O presidente da Câmara de Comércio e Indústria Portugal-Angola considera que, apesar da crise de Angola, as empresas portuguesas voltaram a pensar em investir no país.
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Os empresários portugueses estão a voltar a olhar para Angola como destino de investimento. O presidente da Câmara de Comércio e Indústria Portugal-Angola considera que já há sinais de uma recuperação da confiança no país.
"A economia é, sobretudo, a confiança dos investidores. E aquilo que estamos a começar a ver é que há um novo ciclo de confiança. E, normalmente, o ciclo de confiança antecede o ciclo dos resultados económicos e do retorno sobre o investimento", defende João Traça. "Começa a haver empresários de novo a olhar para Angola. Não é uma grande avalanche de investimento, ainda não estamos nesse momento. Mas já se começa a ver aqueles sinais que garantidamente vão dar novos investimentos".
João Traça sentiu-o, por exemplo, antes desta viagem do primeiro-ministro, com muitos contactos de empresários em Portugal interessados em integrar a comitiva e perceber se o investimento em Angola é viável. "Isso para mim quer dizer que o interesse está lá, a confiança está retomada e, com o tempo, as coisas vão acontecer".
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O "fantasma" do caso Manuel Vicente
Para o presidente da Câmara de Comércio e Indústria Portugal-Angola, a visita do primeiro-ministro a Angola é natural depois da eleição de um novo presidente. Não se trata de pôr um ponto final na polémica Manuel Vicente, defende João Traça, que acredita que visitas deste género são normais entre países "com uma economia tão interligada como Portugal e Angola".
Questionado sobre se as relações comerciais entre os dois países foram afetadas pelo caso Manuel Vicente, o representante da câmara rejeita a ideia. João Traça reconhece que houve um afastamento dos empresários portugueses em relação a Angola, mas por culpa da crise económica no país.
"Devido ao continuar da baixa do preço do petróleo e à sua conjuntura, a economia angolana vive uma crise (...). E essa sim é o principal fator do esmorecimento das relações [comerciais]. Houve uma redução da atratividade da economia angolana para com o empresariado português, ao mesmo tempo que a economia portuguesa ficou tão atraente para os empresários portugueses que, a certa altura, deixaram de olhar para fora. Apenas aqueles que tinham uma vocação verdadeiramente internacional continuaram a olhar para Angola", defende.
João Traça reconhece que os empresários em Angola encontraram vários entraves, com os problemas com pagamentos a empresas e trabalhadores com a falta de divisas. Uma questão que não afeta só os portugueses. "Não há qualquer tipo de problema com a economia portuguesa", garante.
Portugal vai deixar de ser o parceiro privilegiado?
O presidente da Câmara de Comércio e Indústria Portugal-Angola defende que vai ser preciso mais investimento externo para Angola sair da crise. "Umas vezes chama-se investimento externo, outras vezes linhas de apoio de financiamento internacional". Tal como Portugal, com o resgate da troika, lembra João Traça.
Para o representante, "estes acordos que o executivo angolano está a fazer com vários países em que está assegurar um conjunto de linhas de crédito vão permitir a existência do investimento estrangeiro".
João Lourenço tem visitado vários países na Europa para tentar captar novos investidores. Para o presidente da Câmara de Comércio e Indústria Portugal-Angola, isso não significa que Portugal esteja a perder o lugar de parceiro privilegiado. Mas é preciso mudar de mentalidade.
"Quando Angola tem uma nova ambição que vai para além do petróleo, Portugal perde a capacidade e o músculo que têm países como, por exemplo, a Alemanha", afirma.
No entanto, João Traça considera que aqui pode estar uma oportunidade. "As empresas portuguesas podem ser o parceiro que essas empresas internacionais vão necessitar para investir em Angola. Porque o que é facto é que as empresas portuguesas e angolanas dão-se de uma maneira que nenhuma outra empresa de outros países consegue ter esse tipo de relacionamento e capacidade de trabalhar em conjunto".
O importante é não ficar preocupado com isso, "e a achar que Angola tinha de ficar condenada a apenas se dar bem com Portugal (...) e as empresas têm de tentar ver nisso uma oportunidade e não ficar a chorar".
"Limpar" a imagem de Angola
À pergunta se o novo presidente angolano está a fazer um bom trabalho a tentar "limpar" a imagem de Angola, João Traça recusa fazer análise política. "O que me parece relevante é que Angola tenha uma imagem que consiga atrair investimento". Como? "Com uma visão na qual os investidores acreditem".
Reconhecendo que a corrupção é importante, lembra que não é um exclusivo de Angola. É apenas um dos pontos dessa imagem que tem de ser criada e que é prioritária para atrair investimento externo.
Angola tem recursos e oportunidades para sair da crise e tornar-se uma verdadeira potência regional. "É um país que não está condenado a viver em crise, não está condenado à pobreza. Com tempo, trabalhando, tem todas as condições para ser um player de relevo naquela zona".
O potencial está lá, garante João Traça. Agora é preciso trabalho e tempo. "No momento em que o país acreditar que consegue ser relevante para além do petróleo, a economia do país e os angolanos vão ganhar um novo élan".
É difícil, lembra, as crises fazem perder a confiança. "Por isso, a mudança de um ciclo, um novo presidente, é o élan que faz trazer a mudança".