Microempresas querem simplex real e gabinete de apoio. Confederação critica alterações à lei da nacionalidade e da imigração
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O presidente da Confederação das Micro, Pequenas e Médias Empresas (CPPME) afirma que não basta o Governo criar o Ministério da Reforma do Estado. É preciso existir uma simplificação de processos real e propõe a criação de um gabinete de apoio ao pequeno negócio nos 308 municípios do país, agregador dos diversos serviços do Estado, com capacidade de agilização até à contratação de pessoal para atender mais e obter respostas mais céleres. Uma forma de lutar contra a burocracia administrativa, prevista no pacote de 47 medidas a apresentar ao Governo e aos grupos parlamentares. Se nada avançar, então, andaram "a vender gato por lebre", conclui Jorge Pisco.
No ano em que a CPPME assinala o 40.º aniversário, Jorge Pisco considera que o propósito que levou à sua criação faz cada vez mais sentido num país que continua a ter um tecido empresarial cosido a 99% por nano, micro, pequenos e médios negócios e, num momento em que aumentam os riscos à atividade em todas as frentes, quer a nível nacional, quer internacional.
Apesar da mudança de tendências no hemiciclo de São Bento, após as últimas legislativas, acredita que a nova legislatura pode trazer ganhos às mudanças que considera necessárias para a prosperidade dos pequenos negócios, mas confessa que o novo pacote de 47 medidas a apresentar ao Governo e aos grupos parlamentares é um mero acrescento das 40 propostas apresentadas na legislatura anterior e afirma que, apesar das tentativas de diálogo feitas no passado, não parece haver vontade do Executivo em ouvir o que tem a dizer a Confederação.
Mesmo assim, garante que vão pedir reuniões com as várias tutelas e com os líderes parlamentares, argumentando que conhece bem os programas eleitorais de cada partido em matéria de política empresarial e se não ouvirem as propostas que tem para fazer, conclui então, que andaram a enganar os portugueses, “a vender gato por lebre”.
A desburocratização é outra bandeira da CPPME e, mesmo com a criação do novo Ministério da Reforma do Estado, Jorge Pisco diz que não basta. É preciso concretizar a desburocratização de processos administrativos transversal a todos os serviços e criar assim um simplex real.
Dá exemplos da demora na obtenção de documentos necessários à atividade empresarial e da desistência até dos pequenos empresários da submissão de projetos às candidaturas dos diferentes programas de fundos comunitários.
Não revela dados concretos, mas adianta que há casos de empresas que receberam apoio na altura da pandemia e que agora estão a ser chamadas para devolver dinheiro que terão recebido indevidamente. Sublinha também que o Banco de Fomento existe para dar garantias à banca e não às empresas, mas após reunir com o seu presidente aguarda o envio de dados para perceber a evolução da situação.
Questionado sobre as razões para a fraca presença de microempresas nas candidaturas a fundos comunitários, ironiza:
O Governo diz que no PRR há micro e pequenas empresas, é verdade, ou seja, microempresas criadas, muitas vezes, por grandes e médias empresas que têm estrutura e apresentam candidaturas, porque nós sabemos que criam pequenas empresas para avançar por esses apoios, logo, evidentemente é uma microempresa, mas, na realidade, as empresas realmente micro e pequenas que tenham historial acabam por não se candidatar, porque não estão disponíveis para andar no jogo e a perder de tempo e não saber quando é que esse dinheiro vem, porque, na realidade, tempo é dinheiro, como se costuma dizer
Defende por isso que, ao nível do investimento, a prioridade deve passar pela criação de uma linha que distinga este tipo de negócios mais pequenos. “Tem de haver mesmo essa distinção, deve haver mais apoios, naquilo que é o seu dia a dia."
O presidente da CPPME sublinha ainda uma reivindicação antiga: a falta de resposta aos problemas centrais, como a redução do IVA na restauração. "Porque está aprovado, tem sido incluído nos Orçamentos do Estado e os sucessivos governos não a aplicam e fazem tábua rasa a esta situação. Não vale a pena perguntar porquê, porque não sei. O Ministério das Finanças não aplica aquilo que está atribuído, que foi aprovado em Orçamento de Estado e não se entende, porque as tributações autónomas não são aplicadas em relação às viaturas de cinco lugares, porquê? Depois fala-se, na redução do IRC e dizem que não estamos de acordo, pois bem, mas é assim, as microempresas não têm lucros para serem tributadas em sede de IRC."
Para Jorge Pisco, o alívio dos encargos das empresas passa por uma redução dos custos de contexto, que considera ser fundamental para as micronegócios. "É aqui que está, como se costuma dizer, o busílis da questão, a fatura no final do mês sobre quanto custa o seguro, a água, a luz, o gás, o combustível, etc. Tudo somado no balancete mensal pesa e isso é que é o fundamental das contas."
