Mais do que 4500 trabalhadores na Bosch de Braga "não seria bom para a cidade"
Carlos Ribas é representante da Bosch em Portugal e, em entrevista à TSF e Dinheiro Vivo, falou sobre os planos da empresa no país, frisando que a fábrica do grupo alemão em Braga pode contratar até 1000 trabalhadores nos próximos tempos.
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Esta semana ficou marcada pela inauguração do novo centro de tecnologia e desenvolvimento da Bosch Car multimédia Portugal em Braga. Esta unidade está focada na área da condução autónoma. Que produtos vão ser desenvolvidos em Portugal?
Vamos desenvolver vários produtos que vão ser a base e o coração para a condução autónoma. A condução autónoma não é um dispositivo que se coloca num veículo e a partir daí ele começa ter capacidade para se deslocar autonomamente, não. É um conjunto de sistemas conjuntos que vão permitir que ela exista. Em Braga estamos a desenvolver alguns produtos que, em conjunto, vai permitir a condução autónoma. Um deles é o VNPS, o sistema de posicionamento exato do veículo. Temos um sistema de navegação que nos diz onde o carro está na estrada mas com precisão como esta não temos. Nós desenvolvemos conceitos que nos dão exatamente o posicionamento do veículo para evitar pequenos toques que podiam acontecer quando o sistema de navegação não é suficiente, estamos a desenvolver outros produtos dos quais ainda não posso falar, porque não existem no mercado... produtos em parceria com outras partes e unidades da Bosch no mundo, é um produto muito complexo, tem centenas de engenheiros envolvidos na Alemanha, na Índia, EUA e Portugal e a maior contribuição será Portugal. Temos como parceiros a Universidade do Minho.
Esses produtos acabam por ir de encontro aquela informação que a condução autónoma do futuro na Bosch vai sair de Portugal. Pode explicar? Estão a fazer testes com carros autónomos aqui no país?
Não há dúvida que Bosch em Portugal vai dar um grande contributo para a condução autónoma do futuro. Estamos a fazer testes, nomeadamente com este produto que descrevi, na Alemanha. O produto é concebido e feito cá e os testes estão a ser feitos na Alemanha, porque é preciso um parceiro que faça isto connosco. Esse parceiro é um construtor alemão, porque o parceiro que vai ser o primeiro a usar este nosso produto é alemão.
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Quem é o parceiro?
Peço muita desculpa...
Qual foi o investimento neste novo centro de tecnologia e desenvolvimento?
3 milhões de euros.
Com este centro a Bosch precisa de recrutar mais engenheiros. Quais são as metas? Não começa a sentir dificuldades no recrutamento deste técnicos especializados? Isto poderá pôr em causa o crescimento da Bosch em Portugal?
Sim, necessitamos de recrutar muito mais engenheiros mas não só, uma grande parte do recrutamento de que necessitamos são engenheiros físicos, óticos, mas muito na vertente de engenharia. Neste momento é verdade que a disponibilidade do mercado já não é tão grande como há uns anos e sentimos algumas dificuldades. Acreditamos que ainda é possível conseguirmos o que pretendemos mas começamos a notar já que a abundância não é a do passado e percebemos também que os nossos quadros são tão ou mais qualificados que noutra parte do mundo e começa também a haver uma propensão de outros países europeus concorrerem pela nossa mão de obra, que é altamente competente e especializada e os nossos quadros não ficam a dever nada aos outros países.
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Mas quais são as metas em termos de recrutamento?
Em engenharia pura temos cerca de 250 pessoas, se considerarmos a área de protótipos serão mais 100, 120 pessoas, mas nas 250 de engenharia pura quereríamos subir para 400. É um desafio grande.
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A Bosch é uma das maiores empregadoras e exportadoras do país. Sei que tem ambições para tornar a Bosch ainda maior em Portugal, nomeadamente trazer uma nova fábrica para o país. Como é que está esse projeto?
Esse projeto mantém-se nas ambições mas não passa disso. Gostaríamos muito disso mas neste momento ainda não se discute. Estamos a ampliar consideravelmente a fábrica de Braga, temos uma obra neste momento que vai crescer em área de construção em cerca de 21 mil metros quadrados para uma área total 110 mil metros quadrados, portanto poderia ser essa fábrica de que está a falar, que já seria uma fábrica de grande dimensão mas é apenas uma ampliação. Continuamos a crescer, embora de uma forma mais moderada do que nos últimos 3 anos, nem seria possível manter o mesmo ritmo. Só o ano passado na fábrica de Braga crescemos 49% relativamente ao ano anterior, o que é um impacto muito forte. No fim do ano a equipa estava muito feliz mas aquilo que lhes foi exigido, em desgaste, foi muito grande portanto não seria possível ter anos consecutivos com este crescimento - nem seria saudável. Agora pretendemos não parar no crescimento mas estabilizar e sustentar o que foi conseguido até agora e daqui a 4, 5 anos voltar ao mercado para termos um crescimento desta dimensão, se possível.
