"Leviandade" versus "Estado justo" com polémica no IRS. Pagamento do imposto em prestações implica cobrança de juros
No Fórum TSF desta segunda-feira, Hugo Soares defende que "seria uma grande injustiça" se o PSD fosse prejudicado eleitoralmente pela surpresa desagradável no acerto de contas com o fisco. Pelo PS, António Mendonça Mendes lamenta que o Governo tente "brincar com a vida das pessoas"
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A polémica com a redução ou o fim dos reembolsos de IRS adensa-se com o aproximar da data em que cada contribuinte vai ficar a saber se o Estado lhe vai devolver algum valor ou se, pelo contrário, vai ter de pagar. Esta conjuntura leva a uma nova troca de acusações entre PS e PSD, com os socialistas a lamentarem a "leviandade" do Governo e com os sociais-democratas a falarem num "Estado justo". Certo é que se o imposto sobre o rendimento for pago de forma faseada está sujeito à taxa de juros.
Confrontado no Fórum TSF desta segunda-feira com a surpresa de muitos contribuintes pelo facto de terem de pagar, pela primeira vez, o secretário-geral do PSD argumenta que um "Estado justo" é aquele que "não cobra impostos a mais durante o ano para depois pagar mais à frente". Esse, esclarece, seria um Estado "que se financia à custa do trabalho dos portugueses".
É, de resto, com a mesma premissa do primeiro-ministro em gestão que Hugo Soares justifica a ausência ou redução do reembolso de IRS: as retenções do imposto foram mais próximas daquilo que vai ser cobrado.
Para aqueles que "menos se preparam para esta circunstância", o secretário-geral dos sociais-democratas deixa uma alternativa: o imposto que devem ao Estado pode ser pago "em prestações". Quando questionado sobre se esta opção teria implicações monetárias, Hugo Soares admitiu não "conhecer as regras a esse limite". No entanto, a verdade é que existem custos adicionais.
Consultando o Portal das Finanças é possível ler-se: "Ao valor de cada prestação acrescem os juros de mora contados sobre o respetivo montante desde o termo do prazo para o pagamento voluntário até ao mês do respetivo pagamento. (...) A falta de pagamento de qualquer das prestações importa o vencimento imediato das seguintes e a instauração do processo de execução fiscal pelo valor em dívida." Isto significa que, quem pagar o IRS a prestações vai ter de pagar juros, porque é considerada uma dívida ao Estado. Em 2024, a taxa andou à volta dos 9%.
Mas, além desta questão prática, não têm faltado trocas de acusações entre o PS e o PSD: o social-democrata considera que "seria uma grande injustiça" se a AD - Coligação PSD/CDS fosse prejudicada eleitoralmente por esta surpresa desagradável no acerto de contas com o fisco.
"É um bocadinho como se diz no futebol: o árbitro não deve beneficiar o infrator. Aqui, é ao contrário. Não devemos penalizar o Governo por ter baixado impostos e por ter devolvido mais rendimento aos portugueses."
Sobre as críticas feitas pelo PS a este novo modelo, Hugo Soares sublinha que, "em campanha eleitoral, não vale tudo" e a verdade deve estar "acima de tudo o resto". Acusa assim os socialistas de estarem "numa deriva" e desafia-os a responderem a duas questões.
"Era bom que o Partido Socialista respondesse a estas duas perguntas que eu queria aqui de novo colocar: é verdade ou não é que IRS baixou e que os portugueses pagaram menos impostos? É verdade ou não é que o próprio Partido Socialista, o próprio secretário-geral do Partido Socialista, foi a favor da diminuição da retenção na fonte em sede de IRS?", questionou.
Numa reação a estas declarações, o deputado socialista António Mendonça Mendes devolve a batata quente: depois de lembrar os alertas feitos pelo partido, considerou "excessiva" a redução de imposto durante os meses de outubro e novembro, aquando da introdução das novas tabelas de retenção na fonte de IRS. Nestes dois meses, houve um aumento significativo do salário com a medida imposta pelo Governo, que procurou desagravar a cobrança mensal do imposto sobre o rendimento aos salários e pensões.
"Isso faz com que hoje tenha pessoas não só a ter um reembolso mais pequeno como a ter de pagar imposto", nota.
Mendonça Mendes é taxativo e critica o Governo por não ter tido em "consideração aquilo que é a vida das pessoas e a forma como organizam a sua vida". Acredita que estas alterações foram feitas para passar uma ideia de que "havia maior rendimento disponível nos meses de outubro e novembro".
"É de uma grande leviandade, porque isso é brincar com a vida das pessoas."
A bastonária da Ordem dos Contabilistas Certificados garante, contudo, que "nenhum contribuinte ficou prejudicado". Apesar de haver casos em que não há reembolso, outros em que este é mais magro, quando comparado com anos anteriores, e haver até quem tenha de pagar, Paula Franco aponta que esta situação advém do facto de o imposto cobrado ter sido menor.
"Por exemplo, eu tenho simulações de pessoas que recebiam 700 euros no ano passado e que agora vão receber 50 euros, nas mesmas situações e nas mesmas circunstâncias. O que é que isso significa? Significa que retiveram menos", explica.
Recupera ainda a ideia de "excessividade" lançada pelo socialista António Mendonça Mendes ao defender que o tombo das tabelas de retenção na fonte foi feito de forma exagerada.
"É uma variação que afeta o bolso dos contribuintes e que os contribuintes estão a recolher. Estão a perceber agora que vão receber menos reembolso, mas já se esqueceram que em setembro e outubro receberam muito mais salário líquido", refere.
Adianta ainda que os impostos desceram "efetivamente" não só por via do Orçamento do Estado, mas também por via da proposta do PS que reduziu as taxas do IRS até ao 6.º escalão, e da proposta do PSD.
