orçamento do Estado para 2025.