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Mas tinha o objetivo de tornar a Bosch numa quase Autoeuropa em Portugal?
Quando a Autoeuropa estava, infelizmente, a trabalhar apenas num turno, a Bosch era maior que a Autoeuropa. Felizmente para eles, que agora estão a trabalhar em plena carga, é muito maior que a Bosch. Ótimo para eles e espero que assim continue por muitos e bons anos. Nós queremos crescer ao nosso ritmo de forma sustentada e consciente, sem grandes descidas, sempre com crescidas, mesmo que não sejam muito fortes. Um dos nossos grandes objetivos é apostar cada vez mais no desenvolvimento, na inovação, nas parcerias com as universidades e levá-las cada vez mais para dentro das fábricas e acredito que se o saber acontece e estiver cá as fábricas também crescem.
Quantas pessoas emprega atualmente o grupo?
No total pouco mais de 5500.
Quais são os objetivos de empregar mais gente agora com a ampliação que estão a fazer?
Em Braga somos cerca de 3500 e não quero ultrapassar os 4500 porque penso que não seria bom para a cidade, não seria bom para a Bosch nem para o ecossistema que nos rodeia. Esse é o número ideal para vivermos de forma sustentada.
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Qual foi o volume de negócio da Bosch Portugal em 2017?
A Bosch fez 1,5 mil milhões de euros, portanto cresceu 36% em relação ao ano anterior, em que tínhamos feito 1,1 mil milhões de euros, que já era um recorde de faturação em Portugal.
Braga é que contribui mais?
Sim, é a fábrica maior da Bosch em Portugal e a que mais fatura mas felizmente todas elas cresceram de forma considerável. A fábrica de Ovar bateu os recordes de faturação de todos os tempos, a de Aveiro igualmente e os nossos escritórios e atividades comerciais e de serviços partilhados também cresceram em Lisboa para valores nunca antes conseguidos.
Quanto valeu o mercado externo?
Valeu 1,5 mil milhões de euros, menos 246. O mercado interno foi 246 milhões de euros, tudo o resto foi mercado externo.
Para que mercados vão os produtos da Bosch produzidos em Portugal?
Para quase todo o mundo. Na parte automóvel o nosso cliente é a Europa central, 30% ilhas britânicas, o restante Turquia, Ásia e EUA. Da fábrica de Aveiro há um forte contribuição para o mercado nacional, a Vulcano é líder há muitos anos no mercado na área de esquentadores e a fábrica de Ovar também teve um crescimento substancial e também no mercado Europeu.
E em termos de marcas da indústria automóvel?
Nós somos uma empresa alemã, o que é Bosch é bom e portanto todas as marcas premium são nossas clientes. BMW, Jaguar, Mercedes, VW...
Há pouco disse que vão ter um crescimento mais moderado. Quais são os objetivos de vendas para este ano?
Não me importaria de estabilizar nos próximos 2 anos mas penso que vamos continuar a crescer 5% a 10% nos próximos anos, nem é nosso objetivo crescer mais do que isso. Queremos crescer de forma consolidada de forma a que o cliente cada vez acredite mais em nós para depois nos continuar a dar mais carga de trabalho.
Esta instabilidade conjuntural e política que se vive pode impactar negativamente na evolução das vendas?
Tudo pode impactar negativamente. A verdade é que falava-se do Brexit, mas até hoje, felizmente, não temos sentido efeitos. Falava-se do Trump, até por razões políticas, felizmente até hoje também não temos sentido efeitos. Também se falava dos nossos vizinhos espanhóis e também não sentimos nada. Da nossa parte, e penso que não é só em Portugal, mas o mundo não está a sentir essa estabilidade de forma muito forte. Não foi só Portugal que cresceu, de uma maneira geral a economia tem crescido no mundo todo.
A Bosch tem investido ao longo dos anos em investigação e desenvolvimento. Qual é o plano de investimentos aqui para os próximos anos, e exatamente para o desenvolvimento de produtos nas várias áreas?
A Bosch tem os nossos centros de desenvolvimento em Braga para duas divisões, a Car Multimedia e a Control Systems... o total de investimento nos últimos três anos será de 350 milhões de euros, 2018 incluído, dos quais só na fábrica de Fábrica investe 240 milhões. Será uma média de 80 e poucos milhões de euros por ano.
Isso reflete-se em que produtos?
Reflete-se no crescimento das infraestruturas: aumentamos a fábrica de Ovar, há dois anos o novo centro de desenvolvimento foi inaugurado na fábrica de Aveiro. Estamos a fazer uma ampliação muito grande na fábrica de Braga... tanto nas áreas produtivas como no desenvolvimento. Nestes anos de 2016, 2017 e 2018 serão estes valores.
Que produtos novos vão lançar depois de tanto investimento em inovação e desenvolvimento?