Reconhece que o Governo tem em mãos uma tarefa nada fácil porque desburocratizar requer um trabalho moroso e interdisciplinar que envolveria vários ministérios e uma conjugação de esforços de cada tutela e que cada um não olhe apenas para o seu quintal, mas considera que é também um trabalho cultural, pelo qual espera para ver resultados do novo ministério dedicado à reforma do Estado.
Nós discutimos, por exemplo, a questão do gabinete de apoio ao empresário, com o secretário de Estado da Economia e ele dizia: 'Isso é interessantíssimo.' Depois discutíamos isto com o secretário de Estado das Finanças, falávamos também com o secretário de Estado do Trabalho e afirmava o mesmo, mas, na prática, ainda não avançou. Porquê? Porque depois, é preciso criar um grupo de trabalho que possa conjugar tudo isto e articular esforços com as autarquias sem ferir princípios constitucionais. Teria de envolver a economia, o turismo, o comércio, as finanças, o trabalho e a segurança social, porque são áreas fundamentais nesses setores todos e é preciso saber como cada um começa o processo, como se interliga e como se responde.
Jorge Pisco dá conta ainda que a Confederação não está envolvida no protocolo de cooperação para a migração laboral regulada, que setores como o turismo assinaram com o Governo, e critica as alterações propostas pelo governo à lei da nacionalidade e à lei da imigração.
Nós não fomos convidados. Não fomos ouvidos, nem achados nessa situação, mas discordamos dessa forma como o Governo avançou. Porquê? Há zero trabalhadores na via verde para o trabalho e até achámos muita graça, na altura, as quatro confederações que fazem parte do Conselho Económico e Social assinarem. Teciam elogios às propostas, porque seriam o melhor do mundo e logo a seguir vieram dizer que afinal haveria grandes dificuldades sobre a forma de as implementar
Para Jorge Pisco, a realidade mostrou que nada veio a resultar quer com a Confederação do Turismo, através da hotelaria, ou na construção civil, que terá recebido a possibilidade de criar algum alojamento para trabalhadores que estivessem de fora, mas, na realidade, não se verificou a resolução desse tipo de problemas, concluindo que “são formas muito abjetas de se fazer propaganda a dada altura, ou de se criar show-off de medidas que depois, no concreto, não servem nem empresas, nem os interesses dos trabalhadores, nem, tão pouco, o problema da imigração que o país tem atualmente".
Também crítico do excesso de regulação imposto pela União Europeia aos Estados-membros, acusa os sucessivos governos de acrescentarem mais constrangimentos, mais regras ou regulamentos, aquando da transposição das diretivas comunitárias, que estrangulam a atividade empresarial.
Reconhece que os novos riscos geopolíticos aumentaram as preocupações a quem vive do pequeno comércio, não só pela nova política norte-americana das tarifas, mas também por conflitos quer na Europa, quer no Médio Oriente e pede algum alívio fiscal, nomeadamente na cobrança de IVA, reivindicação antiga, para diminuir os custos de contexto e reduzir o peso na tesouraria das empresas.
Alerta que o número de falências tem vindo a subir desde o ano passado e teme que possam aumentar mais, mas não quer adiantar números, para evitar especulações. Prefere sublinhar que a Confederação das Micro, Pequenas e Médias Empresas é um parceiro social de pleno direito, com assento no Plenário do Conselho Económico e Social (CES) e que representa um tecido empresarial, que quer ao nível da produção de riqueza, quer ao nível da criação de postos de trabalho. Representa mais de três milhões de trabalhadores e são pequenos negócios responsáveis pela criação de mais de 60% da riqueza do país, prometendo fazer jus ao seu papel institucional junto da Presidência da República, Assembleia da República, Governo e Autarquias Locais na defesa dos seus interesses.
Quanto à celebração do 40.º aniversário da CPPME, Jorge Pisco adianta que passou pela realização de uma conferência que teve como tema “A razão de ser de uma confederação de micro, pequenas e médias empresas” e que, no último trimestre deste ano, haverá o lançamento de um livro que fará uma retrospetiva destas quatro décadas de atividade da Confederação e de tudo aquilo que foi desenvolvendo junto das empresas e da sociedade civil.
A par disso, a Confederação está a participar num conjunto de iniciativas com diversas autarquias com as quais protocolos, incluindo ações na Feira de Santiago do Cacém, em Palmela, em Alcácer do Sal, bem como, na Feira de São Pedro, em Alverca do Ribatejo, em Vila Franca e também no Seixal. "Um conjunto de iniciativas em que é importante nós participarmos e também um conjunto de outros eventos, como debates, em que a confederação tem estado, no âmbito de protocolos que tem com as autarquias locais, além de iniciativas realizadas pela própria confederação. Portanto, há razões para continuar. É evidente que há, mais ainda quando representamos 99,9% do tecido económico nacional, pois são micro, pequenas e médias empresas, com todas as dificuldades que vão enfrentando no dia a dia e muitas vezes não sabem como resolver para poder sobreviver.”