Deixe-me cá ver do que posso falar... Lançamos recentemente o eCall, que neste momento passou a ser obrigatório em todos os veículos motorizados de 2 e 4 rodas, que é um sistema de emergência em caso de acidente, em que se houver um acidente chama ajuda e diz onde está o veículo. Na parte de painel de instrumento lançamos o Optical Bonding (?), conceito desenvolvido em Braga e em mais sítio nenhum, que foi lançado na último BMW da série 7, que é um conceito muito interessante. Quando o sol incide no painel nós perdemos a informação. Com o Optical Bonding (?) é uma tecnologia que absorve os raios solares e a informação está sempre diante do condutor. Isso é uma tecnologia inventada em Braga para o mundo, que tem uma articularidade interessante, que é quando foi apresentado o BMW série 7, ao ser visitado outros clientes e produtos visitaram o carro a aperceberam-se de que havia ali qualquer coisa diferente, motas e produtos de desporto perceberam que era a solução para os produtos deles. Motas estão todo o dia expostas ao sol e temos vários clientes que surgiram, na áreas motas de neve, dos jet-skies, mais na parte da vertente de divertimento.
Portugal ainda é um made in da Bosch ou já está num patamar de maior valor acrescentado?
O nosso esforço diário é cada vez mais ser invented em Portugal mas também queremos continuar a ser made in Portugal. Quanto mais formos invented in Portugal mais iremos garantir a continuidade do made in Portugal, é essa a nossa filosofia de trabalho.
A indústria 4.0 é a aposta de hoje para o futuro. A Bosch Portugal precisa de investir na robotização das unidades?
As unidades da Bosch já são suficientemente robotizadas. A robotização pode ser boa até determinado patamar e a partir daí pode ser muito prejudicial. Tentamos combinar a mão de obra com a automação de forma a manter um equilíbrio que seja rentável e sustentável. Temos nas nossas fábricas muita automação e muita gente a trabalhar e é isso que queremos continuar. Não é nosso objetivo automatizar tudo, longe disso, é nosso objetivo ter as pessoas a trabalhar juntamente com uma forte componente de automação.
Mas têm já robôs a substituir o que anteriormente era feito pelo Homem. Essa robotização não vai implicar despedimentos no futuro?
Não. felizmente Portugal, e tal como maior parte dos países da Europa, tem pouco desemprego no mento. Nos quadros qualificados o desemprego praticamente desapareceu. Na parte da mão de obra direta tem vindo a desaparecer de uma forma sustentável nos último 3 anos. Há 3 anos o desemprego andava na casa dos 17% e hoje anda nos 7%... tem baixado substancialmente e não é a automação que vai tirar o emprego. Penso que isso é um erro e um sofisma e pode levar muita gente em erro. O país mais automatizado, neste momento, é a Alemanha... e não tem desemprego e está a ir buscar mão de obra a outros países porque não tem gente para trabalhar. Isso de dizer que automação vai tirar emprego, esqueça, é mentir. A automação vai ajudar a criar emprego e isso é provado pelos países mais industrializados, que não têm desemprego. E quando há crises estes países sofrem muito menos.
A Bosch tem objetivo de ser líder na área da internet de todas as coisas. Em que medida Portugal pode contribuir para esse objetivo?
Se a Bosch ainda não é líder na internet de todas as coisas, anda lá muito perto. O que não estiver ligado daqui a 5 anos desaparece ou deixa de existir. O digital já existe há 50 anos mas o conectado entrou há dois anos e veio mudar isto tudo. A Bosch tem planos estratégicos muito bem definidos: a partir de 2020 nenhum dispositivo vai sair da fábrica que não seja conectável. Tudo o que sair vai ser possível ligar a alguma coisa. O nosso telemóvel vai poder ligar-se e obter informação de tudo o que é aparelho na BOsch. Isso está definido no nosso road-map, temos todos os projetos a trabalhar nessa direção.
E conectar do carro para casa?
Hoje já acontece na nossa fábrica de Aveiro pegar no telemóvel e ver a temperatura que está em casa e programá-la para a temperatura que se quer. O mesmo acontece com o esquentador... e com o telemóvel regulo para a temperatura que quero. Subir e descer a temperatura da água nas torneiras já se faz a partir do telemóvel.
O carro inteligente também estão a trabalhar nisso?
As máquinas estão prontas, já as temos nas nossas fábricas. As maquetes estão prontas. No futuro o carros erá o terceiro espaço de vida, depois de casa e do trabalho. Que o terceiro será o carro não há dúvida, os outros dependem das famílias e das pessoas. Acreditamos que em 2022-2026 os primeiros carros 100% autónomos entrarão no mercado e quando isso acontecer vai ser necessário entreter as pessoas dentro dos carros. A nossa visão é que o espaço a bordo vais ser certamente confortável, permitir que uma pessoa veja um filme, outra faça um sky meeting, outra uns joguinhos, outra trabalhe nos e-mails, que toda a gente esteja a fazer coisas diferentes com os displays que tem à sua volta. A ideia é que o carro seja forrado de displays touchscreen e consigam aceder aquilo que quiserem.